domingo, 31 de maio de 2009

Fernando Soares Campos é entrevistado pela Nova Coletânea



1 - Como você definiria o escritor, o jornalista e a pessoa Fernando Soares Campos?

R: É difícil, para qualquer pessoa, definir-se a si próprio, sob qualquer dos aspectos sugeridos pela sua pergunta. Há sempre o receio de nos atribuirmos qualidades acima do merecimento; receio este que também pode nos levar ao outro extremo, à subestima, redundando naquilo que costumamos chamar de “falsa modéstia”. Além disso, tenho dificuldades em separar “a pessoa” de qualquer de suas atividades. Creio que os atributos pessoais de cada um de nós determinam o comportamento do indivíduo em qualquer campo de atuação. As características pessoais de uma pessoa, os traços marcantes do seu caráter, retratam o pai de família, a dona de casa, o profissional, o amador, o cidadão, o empregado, o patrão, o político, o eleitor... Entretanto, análises nesse sentido só podem ser feitas, com certa propriedade, por outra pessoa, nunca por nós mesmos. Eu jamais escreveria, por exemplo, uma autobiografia; pois, quando falamos de nossas próprias fraquezas, invariavelmente citamos apenas os “pecados menores”, mesmo assim dando um jeito de transformar nossa confissão em virtude maior, com a pretensão de estar sendo franco, autêntico, verdadeiro ao extremo. Definir a mim próprio? Bom, vamos saltar essa. Talvez um dia alguém possa, com toda franqueza, me dizer como sou de verdade. Só espero estar preparado para ouvir!

2 – Quando começou a escrever textos literários?

R: Como ocorre com a maioria dos escritores, comecei escrever ainda na infância, quando imaginava que, para ser poeta, bastaria saber rimar e metrificar, imbuído de profundos sentimentos capazes de transformar o mundo com um palavreado lamurioso. Logo descobri que poesia era coisa de poeta e, para o bem de todos e felicidade geral da literatura, abandonei a pretensa veia poética. Mas continuei acreditando que era dotado de vocação e habilidade para a prosa, que pode encerrar espontânea poesia. Senti a necessidade de desenvolver os talentos inatos, para tanto me dediquei à leitura, fui frequentador assíduo da Biblioteca Pública Municipal Breno Accioly. O Breno, de minha cidade natal, era contista, deixou uma obra importante. Foi contemporâneo e amigo de outro ilustre escritor alagoano, Graciliano Ramos. A leitura é mãe da escrita, e toda criança que aprende a gostar de ler sente-se inclinada a escrever.

3 - Onde nasceu e qual sua relação com o lugar em que mora?

R: Nasci em Santana do Ipanema, no Sertão Alagoano. Saí de minha cidade natal aos 17 anos de idade, porém ela nunca saiu de mim. Moro no Rio de Janeiro há muitos anos, mas já corri mundo, viajei pelo Brasil afora e até me estabeleci por algum tempo em cidades de diversos estados, a serviço de empresas para as quais trabalhei, ou mesmo instigado pelo espírito aventureiro, que, na juventude, é mais fácil a gente lhe dar vazão. Visitei terras estrangeiras, alguns países de nossa vizinhança territorial e ilhas-estado no Mar do Caribe. Gosto do Rio, me sinto bem aqui. Sempre que viajo, mesmo para a minha terra natal, ao voltar tenho a sensação de estar retornando às minhas origens. É estranho, mas é isso que acontece. É consequência de aqui ter constituído família e conquistado muitos amigos.

4 - Por que decidiu participar desta antologia?

R: Porque o organizador me inspirou confiança. Na internet encontramos muita gente tentando fazer o mesmo trabalho que Bruno Resende está fazendo, porém dá para notar que muitos deles colocam seus próprios nomes acima dos propósitos aos quais supostamente se dispõem, são pessoas ávidas por notoriedade. Em outros casos, o sucesso empresarial é basicamente o único objetivo. Não tenho nada contra quem almeja um ou outro, ou seja, sucesso empresarial ou notoriedade. As pessoas definem suas metas pautando-se por aquilo que mais lhes interessa, seja em estrito benefício pessoal ou visando o bem comum. “Cada um no seu quadrado”. Só não gosto de ser iludido, pois já não tenho idade para viver ilusões. Para os sonhos, sim, pois estes às vezes se tornam necessários à sobrevivência do indivíduo, e, quando isso acontece, eles se sobrepõem até mesmo às decepções. Reconheci em Bruno uma pessoa realmente empenhada em fomentar a produção escrita, mais especificamente a literatura que se produz em forma de arte, ao mesmo tempo em que busca meios para impulsionar o hábito da leitura, fazendo dela um prazer, e prazer é uma das maiores necessidades do ser humano. Identifiquei seriedade nesse trabalho. Foi por isso que decidi participar do projeto que, a cada dia e adesão, se torna realidade e ganha reconhecimento.

5- Fale-nos sobre sua atuação no jornalismo? O que defende?

R: Não sou jornalista diplomado, apenas colaboro para órgãos de imprensa. Em geral defendendo os direitos humanos. No final dos anos 1980, colaborei para a Folha de Pernambuco, como articulista. Naquela época eu militava em movimento social popular, secretariava as atividades de um grupo de associações de bairro. A entidade se constituía numa espécie de federação de conselhos de moradores da Zona Norte do Recife. Quando da minha participação na Folha pernambucana, ela era o segundo jornal de maior tiragem no Nordeste. Hoje é o primeiro. Os meus artigos eram assinados e acompanhados de créditos, aos quais foi adicionado o título de jornalista, pois o que eu fazia tinha características daquilo que chamam de jornalismo de opinião. Atualmente colaboro para diversos sites jornalísticos, com maior frequência para o Observatório da Imprensa e para o jornal russo Pravda, edição especial dedicada à Comunidade de Países de Língua Portuguesa. O diário espanhol La Insignia, que acaba de encerrar suas atividades, mantém nos seus arquivos uma série de artigos, crônicas e contos de minha autoria, resultado de três anos de colaboração. Estou sempre marcando presença na revista digital NovaE e no Portal Maltanet, este, lá de minha terra natal. Mantenho uma página pessoal no site Para Ler e Pensar, especializado em literatura. Outros ciberespaços que eventualmente republicam meus textos: Velhos Amigos, mantido pela carioca Lou Micaldas, O Lobo, dedicado ao jornalista e escritor Fausto Wolff, e Óleo do Diabo, do meu amigo Miguel do Rosário, jornalista e crítico de arte.

6 - Que outros livros você já publicou?

R: Minhas primeiras publicações em livro aconteceram em obras de autoria coletiva. Textos meus já foram editados pela PUC-Rio, em parceria com Loyola Editores, e pela Editora Museu da República. Tenho outros textos publicados em coletâneas de contos e crônicas laureados em concursos promovidos pela FESP-RJ. Até o presente, só editei um livro, digamos, solo: Saudades do Apocalipse, oito contos e um esquete. Em 1987, em Recife, escrevi duas peças de teatro, encenadas por grupos amadores, muito bem aceitas pelo público e até mesmo pela crítica especializada. Cheguei e me sentir incentivado a enveredar por esse caminho, mas fiquei por aí.

7- Que livro foi marcante na sua trajetória pessoal ou como escritor?

R: Muitos foram os livros que me impressionaram ao ponto de marcarem as diversas fases de minha vida, desde a infância, passando pela adolescência até alcançar a maturidade. Lembro-me que, ainda muito jovem, me deslumbrava com as narrativas de Júlio Verne. Muitos dos seus livros me encantaram: Vinte mil léguas submarinas, Viagem ao centro da terra, Da Terra à Lua, O raio verde, tudo me fazia sonhar. Sonhava com as aventuras e com os lugares descritos nas obras. Eu viajava nas obras de Júlio Verne, às vezes à noite, à luz de um lampião, pois ainda não dispúnhamos de luz elétrica no meu sertão. Mas existe, sim, um livro que mexeu profundamente comigo, posso dizer que abalou minhas fragilizadas estruturas mentais, me sacudiu, num momento em que eu estava precisando mesmo de um tratamento de choque. Trata-se de Não verás país nenhum, de Inácio de Loyola Brandão. Isso ocorreu em 1981. Eu navegava, à deriva, na casa dos 30. O gosto pelas aventuras estava se tornando, para mim, a única forma de sobrevivência, era a maneira que eu encontrava de manter uma espécie de lucidez insana. Mas fugia à busca da verdade, me agarra à realidade, como se esta fosse aquela; enfim, estava me alienando. O romance de Loyola Brandão me fez ir lá ao fundo do poço, resgatar valores desestimulados por uma sociedade que enaltecia o esforço individual como exclusivo meio de se conquistar... ou melhor – acho que isso define com mais precisão aquilo que vivíamos e ainda vivemos –, consumir felicidade.

8 - Como se dá o processo de criação das suas obras?

R: Isso eu também gostaria de saber. Às vezes, relendo alguns dos meus próprios escritos, tenho a impressão de que os redigi sob transe mediúnico. Estaria eu atendendo sugestões de entidades espirituais? Seria aquilo uma espécie de psicografia? Questionar nesse sentido é válido. Não foram raros os momentos em que me surpreendi com as sentenças que acabara de compor. Cheguei a me dedicar ao estudo do Espiritismo, através da chamada Codificação Kardequiana. Também li obras de Chico Xavier e Divaldo Pereira Franco, entre outros autores espíritas. Passei a acreditar que, quando da produção de obras literárias, qualquer autor pode receber influências extrassensoriais, ou extraintencionais, mas entendo que nada disso chegaria a ofuscar o mérito da autoria. A possibilidade de exercermos o livre-arbítrio nos leva a essa conclusão. Tentei compreender o ponto de partida das inspirações que despertam a criação literária, analisando dissertações sobre a verve, mas não encontrei nada muito esclarecedor. A ciência já avançou bastante no estudo da anatomia e do funcionamento da máquina cerebral. Neurônios, neurotransmissores, sinapses, tudo isso, a cada dia, se torna mais conhecido, promovendo enormes contribuições para a solução de problemas que nos afligem desde o princípio dos séculos. Mas certamente ainda ignoramos muito daquilo que o nosso cérebro é capaz. Enquanto isso, vamos escrever experimentando os inúmeros caminhos da criação literária.

9 - Em suas obras vemos o reflexo de grandes clássicos do pensamento universal, seja filosófico, seja literário. Que pensadores mais o influenciaram até o momento?

R: É fácil compreender que na infância e na adolescência somos mais suscetíveis a influências. Certamente estas não ocorrem apenas naquelas fases, claro. Mas a formação religiosa, por exemplo, para quem a recebeu de forma sistemática e nos moldes em que a mim foi ministrada, pode vir a ser desastrosa, aniquiladora, ou, considerando os menores males que causa, inibidora, atrasando o processo de amadurecimento do indivíduo. Observe que eu não estou condenando os princípios religiosos em si, mas a forma como fui doutrinado na infância. Entretanto, ainda muito jovem, descobri que um dos melhores caminhos para superar uma educação extremamente conservadora, dogmática, é a literatura. Hoje entendo que, sob o ponto de vista das influências que recebemos durante toda a nossa existência, a diversificação das fontes literárias exerce importante papel na evolução do pensamento reflexivo e crítico do indivíduo. Provavelmente, qualquer pessoa que tenha tido oportunidade de optar por variadas fontes e delas tenha se utilizado, possua chances de refletir “grandes clássicos do pensamento universal”, conforme você diz ter identificado em meus escritos. Porém os reflexos que podemos identificar através das obras de um autor não são necessariamente possíveis anuências deste com aqueles que o influenciaram. A estética não é patrimônio de ninguém, e ao conteúdo de qualquer objeto artístico podem ser acrescentados outros valores; mesmo que de natureza física, mas também moral ou intelectual. O que é originalidade? Com quais critérios podemos qualificar de plágio qualquer obra? Creio que dizer aquilo que muitos já disseram, mas fazê-lo de forma diferente, renovada, elaborando textos sob ponderações fundamentadas na própria experiência, é o que podemos chamar de originalidade. Portanto, ao meu entender, originalidade literária seria a capacidade de se expressar de forma autêntica através de originais paráfrases! Mas, respondendo diretamente à sua pergunta, eu diria que os pensadores que mais me influenciaram foram aqueles com quem tive meus primeiros contatos, ainda em tenra idade: meus pais, meus avós, tios, tias, parentes e amigos da família, professores, catequistas, curiosos... Foi essa minha gente quem me fez situar no mundo, assimilando conceitos geográficos, econômicos, ideológicos, políticos e sociais. Depois vieram os clássicos do pensamento universal, lapidando, ou bagunçando ainda mais, tudo aquilo que aprendi naqueles primeiros tempos.

10 - Como conheceu a "Nova Coletânea"?

R: Através da aproximação, por estas vias virtuais, com Bruno Resende.

11 - Como vê a atuação do projeto no âmbito virtual?

R: Vejo que já extrapolou os limites do virtual, está ganhando terreno, conquistando a confiança de muita gente.

12 - A internet é um lugar propício para o desenvolvimento de bons escritores?

R: Sim, desde que o internauta-escritor identifique os caminhos mais apropriados. No começo pode perder algum tempo, mas com a experiência adquirida, depois de ter o computador infectado por todo tipo de vírus, aprende a varrer o lixo e se livrar das arapucas virtuais. Há quem diga que internet é 90% lixo e 10% aproveitável. Não posso afirmar que esse seja um bom referencial estatístico, mas acredito que todo lixo é de alguma forma reciclável. Precisamos apenas administrar nosso tempo, priorizando aquilo que consideramos proveitoso. Internet é lugar propício para bons e maus escritores, excelente ferramenta para ajudar os “maus” a se tornarem “bons”.

13 - Que mensagem deixaria ao novo autor?

R: Diria que podemos facilmente concordar que qualquer pessoa pode vir a ser “escritor”, e encontramos muita gente escrevendo com razoável mérito; no entanto, “escritor-pensador” é uma espécie mais rara. Não é tão comum encontrarmos escritores que manifestem vocação e talento através dos seus escritos. São poucos os que expressam verdadeira arte literária. Existe muita gente fazendo um arremedo de literatura; são aqueles que querem ser o outro, esforçando-se para se tornar um “clone” daquele escritor que mais o influenciou, ou simplesmente o impressionou. Acredito que, quando escrevemos, nos expressamos muito além daquilo que o conjunto de palavras e frases aparentemente tenta revelar. Mas creio também que seria praticamente impossível nos revelarmos por inteiro, sem reservas, sem qualquer traço de ambiguidade, com aquilo que falamos ou escrevemos, por maior que seja o tempo ou o espaço disponível. Ao leitor cabe ir muito além das ideias e propósitos do autor. E não estou me referindo àquilo que pode estar implícito simplesmente nas entrelinhas. Refiro-me a uma espécie de “aura” que emana de todos os textos, mas que só pode ser assimilada pelo leitor compenetrado da importância daquilo que está lendo e imbuído de aguçado senso crítico. Finalmente recomendo: não tenha medo do ridículo; caso contrário, é melhor não escrever nada, pois é inevitável passar por ele de vez em quando. Já ri muito dos outros, no entanto tirei melhor proveito quando ri de mim mesmo.

14 – Como o leitor poderia contatá-lo? Poderia indicar sua(s) página(s) na WEB?

R: Para contatos, troca de idéias e informações, podem usar meu e-mail à vontade: fernando.56.campos@gmail.com . As páginas na Web já foram citadas em pergunta anterior, pesquisas no Google levam diretamente a elas. Obrigado.

http://entrevistaescritores.blogspot.com/2009/05/normal-0-21-false-false-false.html

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4 comentários:

Assaz Atroz disse...

Ingrato! Omisso! Quiça, arrogante, mascarado...

Não citou este Assaz Cultural ciberespaço!

Estamos pensando seriamente em deletar este blog!

Senhor Fernando Soares Campos, saiba que o nosso Conselho Editorial foi convocado para reunião deliberativa, quando pretendemos decidir sobre os destinos desta imprescindível página dedica a vossa senhoria!

Aguarde-nos!

Fernando Soares Campos disse...

Caros, queiram me desculpar, mas acho que este imperdoável lapso de minha parte está corrigido. Acabo de receber mensagem de Bruno Resende, um dos organizadores da Nova Coletânea, informando:

"Pode deixar, Fernando.
Diga ao Conselho Editorial que o link estará junto ás suas indicações"

Espero que esta medida seja suficiente para me absolver da falha cometida.

Subserviente, jamais! disse...

Todas as épocas são compostas de escritores que divergem suas idéias e ultrapassam a literatura e prosseguem no campo do rivanchismo pessoal. Aqui fica perceptível uma clara e amarga dor de quem não tem habilidade para escrever como Fernando S. Campos, o que é benéfico, pois cada um tem que encontrar sua identidade.
Conclusão muito simples, o Fernando é o sucesso da página ser tão acessada e lida. Onde este grande escritor for, os seus leitores assíduos, adeptos de suas ideologias irão. Assim como lê-se Machado de Assis para imitá-lo, invejá-lo ou criticá-lo. Perebe-se que elevaram ainda mais o cacife de Fernando S. Campos com uma arrogante reclamação virtual.
Aguardo mais uma página sua Fernando S. Campos. O ousado, intelectual intrigante, sabe onde está seus próprios pés, arrisca-se por saber a competência que possui e como dizia Winston Churchill,pelo medo que os inteligentes causam. O que mais dizer:"aquila non capit muscas", do latim: "A águia não apanha moscas." Uma pessoa de espírito superior não se preocupa com ninharias. Esse espírito superior lhe pertence Ferando Campos, tão inerente quanto o alimento ao resto dos mortais.
Parabés ao Fernando pelos seus belos, críticos, autênticos textos e, não encastelados de idéias medíocres. Por isso, você é respeitado e considerado um pesadelo para tantos.
Muita paz e sucesso!
Kátia Teixeira - Leitora asídua de Fernando S. Campos e não da página virtual em que ele irá estar.

Minhas Histórias. disse...

Gosto muito de ler os textos de Fernando Soares Campos. Não sou leitora assídua pelo volume de atividades particulares que me absorvem muito. Mas, vez em quando, leio alguma coisa.
Gostei muito dessa página porque são colocações pessoais e como somos ambos sertanejos, nordestinos e contemporâneos encontro muita identificação na visão de mundo de
Fernando S. Campos.
Como disse a Kátia Teixeira, sou leitora do Fernando e não desse ou daquele espaço literário, embora, através dele tenha chegado a outros autores que também me agradam. Gosto de ler desde que possa retirar dessa leitura algum conhecimento ou informação útil e prazerosa.
Socorro Pinheiro.