terça-feira, 31 de julho de 2012

"Mensalão": Defesa de Dirceu e omissão do PIG no caso do valerioduto tucano

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Defesa de Dirceu sustenta tese de que ‘mensalão’ não passa de uma farsa



A defesa de José Dirceu de Oliveira e Silva, personagem central do processo conhecido como ‘mensalão’, vai sustentar na Tribuna do Supremo Tribunal Federal (STF) que “a história foi montada por Roberto Jefferson” e que o esquema de compra de apoio parlamentar “não existiu”. A apenas três dias do início do julgamento, José Luís Oliveira Lima, criminalista, defensor do ex-ministro, mira Roberto Jefferson, ex-deputado do PTB, autor da denúncia que levou à cassação de Dirceu. A Procuradoria-Geral da República classifica o ex-chefe da Casa Civil no governo Lula de principal articulador da engrenagem do mensalão, “sofisticada organização criminosa”.

Oliveira Lima mantém a serenidade quando indagado sobre o desafio que o espera. As próximas horas ele passará debruçado, como já o fez no fim de semana, sobre os autos da ação penal 470. Aqui e ali, rastreia atalhos para fustigar a denúncia do Ministério Público Federal, que formalmente atribui a Dirceu formação de quadrilha e corrupção ativa.

– Foram mais de 500 depoimentos, nenhuma testemunha confirma as acusações levantadas por Roberto Jefferson – afirmou o advogado a jornalistas. Ele chegará a Brasília na quarta-feira.

Nas alegações finais, Oliveira Lima rechaçou o libelo da procuradoria contra seu cliente.

“Derrubando cada um dos indícios brandidos pela denúncia, a prova judicial assegurou que José Dirceu se dedicava exclusivamente ao governo, não comandava os atos dos dirigentes do PT, não tinha controle nem ciência das atividades de Delúbio Soares, não decidia nomeações e não mantinha vínculo com Marcos Valério.”

Nesse documento, da página 113 e até a 144, um capítulo só para golpear Jefferson.

“As contradições e as inconsistências nas manifestações de Roberto Jefferson sobre a imaginada compra de votos são incontáveis e se agravam ainda mais quando se referem à suposta participação de José Dirceu. Provou-se nesta ação penal que Roberto Jefferson estava acuado e no foco de investigações no exato momento em que formulou a acusação de compra de votos”.

Na sexta-feira, dia 3, os ministros do Supremo e o País vão ouvir o criminalista em sua manifestação na Corte. A ele caberá a primeira da longa série de sustentações orais. Dele e de seus argumentos depende o destino de José Dirceu.

Ainda segundo a defesa de Dirceu, “as alegações finais demonstram quão frágeis são as acusações e como não há nada na minha conduta que venha a justificar uma eventual condenação. As denúncias já foram exaustivamente investigadas. É importante frisar: além de inquérito policial, foram instauradas duas CPIs, houve buscas e apreensões, quebras de sigilo bancário, fiscal e telefônico, requisições de documentos e tomados inúmeros depoimentos.

Solidariedade

Em seu blog, na internet, Dirceu relata suas atividades antes do julgamento no STF.

“Tenho andado muito pelo Brasil, reunindo-me com amigos e companheiros, fazendo palestras, participando de debates. Recebo, aonde vou, a solidariedade e o apoio dos que têm plena consciência de que a punição a mim imposta por 293 deputados foi injusta e política. Não cometi nenhum crime, não feri o decoro parlamentar, não me envolvi em negociatas. Meus adversários políticos, que pregaram a minha cassação para afastar-me da vida pública, não conseguiram uma só prova documental ou testemunhal para justificar a decisão tomada pela Câmara dos Deputados.

“Mesmo sem provas, o procurador-geral da União incluiu-me na denúncia que apresentou ao Supremo Tribunal Federal contra 40 pessoas que ele considera envolvidas no episódio que ficou conhecido como “mensalão”. Não apenas me incluiu, entendeu que eu era o chefe do que ele denominou “organização criminosa”. Até hoje essa denúncia não foi apreciada pelo STF, deixando-me na incômoda situação de réu sem julgamento.

“Ao lado disso, meus adversários procuraram me envolver em vários outros episódios largamente explorados pela imprensa. Tentaram, a todo custo, acabar com minha vida pública, construída com muita luta desde a adolescência. Não tiveram sucesso.

“Como disse no discurso em que fiz minha própria defesa, na sessão da Câmara em que a maioria decidiu pela cassação de meu mandato e decretação de minha inelegibilidade por oito anos, não abandonarei a vida pública e a luta política em nenhuma circunstância.

“Continuo militante político, embora sem mandato e sem função de direção partidária. E continuarei lutando, sobretudo, pelo reconhecimento de minha inocência.

“Esta publicação, preparada por amigos e companheiros que têm travado essa luta ao meu lado, tem o objetivo de apresentar meus argumentos e mostrar minhas razões de forma simples e direta. Agradeço a todos pela iniciativa, um instrumento a mais para que os que ainda têm alguma dúvida possam entender melhor a enorme injustiça cometida contra quem nada quer além de combater a injustiça e restabelecer a verdade”, afirma.

Genoíno

No julgamento em curso no STF, a defesa do ex-deputado federal José Genoino se concentrará em afastar as atividades do então presidente do PT – descritas por seus advogados como meramente políticas e institucionais – das decisões financeiras, função do ex-tesoureiro Delúbio Soares. Também tentará provar que Genoino mantinha relações apenas políticas com parlamentares do PP e do PTB e rebaterá as acusações de formação de quadrilha, sustentando que não houve crime nenhum.

As alegações finais, entregues em setembro do ano passado, ressaltam o estilo de vida modesto do ex-parlamentar.

– Não tenho bens. Vivo há 28 anos na mesma casa em São Paulo, me hospedo no mesmo hotel simples há mais de 20 anos em Brasília, cidade onde trabalho de segunda a sexta – relata Genoino.

Genoíno, seus advogados e amigos demonstram que ele continua a ser o mesmo de antes, com uma trajetória de vida ligada à resistência ao governo militar, que incluiu cinco anos vividos na prisão após sua participação na guerrilha do Araguaia. Segundo o advogado Luis Fernando Pacheco, responsável pela defesa de Genoino, o ex-deputado espera com ansiedade pelo desfecho do julgamento e por uma decisão que o considere inocente das acusações sofridas.

– Será de cabeça erguida, peito aberto e coluna ereta que Genoino poderá dizer a toda sociedade: ‘Meu nome é José Genoino Neto e eu fui absolvido das acusações do mensalão’. Tenho certeza de que ele sonha com esse dia – concluiu.

(Leia mais o Correio do Brasil )

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Outras matérias que estiveram hoje sob o crivo dos pauteiros da PressAA

Lista do mensalão tucano é notícia, menos para a nossa mídia



Causa estranheza o silêncio nas redações da velha imprensa sobre a publicação na revista CartaCapital desta semana dos documentos que mostram o caixa 2 da campanha de reeleição do tucano Eduardo Azeredo ao governo de Minas Gerais em 1998. O pouco que foi publicado a respeito foi Marcos Valério negando a autoria do documento (curioso é que quando o mensalão é tucano, a simples negativa de Valério é aceita sem maiores apurações jornalísticas).

Também apareceram declarações do ministro do STF Gilmar Mendes, negando ter recebido R$ 185 mil constantes na listagem, inclusive dizendo que na época não estava na Advocacia Geral da União (AGU), como sugere a matéria, e sim servindo na Casa Civil do governo Fernando Henrique Cardoso.

Anexo à listagem, tem cópias de depósitos e transferências bancárias que confirmam alguns nomes e valores da lista. Não há destes comprovantes para valores mais altos, que correspondem à maioria de políticos e autoridades famosas, como Aécio Neves, FHC e o próprio Gilmar Mendes (o que tem lógica, para não serem captados pelos alertas do Conselho de Controle de Atividades Financeiras – Coaf, nem deixar rastros).

O fato é que não dá para a velha imprensa esconder essa denúncia do noticiário político. Se for verdadeira é grave e se for falsa também, pois é do interesse do próprio Gilmar Mendes esclarecer quem estaria envolvendo seu nome no mensalão tucano.

(Clique no título e leia completo no site da revista Brasil Atual )

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Defesa de Dirceu entregue ao STF desmonta acusações

Em sua edição de hoje, o jornal O Globo apresenta os pontos da defesa do Banco Rural, nas  alegações enviadas por seus advogados ao Supremo Tribunal Federal, para o julgamento do dito "mensalão"...

Pois hoje vou apresentar todos os pontos da defesa de José Dirceu no mesmo "mensalão", termo ainda sem paternidade conhecida, pois os supostos "pais" até agora apontados insistem em lhe lhe negar o DNA. Aliás, para conhecimento de vocês, não é pai, é mãe: foi a jornalista Ana Maria Tahan, quando editora do Jornal do Brasil, a criadora da expressão, que caiu em domínio público feito rastilho de pólvora. Se tivesse patenteado e cobrado royalities, a Tahan seria hoje a maior milionária do dito "mensalão". E, dependendo do próximo resultado do STF, talvez a única...

[Nota Assaz Atroz: Pô! Até nisso o PIG (Partido da Imprensa Golpista) mente. Roubaram o termo e atribuem sua autoria ao Roberto Jefferson, e este nunca desmentiu. E depois dizem que os piratas somos nós, os chamados, por Serra e demotucanos em geral, de "blogs sujos"]

Vamos, pois, à Defesa de José Dirceu, no processo que começa a ser julgado no próximo dia 2 de agosto, contudo a maior parte da grande imprensa, antecipando-se aos ministros do Supremo Tribunal Federal, já pré-julgou e condenou, indo na contramão da fundamental imparcialidade necessária ao bom exercício do ofício...

(Clique no título e leia tudo no limpíssimo blog da Hildegard Angel )

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Ilustração: AIPC - Atrocious International Piracy of Cartoons

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segunda-feira, 30 de julho de 2012

A ENTREGA DA ÁGUA

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Laerte Braga*


Por sob as águas do rio Amazonas corre um rio maior ainda. A descoberta é recente para nós brasileiros, mas de amplo conhecimento dos norte-americanos há bom tempo.

O principal impasse na RIO + 20 foi a discussão em torno da transferência de tecnologias dos países considerados de primeiro mundo, para países periféricos, caso do Brasil e outros, numa escala às vezes de miséria absoluta.

A idéia de desenvolvimento sustentável além de ser uma falácia criada pelo capitalismo se restringe apenas aos castelos do primeiro mundo na nova Idade Média, a da tecnologia.

Uma espécie de raio-x de qualquer país no mundo já foi feita há anos pelos norte-americanos através de milhares de satélites. Sabem mais do Brasil que nós brasileiros. Isso lhes permite formular planos a curto, médio e longo prazo para seus projetos de ocupação e recolonização de países como o nosso.

Quando Al Gore, ex-vice-presidente dos EUA disse que o “Brasil terá que compreender que a Amazônia tem que ser internacionalizada”, já sabia o conteúdo de cada milímetro da região. Hoje não temos o controle dessa importante parte do território nacional. Está dentro do chamado Plano Grande Colômbia, a rigor, fomos rebaixados. Gore, considerado em seu país um especialista em meio-ambiente (desde que a favor das grandes companhias que controlam a Casa Branca), fez essa declaração por volta do ano 2000, portanto, há 12 anos.

O aumento da escalada norte-americana sobre o Brasil se deu a partir do governo de Fernando Henrique (funcionário da Fundação Ford) e as políticas de privatizações, criação de agências reguladoras, a idéia de Estado mínimo, a entronização do “deus” mercado como marco de todas as relações humanas, o controle da mídia, toda a parafernália tucana que se mantém entocada e ávida de completar o processo de entrega. O fim do monopólio estatal do petróleo se deu no governo FHC.

Do lado de dentro dos castelos, os barões da tecnologia; do lado de fora, os “mortos-vivos”. A definição é de Guy Debord.

O presidente da COCA COLA, uma das maiores corporações do mundo e uma das principais acionistas dos EUA, afirmou numa palestra na RIO + 20 que "toda a água do mundo deve ser privatizada, pois só o mercado tem condições de explorar essa riqueza”.

Não imaginavam, os senhores do mundo, que poderiam contar com portas escancaradas no governo Lula e, agora, derrubadas no governo Dilma.


O presidente da CODEVASF – COMPANHIA DE DESENVOLVIMENTO DOS VALES DO SÃO FRANCISCO E DO PARNAÍBA –, uma empresa pública, em tese brasileira, tem como objetivo fomentar o progresso das regiões ribeirinhas dos rios São Francisco e Parnaíba, atingindo seus afluentes em Minas, Bahia, Pernambuco, Alagoas, Distrito Federal, Goiás, Sergipe, Piauí e Maranhão.  

A Bacia do Rio São Francisco possui uma área total de 640 000 quilômetros quadrados e soma outros 330 000 o lhe permite uma área de atuação em 970 000 quilômetros quadrados, cerca de 11,3% do território brasileiro. Um dos objetivos era beneficiar as populações ribeirinhas, dotá-las de meios para desenvolvimento em todos os sentidos.

Os delírios de grandeza do ex-presidente Lula não são necessariamente delírios de grandeza, mas esperteza política, naquela de uma no cravo e outra na ferradura. Ao vetar a ALCA – ALIANÇA DE LIVRE COMÉRCIO DAS AMÉRICAS – que tornaria o Brasil colônia norte-americana, o Brasil e todo o continente americano (Norte, Central e Sul), preferiu caminhos diversos para que esse objetivo fosse atingido.

Foi ao Oriente Médio, manifestou apoio aos palestinos, visitou o Irã, condenou as políticas norte-americanas naquela parte do mundo, arrancou um acordo que Obama jogou no lixo com a Turquia sobre sanções contra o Irã e, ao final, numa guinada impressionante à direita, assinou um tratado de livre comércio com Israel, o grupo que detém o maior número de ações dos EUA. Por caminhos obscuros abriu as portas do País ao avanço dos EUA através de grupos sionistas, os verdadeiros senhores de Wall Street e da Casa Branca. Presidentes são figuras decorativas.

Tudo isso somado às privatizações de FHC (setores estratégicos como a EMBRAER, o petróleo, o financeiro, as telecomunicações, etc) completou o primeiro ciclo de domínio do Brasil.

Não temos sequer um carro brasileiro. Todos os veículos que circulam pelas ruas e estradas de nosso País são de montadoras estrangeiras. E com forte presença na subsidiária de ISRAEL/EUA TERORRISMO HUMANITÁRIO S/A, a BRASIL S/A.

A CODEVASF vai contratar o exército norte-americano para concluir as obras de transposição das águas do São Francisco, em si e por si, uma agressão descomunal ao meio ambiente, às famílias ribeirinhas, contra as quais toda a sorte de violência tem sido praticada com o silêncio e a cumplicidade da mídia.

Engenheiros dos EUA já estão no local e receberão a contrapartida de controlar todo o processo após a conclusão das obras. O acordo está sendo firmado com o Comando Militar do Sul.

O Comando do Sul dos Estados Unidos é a organização militar regional unificada ao processo de defesa geral dos EUA, com ação sobre a América Central, a América do Sul e especialmente o Canal do Panamá. Tem sede em Miami, Flórida, e, de joelhos em peregrinação para esse bastião capitalista, já lá esteve o presidente da CODEVASF. Se tirou os sapatos ou não, não sei, mas caiu de quatro, ajoelhou-se.

A área de atuação do Comando abrange 30 países, o Brasil inclusive, é lógico, hoje somos integrantes do Plano Grande Colômbia e 26 milhões de quilômetros quadrados.

Já professores universitários e de colégios técnicos ou institutos técnicos em greve, ou a saúde, os servidores públicos, a geração de tecnologias próprias, a reestatização de setores estratégicos, a recuperação da IMBEL e da ENGESA, essenciais ao País, tanto quanto a mudança de mentalidade das forças armadas – colonizadas –, isso fica para as calendas. Dilma está de olho na Copa do Mundo e nas Olimpíadas.


O golpe militar no Paraguai acentuou esse cerco sobre o Brasil. A cumplicidade de elites econômicas do campo, latifundiários, com empresas controladoras em maior ou menor quantidade de ações da corporação EUA, tipo MONSANTO, CARGILL, DOW CHEMICAL, etc, derrubou o presidente do Paraguai, Fernando Lugo, com o objetivo de manter intocados os “negócios” do agronegócio que transformam aquele país de pequenas dimensões territoriais num dos maiores produtores de soja do mundo, no milagre da fraude, da sonegação, através do trabalho escravo, etc.

O Paraguai é hoje a principal base norte-americana na região da Tríplice Fronteira e ameaça a Itaipu – basta um grito de avançar de qualquer militar dos EUA – e coloca os olhos grandes sobre o Aqüífero Guarani, o quinto maior do mundo.

A Argentina é outro alvo, e Cristina Kirchner que ensaiou uma reação já foi avisada que pode ser a próxima vítima de um golpe constitucional, o golpe branco, fórmula inventada para salvar os negócios quando ameaçados.

Dilma nem reação e nem nada. Seu chanceler Anthony Patriot foi a Assunção e sacramentou o golpe, embora dissesse o contrário. A presidente engoliu em seco a ação do “presidente paralelo” senador Álvaro Dias, o Brasil foi um fracasso na RIO + 20, e a crise econômica ronda o País.

O milagre do “capitalismo a brasileira” começa a se esgotar. As estruturas feudais continuam intactas.

As reservas de água do Brasil estão ao alcance de uns poucos drones dos EUA, a nova forma de guerrear, os aviões não tripulados. Baratos e mais eficazes em relação a um grande número de soldados.

De água e de quebra, todo o Brasil. No duro mesmo é o institucional falido, a fusão PT/PSDB, algo como PTSDB, onde o jogo é jogado apenas em função do poder e não pelos interesses nacionais, dos brasileiros.

A luta para recuperar o País vai ter que ser travada nas ruas, nas manifestações populares, na percepção que o atual governo difere dos tucanos apenas no estilo, mas na essência é a mesma coisa. Como foi o de Lula.

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*Laerte Braga é jornalista e atual candidato a prefeito de Juiz de Fora (MG) pelo PCB. Colabora com esta nossa Agência Assaz Atroz.

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Ilustração: AIPC - Atrocious International Piracy of Cartoons

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domingo, 29 de julho de 2012

MANICY E A PORCARIA DA AGU

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Ato contra a Portaria na AGU de Rio Branco

O que é AGU? Levanta a mão aí quem sabe! A curiosidade aumentou depois que a AGU publicou, no dia 17 de julho, a Portaria 303/2012, dispondo sobre as terras indígenas, o que provocou o maior rebucetê, com reação contrária de índios, antropólogos, ambientalistas, juristas, movimentos sociais e até de setores do próprio governo. A mídia se fechou num silêncio cúmplice, mas não conseguiu abafar o protesto feito com estardalhaço e indignação nas redes sociais.

- "A Agu endoidou de vez" - escreveu uma internauta, sem entender de onde havia saído a tal Portaria. Afinal, quem é AGU no jogo do bicho? Qual o poder que tem para prejudicar os índios? 

No Rio Negro (AM), todo mundo conhece as histórias inacreditáveis protagonizadas pela Agu, uma velha preguiçosa e vadia, que nunca fez roça e viveu sempre às custas dos outros, colhendo o que não plantou. Por isso, Manicy - a Mãe da Mandioca - castigou a velha, transformando-a em aguti, que é o nome da cutia em língua geral. Desde então, a velha deixou de ser gente e virou bicho, mas mesmo assim não perdeu o vício. Continua invadindo e saqueando as plantações, das quais é um dos piores inimigos.

Os estragos que este roedor, de hábitos noturnos, faz nos roçados, com suas unhas cortantes e seus dentes afiados, levaram os índios a criar  o ditado da cutia:

- O  sol foi embora / findou o dia / a noite é a hora / da velha vadia.

As histórias dos estragos feitos pela velha Agu, incorporada na cutia, são contadas nas malocas dos rios Vaupés e Tiquié. Algumas versões foram recolhidas pelo conde italiano Ermano Stradelli, que viveu 47 anos no Amazonas, onde aprendeu a língua geral - o nheengatu, e coletou mitos indígenas. Ele publicou, em 1929, o seu Vocabulário Nheengatu-Portuguez, em cujo verbete Acuty ou Aguti (p.361-362) aparece a versão aqui apresentada.

A Portaria

Mas quem ameaça estragar agora o roçado dos índios é outra AGU, a Advocacia-Geral da União. Seu chefe, Luís Inácio Lucena Adams, cujo status é de Ministro de Estado, assinou portaria determinando que o governo pode fazer nas terras indígenas aquilo que a cutia faz nos roçados: os estragos que quiser, sem necessidade de consultar as comunidades envolvidas ou sequer a própria Funai. Dessa forma, os índios passam a ser inquilinos em sua própria terra, que virou casa da sogra ou da mãe-joana.

A reação veio rápida. As redes sociais e as aldeias indígenas fervilharam com mensagens e notas de protesto. A indignação foi tão grande que um internauta, desesperado, manifestou que se a portaria não for revogada é o caso de fazer o que a presidente Dilma fez no combate à ditadura: pegar em armas. Os caciques, as lideranças e as organizações indígenas foram unânimes no repúdio à Portaria. Os aliados, alarmados, também se pronunciaram.

A Rede de Cooperação Alternativa, que congrega dez organizações, considerou a portaria "um retrocesso na garantia dos direitos indígenas", um ato "inadmissível e escandaloso" que fere a Constituição de 1988 e os acordos internacionais assinados pelo Brasil. Solicitou à presidente Dilma que determine a imediata revogação da Portaria e recomende à AGU "que aguarde a manifestação da Suprema Corte do país".

O Conselho Indigenista Missionário classificou a portaria como "excrescência jurídica", danosa para os índios, "muitos deles morando em acampamentos na beira de estradas ou em reservas superlotadas, enquanto esperam que suas terras ancestrais sejam demarcadas".

A própria Funai manifestou seu desacordo, considerando que a portaria aumenta a insegurança jurídica e coloca em risco os direitos garantidos constitucionalmente às comunidades indígenas. Em comunicado à imprensa, a Funai confirmou contatos com o advogado-geral da União, Luís Inácio Adams, que aceitou suspender a vigência da portaria até que sejam ouvidos os povos indígenas em audiência pública.

- Suspender não é suficiente: a COIAB exige a imediata revogação da Portaria 303 da AGU - reivindicou a Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira, apoiada no parecer de juristas e no descontentamento dos índios.  

Um dos juristas, Dalmo Dallari, argumentou que a portaria da AGU "contém evidentes inconstitucionalidades e ilegalidades",  pois "pretende revogar dispositivos constitucionais relativos aos direitos dos índios, além de afrontar disposições legais". Ele considerou que o advogado-geral da União não tem competência para fazer o que fez, querendo mudar a Constituição ou impor sua interpretação a quem não é seu subordinado, o que significa exorbitar de suas funções.

 

A cutia globalizada

Afinal, quais são mesmo as funções da AGU? A Advocacia-Geral da União foi criada em 1993 para defender o Estado e representá-lo judicial e extrajudicialmente. Seu chefe, nomeado pelo Presidente da República, comanda uma instituição encarregada de defender os interesses da União e de prestar consultoria e assessoramento jurídico ao poder executivo. Resta saber o que é que a nação brasileira ganha com uma portaria que pretende prejudicar quase um milhão de índios?

Os interesses nacionais não conflitam com os interesses dos índios. Ao contrário, o que é bom para os índios é bom para o Brasil. A diversidade cultural e linguística deve ser mantida para o bem de nossos filhos, de nossos netos e de toda a sociedade brasileira. Por isso, a Constituição de 1988 garantiu aos índios o direito à terra, sem o qual a diversidade deixa de existir. Por que, então, uma controvertida portaria ataca, como a cutia, o roçado dos índios? Parece que tem caroço debaixo dessa AGU.

E tem mesmo. Basta verificar como é que a tal Portaria foi cozinhada. Foi assim: a Confederação Nacional da Agricultura (CNA) e a Federação de Agricultura e Pecuária do Mato Grosso do Sul (FAMASUL) vêm pressionando a AGU há muito tempo. Em novembro do ano passado, encaminharam um documento, cobrando da AGU "uma norma definitiva e específica sobre a demarcação de terras indígenas em todo o país".

Os senadores Waldemir Moka (PMDB/MS - vixe, vixe) e Kátia Abreu (PSD/TO - vixe,vixe), acompanhados de outros dez senadores e de representantes da bancada ruralista se reuniram com o advogado-geral da União para discutir a possibilidade de o Governo Federal produzir a tal Portaria. A senadora Kátia, que é presidente da Confederação Nacional da Agricultura (CNA), declarou naquela ocasião aos jornais:

- "O Moka e eu queremos que a AGU oriente os órgãos da União como proceder sobre essa questão. Acreditamos que vamos ter sucesso".

Tiveram. Se o Moka quer, se a Kátia Abreu também, a AGU entendeu como uma ordem. Foi aí, das unhas cortantes e dos dentes afiados da cutia que surgiu a Portaria, contaminada de impropriedades técnicas, causando um vexame no mundo jurídico, o que talvez pudesse ter sido evitado se fosse consultado o Centro de Estudos Victor Nunes Leal (CEVNL), órgão responsável pelo aperfeiçoamento profissional dos membros da AGU, que teria advertido sobre o desacordo da Portaria com a Lei e a Constituição.

- A Portaria nº 303/2012 da Advocacia Geral da União não tem validade jurídica, e qualquer tentativa de lhe dar aplicação poderá e deverá ser bloqueada por via da ação judicial própria, a fim de que prevaleça a supremacia jurídica da Constituição, respeitados os direitos que ela assegurou aos índios brasileiros  - escreveu Dalmo Dallari.

Quem se beneficia com a tal Portaria? A nação perde, os índios perdem. Quem, então, ganha? Ela, a cutia. Podem verificar: onde tem terra indígena, tem o agronegócio - essa cutia globalizada - querendo invadir o roçado. É que os ruralistas confundem os lucros do agronegócio, que é privado e particular, com os interesses da nação brasileira. Eles são, apenas, uma pequena parte de uma totalidade, mas ignoram as outras partes e se consideram como se fossem o todo. Quando aumenta o lucro deles, "é o Brasil que se desenvolve”. Quando diminui, "é o Brasil que está em crise", não importa o que está acontecendo com os outros segmentos.

O Brasil é o agronegócio, que a AGU, pagando o maior mico, resolveu defender. A cutia,rondando o roçado, está assoviando:  

- O  sol foi embora / findou o dia / a noite é a hora / de baixar Portaria.

P.S. As organizações que protestaram foram, entre outras: Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro (FOIRN), Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (COIAB), Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), Conselho Indígena de Roraima (CIR), Comissão Terra Guarani (CTG), Comissão Guarani Yvyrupa (CGY), Associação Brasileira de Antropologia (ABA), Programa de Estudos dos Povos Indígenas da UERJ e a Rede de Cooperação Alternativa (RCA) que congrega as seguintes entidades: Instituto Sociambiental (ISA), Associação Terra Indígena Xingu – Atix, Associação Wyty-Catë dos Povos Timbira do MA e TO, Centro de Trabalho Indigenista – CTI, Comissão Pró-Índio do Acre – CPI-AC, Conselho das Aldeias Wajãpi -Apina, Hutukara Associação Yanomami - HAY,  Instituto de Pesquisa e Formação Indígena – Iepé e Organização dos Professores Indígenas do Acre – Opiac.

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José Ribamar Bessa Freire é professor universitário (UERJ), reside no Rio há mais de 20 anos, assina coluna no Diário do Amazonas, de Manaus, sua terra natal, e mantém o blog Taqui Pra Ti. Colabora com esta nossa Agência Assaz Atroz

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sábado, 28 de julho de 2012

Apareceu o novo e, provavelmente, verdadeiro documento que comprova o valerioduto tucano

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Fernando Soares Campos


Existem várias versões sobre a legitimidade ou falsidade da “Lista de Furnas”, aquela distribuída no início de 2006 pelo lobista e estelionatário Nilton Monteiro, que, segundo o jornal Estado de Minas, responde a 97 processos por estelionato, falsidade ideológica e de documentos públicos e formação de quadrilha nos tribunais de Justiça de Minas Gerais, Espírito Santo, Rio de Janeiro e Distrito Federal, no Superior Tribunal de Justiça (STJ) e no Supremo Tribunal Federal (STF)”.

. O “documento” relaciona 156 políticos, a maioria deles pertencente aos quadros do PSDB e PFL (atual DEM), que teriam recebido dinheiro para suas campanhas políticas em 2002. Dinheiro proveniente de propinas pagas por empresas colaboradoras, fornecedoras e prestadoras de serviços, relacionadas com a estatal Furnas Centrais Elétricas, no governo do sociopata Fernando Henrique Cardoso. As propinas teriam sido arrecadas por Dimas Toledo, diretor de obras de Furnas, diretoria essa que lidava com as inspeções de controle de qualidade sobre os serviços prestados por empreiteiras que trabalhavam em obras empreendidas por Furnas. E aí é fácil, sim, arrancar dinheiro dessa gente. E não dá para duvidar que Dimas Toledo não tenha arrecadado e distribuído as propinas com a maioria dos políticos relacionados na tal “Lista de Furnas”.

Mas há um “porém” nessa história.

Lembram-se dos petistas que Lula chamou de “aloprados”, por terem caído numa armadilha preparada por elementos ligados ao PSDB? Hoje essa história dos aloprados está esclarecida: foi a quadrilha do Cachoeira que armou a arapuca contra o PT, usando falsos petistas, que foram presos, mesmo sem terem cometido crime algum, e soltos em seguida. Eram infiltrados, que se diziam influentes no partido, mas que não passavam de elementos de pouca importância dentro da agremiação.

O “porém”, no caso das planilhas de Furnas, está no fato de terem sido divulgadas por um conhecido 171, o Nilton Monteiro, e, também muito provável, ter sido ele assessorado, ou estimulado, com promessas de recompensa, por Rogério Correia, deputado estadual do PT de Minas Gerais. (Este não parece ser simplesmente “aloprado”, mas, sim, um político malandro, exasperado, acostumado a mandar “fogo amigo” contra autoridades do próprio governo petista.)

No site “Polícia Federal – Agência de Notícias” há uma postagem intitulada “Apelo à comissão de ética”, de dezembro de 2011..

 A matéria é aberta com a seguinte epígrafe: “Representantes do PSDB, PPS, PP e DEM pedem à Assembleia Legislativa [MG] para investigar a participação do deputado Rogério Correia (PT) na elaboração do documento forjado [a “Lista de Furnas”].

E encerra com este parágrafo: “Documento de cinco páginas com supostas contribuições de campanha não contabilizadas a 156 políticos nas eleições de 2002. As denúncias de irregularidades se baseiam em transcrições de gravações em que o assessor do deputado Rogério Correia (PT) Simeão de Oliveira e o ex-deputado Agostinho Valente (PDT) aparecem conversando com Nilton Monteiro sobre a elaboração da lista. Segundo representantes dos partidos citados, ‘a lista seria uma trama para constranger e caluniar adversários políticos’”.

Quando a tal “Lista de Furnas” foi tornada pública na internet, a militância petistas e simpatizantes do governo Lula comemoraram: “Aí está a podridão dessa gente que ataca o PT!”

Ora, podridão mesmo a gente já acompanhava pela internet lendo as matérias que desnudam a Era FHC e tratam das corrupções nos casos de privatização das empresas estatais, agora ainda mais esclarecidas no livro “A Privataria Tucana”, de Amaury Ribeiro Jr. A “Lista de Furnas” é fichinha, se levarmos em conta do que o governo FHC do PSDB foi capaz.

Se for comprovado mesmo que o deputado estadual Rogério Correia (PT-MG) encomendou a falsificação da lista ao estelionatário Nilton Monteiro, pode ter a certeza de que este, antes de aprontar o serviço e distribuir a falsificação, consultou alguém da oposição (do PSDB ou do PFL, ou de ambos), passando a informação da “encomenda” e esperando uma contraproposta. Um sujeito desses “trabalha” para qualquer um, principalmente para quem lhe pagar mais. (Quando foi preso, ofereceram-lhe o benefício da delação premiada, mas nem assim o cara abriu o bico, pois quem tem “asterisco” tem medo).

Apostando na impunidade, os demotucanos deixaram correr solto, até gostaram da “brincadeira”, não fizeram nada para impedir o “trabalho” de Nilton Monteiro e de quem quer que o tenha encomendado. (O estelionatário não faria aquilo gratuitamente, nem por “vingança”, nem para oferecer munição aos petistas, que ainda estavam acossados pelas denúncias do “mensalão”.) A oposição sabia que a Polícia Federal já estava investigando o valerioduto tucano, o esquema que irrigou a campanha de Eduardo Azeredo para reeleição ao governo de Minas em 1998. E aquele “trabalho sujo” de Milton Monteiro viria a calhar, tumultuaria tudo.

Mas vamos continuar fazendo nossas “elucubrações” sobre o caso.

Cientes de que a tal “Lista de Furnas” divulgada pelo falsário Nilton Monteiro era um engodo que misturava verdades (Dimas Toledo era realmente um arrecadador e distribuidor de propinas para alavancar campanhas eleitorais, sim) e mentiras (a tal lista relaciona pessoas que não participaram do processo eleitoral de 2002, como se estas tivessem recebido dinheiro para suas campanhas; também se atribui a sua elaboração ao ano de 2002, porém existe empresa “doadora”, incluída na lista, mas que ainda nem existia naquele ano; portanto, a lista deve ter sido feita mesmo no final de 2005, início de 2006), pois bem, ciente disso, a oposição falou grosso: “É tudo falso!”, “Foi tudo feito pela ‘cúpula’ do PT para desviar o foco do ‘mensalão’!” “Provem!”

Escrevi em fevereiro de 2006, no diário iberoamericano La Insígnia, editado em Madri:

“A Oposição, por diversas ocasiões nas duas últimas semanas, denunciou que a divulgação da lista de Furnas teria sido uma manobra do PT, associou os seus distribuidores e divulgadores aos quadros do partido. Acusou o PT de ter divulgado a lista através da internet. Também pressionou a Polícia Federal a se manifestar sobre a legitimidade da tal lista. Ou seja, exigiu que o ministro Márcio Thomaz Bastos fosse irresponsável e se adiantasse informando que a lista teria, pelo menos, fortes indícios de autenticidade. O que não seria difícil fazê-lo, pois se trata de um documento autenticado e com a assinatura do autor reconhecida em cartório. Nos últimos dias, fizeram manobras para arrancar de políticos do PT declarações precipitadas, nas quais estes assumissem que acreditavam na legitimidade lista. No entanto, os petistas se portaram decentemente, defendendo o princípio da presunção de inocência. A oposição está inconformada com a forma cautelosa adotada pelo PT. (Leia o pronunciamento do senador Aloizio Mercadante na tribuna do Senado, em 07/02, artigo "Droga de lista, excelências!", La Insignia.) [Artigo intitulado “A lista é golpe”, 2006 – que pode ser lido em Mensalões e canastrões - a ópera bufa de Roberto Jefferson et caterva”]

A pressão para que o PT declarasse que a lista seria autêntica ou não

Em 07/02/2006, o senador Arthur Virgílio, em pronunciamento na Tribuna do Senado, desafiou o senador Aloisio Mercadante a dar sua opinião sobre a autenticidade ou não da “Lista de Furnas”

Trecho do pronunciamento do senador Arthur Virgílio:

Quero perguntar ao Líder Aloizio Mercadante algo bem simples: o Líder concorda? Acha que é verdadeira a lista de Furnas? Acha que aquilo é uma falsidade parecida com o Dossiê Cayman ou acha que é verdadeira a lista de Furnas? Quero essa opinião exposta com clareza para que façamos aqui o que S. Exª sempre chama, com muita elevação, de debate qualificado. Vamos fazer o debate qualificado sobre essa questão que envolve até o caráter, como enfrentamos a luta política.”

Claro que, se Mercadante declarasse que a lista era verdadeira ou falsa, em qualquer das hipóteses, Arthur Virgílio vibraria. Mas vibraria bem mais arrogante se o senador petista, de cúpula, afirmasse que a lista era “verdadeira”, pois provariam a falsidade do documento, apontando os seus erros. Mas não arrancaram uma só palavra, nesse sentido, de qualquer petista ou autoridade do governo Lula.

Vejamos alguns trechos do pronunciamento do senador Aloísio Mercadante, em resposta a Arthur Virgílio:

Sr. Presidente, um convite feito pelo Líder Arthur Virgílio, evidentemente, tem de ser considerado e acatado. É uma honra para mim poder falar e, sobretudo, tratar de um tema como esse que diz respeito a vários Parlamentares desta Casa.”

(...)

“Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, não vi, ao longo de todo esse processo, em nenhum momento, qualquer liderança do meu Partido apresentar essa lista para atacar membros da Oposição. Não o vi, não o vi. Tampouco posso aceitar essas críticas que estão sendo feitas ao Ministro da Justiça. O Ministro Márcio Thomaz Bastos, não só por essa longa vivência como advogado militante de direitos humanos, de direitos da cidadania, tem-se portado sempre com muito equilíbrio e com muita responsabilidade, dizendo que a Polícia Federal não vai proteger, nem poupar quem quer que seja. E a Polícia Federal tem dado exemplos de firmeza, de isenção, investigando toda e qualquer denúncia que lhe é apresentada, com todo o rigor necessário.”

(...)

“Essa denúncia sobre essa suposta lista de Furnas foi apresentada, ao que me consta, pelo Sr. Nilton Monteiro, que foi chamado a depor no dia 29 de agosto, em um inquérito que corre na Justiça Federal do Rio de Janeiro, responsável pela apuração dessa suposta lista, que foi encaminhada ao Instituto Nacional de Criminalística, que está procedendo às apurações. Destaco que o único fato que trouxe essa lista ao debate público foi o depoimento à Polícia Federal do Sr. Roberto Jefferson, que disse ter recebido a quantia mencionada na lista e que, portanto, trouxe a público a discussão desse episódio.”   

(...)

(O senador Antonio Carlos Magalhães solicita um aparte.)

“O Sr. Antonio Carlos Magalhães (PFL – BA) – V. Exª é cuidadoso, mas diz que acredita que não. Posso garantir que é falsa e disse isso ao Ministro Márcio Thomaz Bastos hoje. Dele ouvi a resposta que V. Exª está dando, que não me convence muito, embora minha amizade com S. Exª seja muito grande. Mas uma coisa é importante: V. Exª já acredita em Roberto Jefferson.”
“O SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT – SP) – Senador Antonio Carlos Magalhães, não ponha palavras que eu não disse na minha boca. Por sinal, quem, o tempo inteiro, tratou Roberto Jefferson como uma fonte fidedigna foi a Oposição e não nós.”

Para quem tiver tempo e paciência, acesse e leia os pronunciamentos dos senadores Arthur Virgílio e Aloisio Mercadante:



A oposição provocou, em diversas ocasiões, para que os petistas “de cúpula” afirmassem categoricamente, ou mesmo em meias palavras, que a “Lista de Furnas”, conforme a divulgação feita pelo lobista falsário Nilton Monteiro, seria verdadeira em todos os seus aspectos. Mas isso não ocorreu em momento algum, e os demotucanos espumaram de raiva. Eles sabiam que estavam blindados pelo PIG – Partido da Imprensa Golpista –, que praticamente não tratava do assunto nos telejornais, que é a informação no atacado, para o grande público. Somente uma vez fizem um arremedo de reportagem sobre o caso do valerioduto tucano oriundo de Furnas, mesmo assim abordaram de tal forma que, bem sei, grande parte dos telespectadores acreditou que a matéria tratava do “mensalão petista”. Escrevi sobre isso também: “O Dimasduto e os telejornais".

“Lista de Furnas” de 2002?! Ora, o buraco é bem mais embaixo

Agora, talvez, tudo venha a ser esclarecido.



“Valerioduto – O ministro Gilmar Mendes aparece entre os beneficiários do caixa 2 da campanha da reeleição de Eduardo Azeredo em 1998, operado por Marcos Valério”

(...)

A lista está metodicamente organizada. Sob o enunciado “Relatório de movimentação financeira da campanha da reeleição do governador Eduardo Brandão de Azeredo”, são perfilados em ordem alfabética doadores da campanha e os beneficiários dos recursos. São quase 30 páginas, escoradas em cerca de 20 comprovantes de depósitos que confirmam boa parte da movimentação financeira. Os repasses foram feitos por meio do Banco de Crédito Nacional (BCN) e do Banco Rural, cujos dirigentes são réus do “mensalão”petista.

Esse pacote de documentos foi entregue na quinta-feira 26 à delegada Josélia Braga da Cruz na Superintendência da Polícia Federal em Minas Gerais. Além de Mendes, entre doadores e receptores, aparecem algumas das maiores empresas do País, governadores, deputados, senadores, prefeitos e o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. A papelada desnuda o submundo das campanhas eleitorais inalcançado pela Justiça. Há registros de doações de prefeituras, estatais e outros órgãos públicos impedidos por lei de irrigar disputas políticas.

Os pagamentos foram feitos pela SMP&B Comunicação, empresa do ecumênico Marcos Valério de Souza. Todas as páginas são rubricadas pelo publicitário mineiro, com assinatura reconhecida em cartório no final do documento datado de 28 de março de 1999. Há ainda uma declaração assinada por Souza de 12 de setembro de 2007 e apresentada à Justiça de Minas Gerais. Souza informa um repasse de 4,5 milhões de reais a Azeredo. Intitulado “Declaração para fins de prova judicial ou extrajudicial”, o documento de apresentação assinado pelo publicitário afirma que o depósito milionário a favor de Azeredo foi feito “com autorização” dos coordenadores financeiros da campanha tucana Cláudio Roberto Mourão e Walfrido dos Mares Guia. As origens da quantia, diz o texto, são o Banco do Estado de Minas Gerais (BRMGE), Banco Rural, COMIG (atual CODEMIG, estatal de infraestrutura mineira), COPASA (companhia estadual de saneamento), Loteria Mineira (estatal de loterias) e as construtoras Andrade Gutierrez e ARG, “conforme declaração de reembolso assinada pelo declarante”.

Segundo a papelada, Souza afirma ter elaborado a lista em comum acordo com Mourão, principal tesoureiro da campanha de Azeredo, no mesmo dia 28 de março de 1999 que consta ao lado de sua assinatura. Chamada formalmente de “Relatório de movimentação financeira”, a lista teria sido montada “sob a administração financeira” das agências SMP&B Comunicação e DNA Propaganda. No fim, o publicitário faz questão de isentar o lobista Nilton Monteiro, apontado como autor da famosa lista de Furnas, de ter participado da confecção do documento. [Nota Assaz Atroz: Claro que não participou deste documento agora apresentado. Isso aí está muito além do alcance de um sujeito como ele.]

Monteiro provavelmente tem alguma ligação com a história. Há muitas semelhanças entre os dois documentos. A lista de Furnas, cuja autenticidade foi comprovada pela perícia técnica da Polícia Federal [Nota Assaz Atroz: Conforme pesquisas nossas em sites de busca, encontramos várias alegações de que a PF nunca comprovou a autenticidade da “Lista de Furnas”, em conformidade com o que Milton Monteiro divulgou pela internet e cópias xerográficas distribuídas. Fala-se que, ao ser pressionado a apresentar documentos originais, Monteiro os teria falsificado, aperfeiçoando-os em detalhes, e os entegou à PF, mas que não batem com as cópias anteriormente divulgadas], igualmente trazia uma lista de nomes de políticos, a maioria do PSDB e do ex-PFL (atual DEM), todos beneficiados por recursos de Caixa 2. Além de Monteiro, assinava o documento Dimas Toledo, ex-diretor de Furnas, que até hoje nega ter rubricado aqueles papéis. A diferença agora são os comprovantes de depósitos, as autenticações em cartório e uma riqueza de detalhes raramente vista em documentos desse tipo.

(Leia completo clicando AQUI

Minha “teoria” (ou “especulações”) sobre a divulgação da "Lista de Furnas" pode ser considerada delirante, como já me disseram, mas disseram apenas assim, “delirante”, não me apresentaram nada mais esclarecedor. Entretanto, onde encontrar esclarecimento de verdade sobre o caso da divulgação da “Lista de Furnas” pelo falsário Nilton Monteiro se o próprio Judiciário e as autoridades policiais não têm certeza de nada?

Agora, com esse novo documento, vamos ver se o PIG se manifesta.
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Leia também...


“Reportagem de Carta Capital mostra destinações à mídia de dinheiro do caixa dois da campanha de reeleição de  Eduardo Azeredo, em 1998; Abril, de Roberto Civita, teria recebido duas de R$ 49,5 mil cada; jornais mineiros e de Brasília na lista."

(Clique no título e leia nota no site BRASIL! BRASIL! )
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Ilustração: AIPC – Atrocious International Piracy of Cartoons
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sexta-feira, 27 de julho de 2012

A droga da política de combate às drogas fracassou!


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Pedro Abramovay: “Usuário pobre está sendo tratado como traficante”


Advogado foi demitido de Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas ao defender penas alternativas para pequenos traficantes | Foto: Ramiro Furquim/Sul21

Felipe Prestes

O advogado Pedro Abramovay foi secretário nacional de Justiça durante o Governo Lula, mas sua atuação chamou atenção do grande público no início do Governo Dilma. Convidado pela presidenta para ocupar a Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas, ele foi demitido algumas semanas depois, após o jornal O Globo ter publicado uma entrevista na qual ele teria defendido penas alternativas para pequenos traficantes. “Na entrevista eu não usei o termo “pequenos traficantes”, porque não é disto que estamos falando. Estamos falando muito mais de usuários que de traficantes. Não é uma fronteira muito clara, mas estamos falando, sobretudo, de usuários”, explica.

Agora, Abramovay continua defendendo mudanças na legislação antidrogas do país à frente do projeto Banco de Injustiças, que tem como objetivo mostrar que muitos usuários têm sido classificados como traficantes e presos equivocadamente. “O usuário pobre está sendo classificado como traficante e isto é uma injustiça brutal”.

O Sul21 conversou com o advogado durante o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, realizado em Porto Alegre na semana passada. Abramovay falou sobre vários temas relacionados às drogas, como a proposta de José Mujica, de que o governo uruguaio plante maconha e forneça determinadas quantidades aos usuários.
“Estamos em uma política de produção e reprodução da dor e do sofrimento. É uma política que não soluciona nenhum dos problemas que a droga causa”
Sul21 – Há organizações, o Banco de Injustiças entre elas, apontando que a nova legislação sobre drogas tem causado uma série de situações injustas. Que situações são estas?

Pedro Abramovay – A lei de 2006 disse que não cabe prisão para o consumidor e determinou penas altas para o traficante. Mas como ela não define quem é o consumidor e quem é o traficante, tem uma área cinza entre o consumidor e o traficante – que vai desde o consumidor até a pessoa que, eventualmente, vendeu droga para sustentar seu uso – que passou a ir para a cadeia. Se a gente olhar quem está sendo preso no Brasil hoje, 60% eram réus primários, com pequeníssimas quantidades, estavam sozinhos quando presos e desarmados. Este não é o perfil do traficante, é um perfil muito mais próximo do usuário. Só que são pessoas pobres – 80% destas pessoas só tinha até 1º grau completo. O usuário pobre está sendo classificado como traficante e isto é uma injustiça brutal.


"Se a gente olhar quem está sendo preso no Brasil hoje, 60% eram réus primários, com pequenas quantidades, estavam sozinhos quando presos e desarmados. Este não é o perfil do traficante" | Foto: Ramiro Furquim/Sul21

Sul21 – O senhor falou na palestra sobre uma série de arbitrariedades que estariam sendo cometidas em nome da Guerra às Drogas. Como está ocorrendo isto?

Pedro Abramovay – A lei de drogas fala que a pessoa tem que esperar o julgamento presa. Então, se você mata alguém, pode esperar em liberdade, mas se você é acusado de tráfico de drogas você tem que ficar preso até ser julgado. O Supremo já disse que isto é inconstitucional, mas muitos juízes continuam descumprindo esta decisão. No Banco de Injustiças, há o caso de uma senhora de 70 anos que foi presa, porque a polícia chegou na casa dela e encontrou crack que era do filho dela. Ela ficou três meses na prisão, porque tinha que aguardar julgamento, até perceberem que não tinha nada a ver com aquilo. Quem devolve este tempo de vida para ela? Ela ficou deprimida, foi internada. Este tipo de injustiça não é pontual. Está acontecendo o tempo inteiro, com pessoas pobres, sobretudo. Estamos em uma política de produção e reprodução da dor e do sofrimento. É uma política que não soluciona nenhum dos problemas que a droga causa, que são muitos, e agrava este problema. A gente precisa sair disto, precisa construir uma política que solucione problemas.

Sul21 – Então, quando o senhor deu aquela declaração que gerou polêmica, de que pequenos traficantes deveriam ter penas alternativas, não se referia a pequenos traficantes, mas a pessoas que, muitas vezes, estão sendo acusadas de forma equivocada.

Pedro Abramovay – Na entrevista a O Globo eu não usei o termo “pequenos traficantes”, porque não é disto que estamos falando. Estamos falando muito mais de usuários que de traficantes. Não é uma fronteira muito clara, mas estamos falando, sobretudo, de usuários. A gente está, sim, prendendo usuários no Brasil. A gente precisa desarmar o que montamos para nós mesmos.


Na visão de Pedro Abramovay, modelo brasileiro retira pessoas da sociedade, as coloca na prisão e as devolve com a pecha de criminosos | Foto: Ramiro Furquim/Sul21

Sul21 – Que efeito traz para estes usuários pobres estarem indo para a cadeia?

Pedro Abramovay – Tem uma pesquisa feita em São Paulo que mostra que, destas pessoas que estão indo presas, 62% tinham emprego e 9% tinham estudado. Estamos falando de pessoas produtivas, de alguma maneira, que a gente retira da sociedade, coloca na prisão e devolve para a sociedade com ligação com o crime organizado, com estigma de criminoso, que ninguém vai empregar. Então, a gente pega pessoas que não são criminosas e devolve para a sociedade criminosas. Não me parece um modelo adequado.

Sul21 – Quais poderiam ser as penas alternativas?

Pedro Abramovay – Podem ser diversas. Tem que dosar a partir de qual seja a conduta. No caso do usuário, o que a gente propõe não é nem que tenha pena alternativa, mas que sejam medidas administrativas, que podem ser desde advertência, frequentar um curso. Podem ser várias medidas, mas que não passem pelo sistema penal, porque o sistema penal impede o tratamento. Quando você diz que alguma coisa é crime, a primeira pessoa que vai olhar o usuário é o policial, não é um médico, não é uma assistente social. Enquanto for o policial, a saúde não entra.

Sul21 – As pessoas refutam o tratamento por medo?

Pedro Abramovay – Claro, o próprio médico também fica com uma aflição. Ele não é preparado para lidar com criminosos, mas com doentes.
“Os indicadores da guerra às drogas são apreensões, prisões, mortes de traficantes. Se não significam que o consumo e a violência estão caindo, não são indicadores de sucesso, mas de fracasso”
Sul21 – A comissão de juristas que discutiu o novo Código Penal previu a descriminalização do consumo de drogas.

Pedro Abramovay – Acho um grande passo. Mas acho que Portugal ensina para a gente que, além de não criminalizar, tem que ficar muito claro que aquela pessoa não vai para o sistema penal. Não é o juiz que tem que cuidar do usuário. Ninguém é a favor de legalizar passar (um carro) no sinal vermelho, mas ninguém acha que isto tem que ser crime, que o Ministério Público tem que fazer uma denúncia e que um juiz tem que condenar esse infrator. Não é esta a estrutura, é uma estrutura administrativa. O que a gente quer é que a pessoa que seja pega com drogas vá para uma comissão de especialistas que pense qual a melhor alternativa para ela, se uma advertência, uma multa, um tratamento, e construir uma saída, que não seja a saída criminal. Isto para pessoas que sejam pegas com uma quantidade abaixo de um determinado valor fixo, para que não se tenha a possibilidade de se cometer as arbitrariedades que são cometidas hoje – um modelo semelhante ao que é feito em Portugal.


Guerra às Drogas fracassou, defende Abramovay: "está se trabalhando muito, gastando muito dinheiro e muita energia para não alcançar os objetivos mais importantes" | Foto: Ramiro Furquim/Sul21

Sul21 – O senhor critica que os resultados da política de drogas sejam mais prisões e apreensões. Por quê?

Pedro Abramovay – Uma política consistente de drogas tem que ter como objetivos a redução da violência e acesso à saúde, que as pessoas tenham uma vida mais saudável. Como a repressão e a Guerra às Drogas nunca conseguiram reduzir o consumo nem a violência, os indicadores que se criam são indicadores que não dizem nada. São apreensões, prisões, mortes de traficantes. Se estes indicadores não significam que o consumo e a violência estão caindo, não são indicadores de sucesso, mas de fracasso. Significa que está se trabalhando muito, gastando muito dinheiro e muita energia para não alcançar os objetivos mais importantes.

Sul21 – O indicador deveria ser, por exemplo, quantas pessoas foram ressocializadas?

Pedro Abramovay – Mortes por overdose, quanto é? Em Portugal, ao descriminalizar, despencou o número de mortes por overdose. Este é um indicador de sucesso. As pessoas muitas vezes imaginam que a descriminalização aumenta o consumo, mas foi feita uma pesquisa por um instituto inglês em 21 países que tiveram medidas de flexibilização da legislação. Em nenhum deles aumentou o consumo. Em alguns até caiu. Não se diminuiu o consumo de nenhuma droga ilícita por meio da repressão. A única droga que se conseguiu diminuir o consumo por meio de atitude do Estado foi uma droga lícita: o tabaco. O caso do tabaco mostra que é possível reduzir consumo, mas se faz isto com regulação, não com cadeia. Com a criminalização, todo mundo tem acesso à droga, mas você não consegue tratar ninguém e prende pessoas que não cometeram violência contra ninguém.

Sul21 – Num segundo momento, o senhor defende a legalização do comércio, ou o plantio (de cannabis) em casa?

Pedro Abramovay – O tema do plantio em casa sem dúvida deve ser discutido. Há experiências bastante bem-sucedidas na Espanha. Acho que temos que debater isto no Brasil. A legalização é algo que nenhum país fez. Eu me sinto mais confortável em falar sobre a descriminalização, que é um modelo que deu certo onde tentaram, do que no modelo de legalização, que nunca ninguém testou.

Sul21 – Na Holanda não foi testado?

Pedro Abramovay – Na Holanda não é legalizado, porque a venda é permitida em pequenas quantidades, mas a produção não é. Então, os coffee shops compram ilicitamente a droga. Então, é um modelo que tem uma hipocrisia. A impressão que eu tenho é que pior que a atual política (do Brasil) não tem, uma política que não consegue frear o consumo e que causa tantos danos. Tem coisas que claramente já deram certo, como a descriminalização e o cultivo pessoal. Os outros passos têm que ser debatidos com muito cuidado e com atenção às experiências que outros países têm feito. Na Califórnia, por exemplo, se diz que foi regularizada a maconha medicinal, mas existe um milhão de pacientes cadastrados. A pessoa vai na farmácia, compra, e a sociedade californiana não teve nenhum prejuízo com esta medida. A gente tem que ter um debate baseado em dados concretos, na ciência, e não baseado na ideologia, no medo, na raiva – em geral, o tema de drogas é debatido assim. A gente quer debater como quem quer resolver o problema, e não como quem quer fazer barulho, dar a impressão de que está dando uma resposta sem, até agora, ter chegado perto de solucionar o problema.
“Até pouco tempo atrás, o tema das drogas no Brasil estava sob a guarda dos militares. Hoje, a Secretaria Nacional de Política sobre Drogas está no Ministério da Justiça. É um avanço extraordinário”

Fracasso da política de guerra contra drogas cria necessidade de testar outros mecanismos, defende Pedro Abramovay | Foto: Ramiro Furquim/Sul21

Sul21 – Como o senhor vê a proposta do presidente José Mujica, do Uruguai, de que o Estado plante maconha e de que isto separaria o usuário de maconha das drogas mais pesadas?

Pedro Abramovay – Nesta lógica de tanto esgarçamento da atual política é o momento de testar novas coisas, porque insistir no erro a gente sabe que não funciona. O caso do Uruguai tem algumas questões. Primeiro: a gente precisa descriminalizar não só a maconha, mas todas as drogas. Quanto maior efeito da droga sobre a pessoa, mais próxima de um doente esta pessoa vai estar e mais atenção de saúde, e não de prisão, esta pessoa deve ter. Então, não é que a droga mais grave deve ser criminalizada e a mais leve não. A gente não pode tratar nenhum usuário como criminoso. Do ponto de vista da legalização, muitas pessoas dizem que a maconha é a porta de entrada para outras drogas. Tem um estudo neozelandês que afirma isto, mas o próprio autor diz que a maconha é a porta de entrada porque a gente força os jovens a comprarem maconha da mesma pessoa que vende cocaína, que vende crack. Quando você vai no supermercado comprar arroz, você acaba comprando outras coisas. Então, o que torna a maconha uma porta de entrada é o fato de ela ser considerada ilícita. Acho que, de alguma maneira, separar a maconha — que é a droga responsável, de longe, pela maior parte do consumo de drogas ilícitas — é afastar os jovens do crime. Então, acho que tem algum sentido nisto. São experiências, inovações que a gente tem que olhar com calma, avaliar, ter a serenidade de ver quais são os resultados concretos disto, sem nenhum clima de oba-oba e nem de cegueira, como é o clima com que se convive com a política atual.

Sul21 – Qual é a visão do senhor sobre a internação compulsória dos dependentes químicos?

Pedro Abramovay – Eu não sou médico, mas li muitos artigos científicos sobre isto e vários mostram que a eficiência da internação compulsória é baixíssima, de menos de 10%. É claro que existem situações absolutamente excepcionais – menos de 5% dos casos – em que a pessoa pode ser avaliada como psicopata e não tem juízo sobre a situação e pode se matar, ou matar outra pessoa. Mas estes casos são exceção até no caso do crack. Na grande maioria dos casos, as pessoas têm, sim, total consciência nos momentos de abstinência e podem decidir por tratamento. Quando elas tomam esta decisão, a eficiência do tratamento é muito maior. E o tratamento ambulatorial e a rua têm eficiência muito maior que a internação, porque a relação da droga com a dependência não está na própria substância. O que faz a pessoa se tornar dependente é a relação da pessoa com a droga dentro de uma circunstância social específica. Então, se a pessoa está desempregada, vê naquilo uma muleta para seus problemas ou algo assim, a chance dela se tornar dependente é muito maior. Quando você interna a pessoa, desintoxica ela, mas devolve para o meio que gerou a dependência, ela vai voltar a ser dependente. Por isto é que a maioria dos casos de internação não funciona. Quando você consegue tratar a pessoa no meio em que ela vive e fazer ela lidar com os problemas que levaram à dependência, aí a pessoa consegue sair da tragédia das drogas.


"Hoje é possível debater o tema das drogas no Brasil. Antes, qualquer pessoa que levantasse essas questões era tachada de maluca" | Foto: Ramiro Furquim/Sul21

Sul21 – Como o senhor avalia a atual política do Governo Federal na questão de drogas?

Pedro Abramovay – Acho que o Governo Federal avançou em várias áreas no tema das drogas. Até pouco tempo atrás, o porta-voz do tema das drogas no Brasil era um general, o tema estava sob a guarda dos militares. Hoje, a Secretaria Nacional de Política sobre Drogas está no Ministério da Justiça e o grande porta-voz do plano tem sido o ministro da Saúde. É um avanço extraordinário que a gente possa ter este olhar sobre o tema e não o olhar de guerra. O Plano de Enfrentamento ao Crack pela primeira vez dá dinheiro para o tratamento ambulatorial, mas também dá dinheiro para a internação, e aí é uma contradição. Claro, há momentos em que você precisa de internação, mas são casos mais raros. Mas como não é o Governo Federal que executa, lá na ponta, nos municípios, você pode transformar o consultório de rua em uma carrocinha de pegar usuários pobres e levar para esconder na internação. Então, a gente tem quer vigiar muito de perto o plano para apoiar o que ele tem de muito positivo, que é incentivar o tratamento de rua, incentivar o olhar de saúde, e não deixar que setores mais conservadores se apropriem deste plano pelo lado da internação compulsória, não respaldada na ciência.

Sul21 – Em que pé está o debate sobre drogas neste momento no país? Avançamos?

Pedro Abramovay – Acho que pela primeira vez a gente tem o debate aparecendo de maneira séria. Agora, é possível debater o tema. Antigamente, qualquer pessoa que levantasse essas questões era taxada de maluca. Agora, é um tema sério, há grandes personalidades que discutem este tema, apresentam suas propostas. Acho que é um cenário positivo. Ainda está longe de ser um tema discutido sem preconceito, mas acho que a gente pode finalmente discutir o tema com base em dados, em pesquisas, e não só em ideologia e impressões.

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