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Rui Martins*
Impressionante, há três dias não há nenhum avião no céu da Europa, essa ausência parece inacreditável.
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Dizem que a perda é de 200 milhões de euros por dia, quase cem mil vôos anulados, silêncio no céu, nenhum avião.
Me belisco para confirmar não estar num sonho ou num pesadelo, mas é verdade, um vulcão na Islândia, e dos mais fracos, nível 2 em 7, está cuspindo tanta fumaça que provocou a paralisação de praticamente todos os aeroportos europeus.
Para os poloneses, cujo presidente morreu num acidente de avião, foi um azarão – todos os chefes de Estado que iriam ao enterro tiveram de anular e a cerimônia só contou mesmo com o presidente russo. Presença importante porque significa o fim, pelo menos se espera, de uma velha inimizade.
Enquanto passeava neste domingão, o silêncio chegava a ser impressionante. Como a poeira abrasiva lançada pelo vulcão conseguiu privar os europeus desse meio de transporte hoje quase vital para quem parte de férias?
As aulas recomeçam nesta segunda-feira, depois das férias da Páscoa, porém, muitos alunos e suas famílias estão bloqueados sem poder viajar. Quem tirou férias na própria Europa toma de assalto qualquer tipo de transporte disponível – trem, os raros ônibus (transporte rodoviário não é tão comum como no Brasil) e mesmo navios.
Em lugar do vôo rápido, sem cansaço, os europeus não têm outra solução senão a de fazer longas viagens de regresso de férias. Quem tem sorte de achar lugar, os outros pagam diárias de hotel e não sabem como fazer se a crise continuar.
Os dinossauros não voavam e nem tomavam avião, mas dizem que existem duas teorias sobre sua extinção – a da existência de muitos vulcões em atividade ou da queda de um enorme meteorito no que seria a América do Norte. Nos dois casos, formou-se uma espessa fumaça, que encobriu o sol por alguns anos, a vegetação morreu e os dinossauros também por falta do que comer.
Contam que um vulcão, de nível 5, começou a vomitar lavas e fumaça, em 1788, escurecendo o céu e provocando péssimas colheitas por falta de sol e um rigoroso inverno. Com fome e frio, os franceses partiram, no ano seguinte, para a revolução.
A falta de aviões, talvez por mais um ou dois dias, não vai provocar rebeliões, porque não é causada por greves e nem por aumento do preço do querosene. Mas não deixa de ser um ato extremo, inconsciente por certo, da natureza.
De repente, os orgulhosos humanos, de ego tão grande que se creem capazes de mudar o clima na Terra, descobrem nada poder fazer contra um vulcão talibã, terrorista e fundamentalista.
Provavelmente, mais um insubordinado contra Deus. Tivemos o tsunami na Ásia, o terremoto no Haiti, agora o vulcão, que não matou ninguém, mas paralisa o transporte aéreo europeu e mostra a fragilidade humana.
Um só vulcão fazendo mais estragos que milhões de carros beidadores de gás carbônico. De nada adiantou tanta gente deixar de poluir, vem um danado de um vulcão e enche o céu, não só de gás carbônico, mas de poeira abrasiva, tipo lixa.
Ah, a natureza, ela é danada, ela afoga, ela sacode, ela pode entupir motor de avião. Ela age quando quer, mesmo sem ter vontade. E nós humanos, descobrimos que nosso planeta é grande, independente, fora do nosso controle.
Deve ter gente achando ser mais um sinal do próximo fim do mundo, o calendário dos Maias não prevê fim daqui a dois anos? Para outros, Jesus deve estar voltando, vai haver ressurreição geral, julgamento melhor que os do STF com punição garantida para muitos pilantras.
Mas não é nada disso. Dizia Arthur Clarke, o mesmo de 2001 Odisséia no Espaço, que os homens vão se decepcionar de Deus, vendo a natureza dura, má, sem código de ética, sem respeitar qualquer credo ou dogma.
A Terra, uma bola jogada no espaço, de vez em quando tem dor de barriga e vomita fogo. E nós não passamos mesmo de uns parasitas sem importância, colados na pele grossa desse planeta.
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Para Rui Martins, o governo brasileiro deveria criar uma nova política de emigração a exemplo de Portugal, França, Itália e mesmo México e Equador.
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http://www.francophones-de-berne.ch/
http://www.estadodoemigrante.org/
*Ex-correspondente do Estadão e da CBN, após exílio na França. Autor do livro “O Dinheiro Sujo da Corrupção”, criou os Brasileirinhos Apátridas e propõe o Estado dos Emigrantes. Vive na Suíça, colabora com os jornais portugueses Público e Expresso, é colunista do site Direto da Redação. Colabora com esta nossa Agência Assaz Atroz
Ilustração: AIPC - Atrocious International Piracy of Cartoons
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PressAA
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