terça-feira, 15 de setembro de 2009

O Brasil do faz-de-conta



FAZ DE CONTA QUE AS COISAS SÃO ASSIM, NÃO IMPORTA QUE SEJAM ASSADO

Laerte Braga

Num determinado momento o grande dilema da vida passa a ser a escolha do creme dental. Se você vai usar “colgate” ou “sensodyne”. A “máquina de fazer doido”, definição magistral de Sérgio Porto para a televisão mostra a você dentistas com aparências sérias, de competência inquestionável e cada qual recomendando um ou outro dos maravilhosos cremes dentais. A categoria não tem culpa.

Pula para os desinfetantes domésticos. Aqueles que trazem os aromas da natureza para dentro da sua casa. De repente você descobre que existe um produto que tira manchas, vem em forma de pó, numa embalagem rosa (existe a embalagem alternativa, branca, alva) e que, além disso, é “inteligente”. Procura as manchas ocultas.

Aí você fica petrificado. No bom sentido da palavra, na verdade, você fica coisa assim, sem perceber que está sendo assado em fogo baixo. Terminados os comerciais volta o filme, a novela, ou então aparece William Bonner, especialista em Homer Simpson, para dizer que “os terroristas” estão à sua volta e é preciso fechar as janelas, não olhar para os lados, desconfiar de quase tudo (para confiar só nele e no que representa) e tudo termina numa pesquisa do IBOPE.

A notícia mais importante é que na Feira do Livro, no Rio de Janeiro, quando Xuxa chegou, para além do frisson que despertou ao abaixar-se, deixou à mostra um “tattoo”. É um golfinho.

Os produtores de milho transgênico estão se descabelando. É que os consumidores europeus cismaram de não consumir produtos transgênicos. Por lá a lei exige que essas aberrações sejam muito bem definidas nas embalagens.

Aí, por aqui, terra descoberta por Cabral, a senadora Kátia Abreu, envolvida em desvios de recursos de campanha eleitoral, quer uma CPI para apurar os recursos transferidos pelo governo federal aos projetos de agricultura familiar do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra). A revista VEJA, da editora ABRIL, beneficiária de contratos milionários com o governo de São Paulo (país vizinho que fala a mesma língua), vem em seguida para mostrar que tudo não passa de uma “farra” e que por detrás desse negócio de reforma agrária existe um monstro pré-histórico que quer deter a formidável máquina do progresso.

Depende de como você vê o progresso. Se comum a todos pode até ser. Se só para alguns, não passa de privilégio.

“O mundo segundo a Monsanto”, empresa produtora de sementes transgênicas é um filme de Marie-Monique Robin, francesa, foi produzido em 2008, tem 109 minutos de duração e mostra como a empresa coloca em risco o meio ambiente e a segurança alimentar da humanidade.

Nem uma notícia na GLOBO ou nos acessórios de menor porte. A Monsanto é anunciante. Veicula os milagres da tecnologia.

Mas isso é coisa para depois, nem você e nem eu estaremos aqui para ver. Ou sentir. Importante é ter consciência que Paris Hilton é um exemplo de sucesso e vai para o livro de “frases sábias”, uma coletânea de idiotices transformadas em auto-ajuda para elevar a estima dos consumidores e preferencialmente a freqüência aos shoppings. Não importa que você não seja herdeira de uma grande fortuna, ou que não seja bonita para os padrões definidos pelos senhores da beleza, o que vale é seguir o modelo Paris Hilton, afinal democracia é isso, direitos iguais.

Matricule seu filho na “escola” da Xuxa e tenha a paz dos justos, assegurando a ele o deserto do futuro.

Esse vem pelas mãos de Antônio Ermírio de Moraes, homem do ano todos os anos, na faina predadora da destruição ambiental, mas que gera empregos, tanto quanto doenças, fome, miséria e papel para que a FOLHA DE SÃO PAULO convença você através de um infográfico que José Serra pode não saber direito o que é uma vaca, mas sabe o que é um caixa dois de campanha.

A direção de jornalismo do complexo GLOBO (jornal, rádios, tevês e revista) decidiu que os jornalistas do grupo deverão tratar a candidatura Marina da Silva só no que diz respeito a questões ambientais. Se Marina apresentar uma proposta para além de sua bandeira principal neca de pitibiriba, pois pode atrapalhar o DEMônio tucano (fica parecendo até Edir Macedo) e o papel que cabe a Marina é servir de tapete para a marcha triunfal de José Serra até Brasília.

Se a moça vai se deixar engolir é outra história. Não tem cara de quem vai permitir esse estupro e nem essa história, essa transformação em instrumento dócil e ingênuo dos senhores do mundo.


Sílvio Berlusconi, primeiro-ministro da Itália e patrão de Gilmar Mendes, presidente da STF DANTAS INCORPORARTION LTD, está enrolado com essa moça da foto. É Patrizia D´Addario. Exercia o ofício de “garota de programa” e foi contratada várias vezes para as festas do primeiro-ministro. Mil euros por participação e mais mil se topasse ir para a cama. Isso duas vezes por semana. Fez, admite ela, um razoável pé de meia e só não foi candidata ao Parlamento Europeu por conta de um jornal independente que cismou de mostrar a história e publicar algumas fotos. Berlusconi tinha prometido a ela a candidatura por seu partido.

De quebra usou o celular para gravar os momentos íntimos com o primeiro-ministro. Vive hoje de palestras nos melhores centros culturais e universidades européias, onde conta tudo o que viu e ouviu nos palácios berlusconianos.

Já o primeiro-ministro, misto de político, banqueiro e pilantra, afirma que é tudo mentira, que nunca pagou por sexo, pois o prazer do homem é a conquista. Quando o jornalista Miguel Mora do EL PAÍS, espanhol, perguntou-lhe se pagava por programas com garotas, olhou-o de cima embaixo, ajeitou o nó da gravata e disparou – “o senhor está é com inveja” –. Nem quis falar sobre o cafetão. Um empreiteiro que em troca recebia contratos para obras públicas.


Tão logo soube das declarações de Berlusconi a moça desafiou-o para um debate público, em rede nacional de rádio e tevê.

Cega é a justiça e culpado é Cesare Battisti.



A foto acima é de um desembargador do Tribunal de Justiça do estado da Bahia. O tribunal estava em sessão, considerada de importância e o magistrado decidiu recorrer ao xadrez, na certa, para ajudá-lo a resolver as intricadas questões jurídicas que dizem respeito ao mundo democrático, ocidental, cristão e capitalista. O nome do enxadrista é Carlos Roberto Santos Araújo.

Eu se fosse o delegado Protógenes Queiroz tratava de arranjar um habeas corpus preventivo. Na certa VEJA vai dizer que tudo não passa de gravações ilegais no gabinete de Gilmar Mendes, onde as questões são resolvidas pela porta dos fundos. Se as gravações existem ou não, isso é irrelevante. O que conta mesmo é o tira manchas inteligente.

Do outro lado, no conceito deles, está o Homer Simpson.

E um detalhe, têm indicações mágicas para todos os casos. Se o seu padrão de consumidor não for o padrão “colgate” ou o padrão “sensodyne”, não se preocupe, tem um sabão em forma de pasta e com o sugestivo nome de Sorriso.

“Vista-se bem onde quer que vá, a vida é curta demais para se passar despercebido”. Inteiro teor da contribuição de Paris Hilton ao bem estar do ser humano. Se você não puder vestir-se como Paris Hilton, monte um jegue e saia nu ou nua pelas ruas. Vai ser percebido. E detido aos costumes.

Um cidadão de 41 anos, em Sorocaba, interior de São Paulo, invadiu a prisão da cidade e pediu para ser preso, trancafiado de forma tal que pudesse ter segurança e tranqüilidade. “Aqui é melhor que lá fora, me sinto mais seguro”. O dito cujo já tentara sem êxito ser preso em outras oportunidades. Condenado por homicídio doloso estava em regime semi-aberto. Preferiu o trancafiado.

Coelho Neto, um tanto reacionário, mas com virtude de ter sido um dos fundadores do Fluminense Football Club, escreveu que “ser mãe é padecer num paraíso”. Não sei, mas prevejo, no futuro, invasões constantes de úteros na tentativa de pare o mundo que eu quero descer. Vai ser uma volta às origens. O Fluminense não, é uma espécie em extinção.

É que o assim aqui está ficando assado. E nessa lógica perversa do progresso, o tal progresso que contribui para o tal PIB, a classe média está de volta ao quarto e sala. Quem diz isso é a revista ÉPOCA, uma das espécies voltadas a Homer Simpsons. E o altar está lá. Digital de não sei quantas polegadas, com imagem HD, acho que é isso. O título? “Famílias encaixotadas”.

Bem faz o Pastinha que se perceber a chance de dez mil segura quinhentos que já dá para o torresmo, a cerveja e um troféu no próximo torneio de sinuca.

E fique atento, vem aí o parto de Ivete Sangalo. Cobertura completa, com todos os detalhes e exclusiva. Com direito ao primeiro choro do bebê. E as lágrimas de emoção dos distintos telespectadores.

Se tudo falhar, não se desespere. Barack Obama é um cidadão branco, dizem que presidente dos Estados Unidos (existem dúvidas). Trabalha de garçom, mágico vendedor de ilusões e agora incorporou o biscate de pintor. Garçons, mágicos e pintores cuidado. O cara é um prodígio de “sou, mas quem não é?"

Laerte Braga é jornalista, escritor, cineasta e colabora com esta Agência Assaz Atroz
.

PressAA
.

Nenhum comentário: