domingo, 3 de janeiro de 2010

DESMITIFICANDO LULA – 4

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Raul Longo

Algo me diz que meu amigo Príamo mantém veleidades à Presidência da República. Mas não se o julgue pretensioso, afinal, é empresário há muitos anos e entre os de seu relacionamento pode encontrar pessoas suficientemente preparadas para formar uma equipe de governo.

Não é coisa fácil, é verdade. Nunca foi fácil formar uma equipe competente de governo em lugar algum do mundo.

E faz tempo! Porque isso de dizer que a Inglaterra, apesar de ilha tão pouco produtiva, se fez em grande país, é conversa pra inglês mesmo. Ter um exército e uma armada capaz de subjugar o mundo não quer dizer que se faz um bom país para seu povo. É só ler o Charles Dickens para se conferir que a monarquia inglesa era tão cruel com os súditos no próprio país quanto o foi com os dominados que nunca viam o sol se pôr de tanto que trabalhavam para sustentar o luxo e a vagabundagem da família real.

Aliás, os nobres das equipes de governo de todas as monarquias foram um desastre. Daí a Revolução Francesa. No entanto, apesar daqueles intelectuais e filósofos que ainda hoje influenciam concepções políticas, o projeto de governo republicano que substituiu a monarquia do Palácio de Versalhes acabou fracassando para Napoleão, que restaurou o Império e não se fiava muito em trabalho de equipe. Tomava as decisões que lhe dessem na telha.

Quebrou a cara.

Mas além de Napoleão há o exemplo de Hitler, que também não escutava sua equipe de governo, ou só escutava os puxa-sacos de sempre. Esses são um perigo, e até Machiavel alertou contra eles.

Não acredito que Príamo cometesse esses mesmos erros. Por certo formaria uma boa equipe de governo para aconselhá-lo. Mesmo assim, não é nada fácil.

Não, não é! Veja-se os Estados Unidos com todos aqueles secretários de estado, chefes de departamentos, especialistas disso e daquilo. Deu no fiasco que deu, levando o mundo inteiro a uma crise que andou marolando até por aqui e têm afogado muitas nações de maior tradição em estabilidade econômica.

Assim mesmo eu confio que Príamo saiba selecionar conselheiros bastante dedicados e diligentes aos problemas da nação e do povo brasileiro, apesar de que, hoje, já lhe apontem como uma das contradições do governo Lula: c) Criou um número exagerado de ministérios, com alguns confundindo competências.

Claro que presidentes não dizem: “- Faça-se!” E se faz. Isso é coisa pra quem tem poderes de criar o mundo do nada e não precisa responder com tantas responsabilidades.

Se nada existia não havia mesmo com que se responsabilizar, mas quando um presidente toma para si a responsabilidade de mudar a realidade social de um país em falência e descrédito mundial, evidentemente não vai ser megalomaníaco para tomar todas as decisões por si.

Por mais assombroso e por maior inteligência e capacidade que assombrem o mundo, como diz o El País da Espanha, claro que Lula consulta sua equipe de pessoas experientes com profundos conhecimentos sobre as diversas realidades e problemas que compõem o país, antes de dissolver e criar Ministérios.

Portanto, se alguém criou um número exagerado de ministérios não foi o Lula sozinho e, sem dúvida, teve o auxílio de gente que há muitos anos se debruça sobre os assuntos a que esses inúmeros ministérios se referem.

Mas a quanto remonta essa inumerabilidade toda? Em média, cada país, cada governo de qualquer nação conta com uns 20 Ministérios. Alguns um pouco mais, outros pouco menos, de acordo com o tamanho do país e tipos de problemas que têm de enfrentar. Quando estive no Chile, por exemplo – que naquela época já adotara o neoliberalismo econômico dos Chicago Boys do Milton Friedman, pai da idéia do estado mínimo –, achei muito simpático terem por lá o Ministério da Infância e da Juventude, graças ao qual pude ingressar no programa de albergues juvenis que se espalhavam por todo o país. Na mesma época aqui só tínhamos dois similares no Rio de Janeiro e um na Bahia.

Se eu fizesse parte da equipe de gestão do governo Lula, aconselharia a criação de um Ministério da Infância da Juventude como o do Chile, que, certamente, não estava lá só para oferecer albergues aos jovens mochileiros que vagueiam de norte ao sul do país; como fiz por mais de um mês sem sequer ouvir falar em maconha, cocaína, crack ou qualquer outra droga.

Mas, preocupado com as contradições de gestão do governo Lula, fui conferir quantas novas pastas ministeriais foram criadas apenas para distribuir cargos para a turma do PT, conforme ouvi dizer.

Aproveitando as comodidades e facilidades da internet, digitei no Google: Ministérios Brasileiros. Levei um susto! Um paisão deste tamanho com tão profundos e históricos problemas, com apenas 24 ministérios!

Quantos eram, então, antes do governo Lula? Clica daqui e dali, descubro terem sido, quando muito, 20. Embora a equipe do Lula tenha criado 5 novos Ministérios, não fecha a conta em 25 porque se dissolveu o Ministério do Interior, aquele que promovia e escondia escândalos como o da SUDENE, da SUDAM e outros mais que beneficiaram ACM, Inocêncio Oliveira, Jader Barbalho e tantos outros coronéis da seca e do desmatamento.

No lugar do Ministério do Interior criaram dois outros: o da Integração Nacional, responsável pela formulação e condução da política de desenvolvimento nacional integrada, e o das Cidades, para humanizar os espaços urbanos, ampliar o acesso da população à moradia, ao saneamento e ao transporte.

Nenhum dos dois Ministros é do PT, mesmo assim fui verificar o que se anda fazendo por lá. Resumindo: não dá pra resumir. Só indo na página do Ministério para conferir os programas que estão sendo implantados em 13 mesorregiões do norte ao sul do Brasil. Tudo explicadinho, inclusive os custos de cada programa, cotejamento populacional, parcerias, etc.

Só o que não consegui descobrir, por mais que pesquisasse as páginas de todos, foi onde as atribuições desse Ministério possam se confundir com as de outros. Desenvolver um trabalho estrategicamente integrado sim, mas confundir, impossível!

O que preocupa é que, se alguém da equipe de Príamo resolver extinguir esse Ministério, meu amigo será derrotado nas urnas dos interiores do país.
Já na página do Ministério das Cidades descobri que, há cerca de um século, apenas 10% da população brasileira ocupavam os centros urbanos. Atualmente são 82%! Mas lógico que este atualmente não é apenas hoje, agora, nem somente de há duas ou três décadas.

Platão e Aristóteles já alertavam contra os excessos populacionais das pólis gregas, e me pergunto que irresponsabilidade é essa das equipes gestoras dos anteriores presidentes? Como não se criou esse Ministério das Cidades antes? Pensavam que um país é o quê?

Durante um seminário indigenista no Teatro Glauce Rocha da UFMS, em Campo Grande, no ano de 1980, o escritor Afonso Romano de Sant’Anna apresentou pela primeira vez em público um belíssimo poema que num refrão advertia: “Uma coisa é um país/ Outra um ajuntamento.”

E só agora alguém tem percepção suficiente para criar esse Ministério? Não é a toa que chegamos ao caos e à violência urbana que temos!

Com o amontoamento de problemas por esta longeva irresponsabilidade, as atribuições e ações do Ministério das Cidades são tantas que só consultando o sítio na internet. Ali se evidencia que, apesar de trabalhar integrado a praticamente todos os outros, como ocorre com organismos de um governo com eficiente e produtiva equipe, não é possível nem imaginar que suas competências possam ser confundidas com a de algum outro ministério. E Príamo que exonere de sua equipe quem tenha lhe passado essa informação, pois falou sem fazer a menor idéia do assunto. Improcedências como essas é que levam um bom candidato ao fracasso eleitoral.

Mas o que realmente me surpreendeu nessa pesquisa foi a desmitificação de que os inúmeros ministérios (que cabem nos dedos de uma única mão) tenham sido criados para acomodar os colegas do partido do Presidente. Apenas dois são ocupados por petistas.

Se Príamo aceitar conselhos, sugiro que não mexa com o do Desenvolvimento Social e Combate à Fome; pois, se o fizer, seu governo perderá definitivamente qualquer credibilidade internacional, provocando uma comoção negativa em todo o mundo civilizado. Ainda mais agora que grandes e ricas nações vêm copiando o Programa Bolsa Família!

No Brasil ainda existe gente que, apesar de ir às lágrimas com as cenas de filmes e documentários sobre o holocausto da II Guerra, acha que se deve mesmo é deixar pobre brasileiro morrer de fome. No entanto, principalmente depois que economistas, inclusive da oposição, descobriram que o Bolsa Família foi um dos grandes responsáveis por havermos saído da crise e aqui ela não ter passado de marola (como previu Lula contra a vontade da imprensa especializada), a classe média mais esclarecida acabou compreendendo que também é beneficiada quando uma equipe de governo faz algo de efetivo e planejado para combater a miséria do país.

Príamo que abra os olhos com seus conselheiros! Pois o que lhe tenham dito para provar que algum dos mais de 20 programas, serviços e atribuições desse Ministério (além do Bolsa Família), se confunda com a competência de algum outro é coisa de quem não entende coisa alguma de gestão de governo voltado para os reais interesses da população de um país, ou está de má fé e quer enterrar as possibilidades políticas do amigo.

Outro Ministério administrado por um petista é o da Pesca e Aqüicultura.

Como a costa atlântica do Brasil tem aproximadamente 8 mil quilômetros de extensão e nenhum outro país do mundo é abastecido de tantos piscosos cursos d’água, nem achei necessário pesquisar a página referente a esse Ministério que atende diretamente aos interesses de aproximadamente 150 mil famílias de aquicultores e 680 mil famílias de pescadores e, indiretamente, às populações das inúmeras regiões onde vivem essas colônias e comunidades, seja do litoral do Rio do Grande do Sul ao do Pará, seja na Bacia do São Francisco, na Amazônica, no Araguaia, Pantanal Matogrossense, Bacia do Paraná e outros.

Antes, as atribuições do Ministério da Pesca recaíam sobre um departamento do Ministério da Agricultura, numa perfeita união de promoção de vendas de defensivos agrícolas e mortandade de peixes em rios e lagoas. Isso ainda ocorre aqui ou ali, mas terá o assessor de Príamo reparado como se reduziu a incidência desses casos nos noticiários de TV? Imaginará a que se deve?

No entanto, o melhor argumento para a criação deste Ministério encontrei na página de outro provável candidato à presidência que, assinando um blog com o nome de Vitor Wilher, escreve para desqualificar o decreto de criação do Ministério da Pesca e Aqüicultura: “O Brasil, senhores, tem o maior potencial hídrico do mundo e produz (muito) menos pescado do que o Japão…”

Exatamente Vitor! Pegou bem a lógica que determinou à criação do Ministério, ainda que pelo sentido inverso. Só não acertou na formação de sua equipe de governo que, como se denota neste raciocínio tão típico de nossos anteriores governantes, é ainda pior conselheira do que a de Príamo.

O que consola é que com esse tipo de “perspicácia” será mais uma candidatura fadada à derrota. Ao menos enquanto o país preferir governos que enfrentem a incompetência dos antecessores com providências, e não como o médico que por diagnosticar existência da doença, entende não haver sentido no remédio.

Por fim, resta o Ministério do Turismo, também desmembrado do antigo Ministério do Esporte e Turismo, que, se não me engano, já foi Ministério da Cultura, Esporte e Turismo. Talvez esteja enganado, mas como muito pouco se fazia nesse país pela cultura, que não fosse através dos patrocínios da Lei Rouanet aos Micheline (do grupo Sharp); pelo turismo, a não ser pelas tetas das mulatas de escolas de samba; e pelo esporte, à exceção do futebol; pouco importa se me engano ou não.


Pois esse turismo, que até 2002 batia recordes de U$ 2 bilhões em arrecadação, em 2006 duplicou a arrecadação do país neste setor para U$ 4 bilhões e pico. Demonstração inequívoca de que a equipe de gestão do governo Lula esteve corretíssima ao propor a criação do Ministério de Turismo. Aliás, a pasta não é de político de partido algum e, para quem reconhece que uma coisa é uma coisa e outra coisa é outra coisa, estará claro que não se confunde com competência alguma de nenhum outro Ministério.

O governo Lula também criou algumas novas Secretarias e já que estava pesquisando os Ministérios, aproveitei para ler a respeito. Assim, caso amanhã ou depois eu tenha algo a criticar ou apoiar o governo pela formação de sua equipe de gestão política e administração federal, já tenho bases para apontar acertos e falhas reais e verdadeiras. Portanto, se Príamo ou alguém mais quiser saber alguma coisa sobre as Secretarias de Estado criadas nesse governo, e tem preguiça de pesquisar na Internet, é só escrever que ajudo a levantar o véu da mídia para que se possa olhar a realidade como ela realmente é.

Quem sabe assim descobrimos o Hércules que há em nós e existe em cada um, inclusive nos garis.

Raul Longo
www.sambaqui.com.br/pousodapoesia
Ponta do Sambaqui, 2886
Floripa/SC

Raul Longo, jornalista, escritor e poeta, colabora com esta nossa Agência Assaz Atroz

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PressAA

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