sexta-feira, 31 de agosto de 2018

Vida após a morte: isto não é prova, mas são evidências

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Vida após a morte: isto não é prova, mas são evidências

Por Fernando Soares Campos(*)

Suponho que o indivíduo que se declara ateu é, consequentemente, materialista, ou seja, considera toda atividade espiritual humana um mero efeito de organismos materiais, principalmente os que formam o sistema nervoso e o cérebro. Assim, podemos ainda supor que o ateu acredita que, quando da extinção das atividades físicas, a morte do corpo organizado, extinguem-se também as atividades psíquicas, as manifestações anímicas do corpo quando organizadamente vivo. 
Para o ateu, depois da morte do indivíduo, a matéria se decompõe e aquele corpo não mais manifestará vida inteligente. 

De certa forma, ele tem razão, mas apenas de certa forma, e não de forma abrangente.

A falta de fé e descrença numa divindade podem ser manifestações mentais e afetivas tão religiosas quanto crer e ter fé numa entidade divina. Isso ocorre quando o indivíduo diz que não crê na existência de Deus porque não encontra argumento lógico em nenhuma das formas dos deuses propostos pelas religiões. Para esse tipo de ateu, que está mais propenso ao agnosticismo, nenhuma divindade suprema que lhe foi apresentada pode ser aprovada quando submetida a uma análise sob método empírico de comprovação científica.

Contraposto ao ateu, existe quem crê na existência de um deus personificado, uma entidade ultrassublime, uma psique onisciente, onipotente e onipresente, um deus criador de todas as coisas, inclusive, das psiques etéreas à sua semelhança, as quais seriam dotadas de corpos materiais densos para se locomover e se comunicar entre si, enquanto habitassem, por curto período, um orbe como a terra ou similar. Seus corpos materiais teriam a propriedade da reprodução e existiriam por um ciclo vital (nascimento, vida e morte). Sob essa condição, as psiques etéreas (almas) seriam consideradas encarnadas, ou materializadas, e surgiriam juntamente com a formação do corpo material. O final do ciclo vital, a morte, seria apenas do corpo físico, enquanto a psique etérea sobreviveria independente, livre da matéria tangível.  

Ao projeto da criação, a psique ultrassublime, a criadora, teria estabelecido, além das leis naturais de reprodução e manutenção do corpo material, as normas comportamentais, um conjunto de valores e preceitos a serem seguidos pela psique etérea materializada.

Desde o início do ciclo vital, o deus criador, através de seus auxiliares extrassublimes, observaria o comportamento das psiques etéreas encarnadas, distinguindo aquelas que se comportaram bem, obedecendo ao conjunto de normas e preceitos de sua empresa, das que se comportaram mal, as que infringiram as leis morais que determinam como devem agir diante das diversas circunstâncias, com as quais possam se defrontar durante a existência atrelada ao corpo material. As primeiras permaneceriam sob seus eternos cuidados, desfrutando o ambiente divino do seu deus criador; as segundas, ou expurgariam, por um longo período, suas infrações menores, passando a merecer a coabitação entre as psiques obedientes às regras da empresa divina, ou, nos casos de gravíssima desobediência, sofreriam eternamente as consequências de não haverem se comportado bem.

É como se as psiques fabricadas sob a permissão do criador fossem submetidas a um período de teste de qualidade, através do qual a psique ultrassublime avaliaria a resistência, capacidade e, principalmente, o comportamento diante das normas, tabus, costumes ou mandamentos hierárquicos, que lhes seriam ministrados, de forma religiosa, por psiques-etéreas representantes do criador, igualmente encarnadas, mas reconhecidamente capacitadas para exercer tais funções.

Porém, no processo de fabricação (reprodução) dos corpos materiais que servirão de instrumento para que as psiques realizem seus testes, em alguns casos, ocorreriam acidentais falhas, e os corpos apresentariam defeitos de fabricação: membros atrofiados, órgãos debilitados, ou mesmo a falta de algumas dessas peças, obrigando as psiques nessas condições a utilizarem seus corpos deficientes, ou desistirem da prova ali mesmo, no final da linha de produção. Outras, durante a fase de prova, sofreriam acidentes que interromperiam os ciclos vitais muito antes de esgotar o prazo médio de validade dessas máquinas orgânicas.

Vem daí a ideia religiosa de que a nossa massa corporal é tão-somente o veículo de um suposto ser psíquico que, depois de utilizá-la, existiria "totalmente" desvinculado de qualquer forma de matéria. É como se o psiquismo fosse um ente imaterial cuja dependência do corpo físico tivesse apenas o objetivo de se fazer comunicar com outros seres psíquicos igualmente materializados. Estes seres etéreos usariam os corpos materiais somente durante a fase de teste (a existência encarnada). Receberiam estímulos através de órgãos apropriados para a transmissão dos sentidos básicos (olfato, paladar, visão, audição e tato), além de assimilar e decodificar informações captadas pelos processos de percepção, atenção, associação, memória, raciocínio, juízo, imaginação e pensamento, transformando qualquer impressão em linguagem que expresse sua autoconsciência. Além dos sentidos comuns e do processo cognitivo, a psique etérea, em muitos casos, vivenciaria experiências sensoriais transcendentes, aquilo que vai além das idéias e conhecimentos ordinários.

Religiosos acreditam que essa alma seja alguma coisa que possa, em outra dimensão cósmica, manifestar-se independente, livre, dissociada de qualquer tipo de matéria. Certamente, tal conceito remonta a milênios antes da ciência descobrir a existência de partículas subatômicas, os objetos quânticos. Quem poderia, hoje, garantir que a matéria só existe conforme a composição clássica: átomos que formam moléculas que formam células que formam tecidos que formam órgãos...? (As chamadas matérias orgânicas, que formam corpos animais e vegetais.) Ou aquelas cujas estruturas moleculares lhes conferem o estado de mineral?

A ciência ainda não desvendou totalmente as verdadeiras essências das matérias e das energias existentes no Universo conhecido. Acredita-se, inclusive, que possa existir neste Universo algum tipo de substância formada por elementos distintos de toda composição de matéria e energia que conhecemos. A mais recente descoberta nesse campo é a da misteriosa energia escura, ou energia negra, cuja natureza ainda se constitui num dos maiores desafios para ciência, no que tange, principalmente, aos atuais conhecimentos da física e da cosmologia. O Universo também desperta interesses no campo da filosofia, destacadamente, da metafísica, através da qual se realizam investigações transcendentes às experiências sensíveis, em busca de fundamentos exclusivamente teóricos sobre as relações entre os corpos celestes, a força gravitacional, a expansão deste Universo, a infinitude e eternidade do espaço-tempo, a possibilidade da existência de vida inteligente em outras plagas cósmicas, as manifestações da alma humana e a existência de um deus criador de todas as coisas.

Assim como não podemos conceber o Nada, não há como compreender a manifestação psíquica sem um elemento físico, condutor de energia sutil, capaz de realizar o processamento dos dados disponíveis e expressá-los através de movimentos corporais, linguagem oral e escrita, ou mesmo por ondas ou radiações.

Acreditar que a psique etérea pode se manifestar sem a participação de qualquer tipo de matéria decorre, provavelmente, de preconceito, pelo fato de considerarmos a matéria um elemento inferior, um objeto tangível, identificável pelos sentidos básicos da máquina humana, os canais materiais; enquanto a alma (a psique, o psiquismo), um ente imaterial, seria sublime, intocável, venerável, aquilo que nos assemelha a Deus, a psique ultrassublime.

Ainda não nos desvinculamos das sensações que a matéria densa proporciona à psique etérea, aparentemente a ela "aprisionada". Temos a impressão de que o ser eminentemente psíquico se manifesta usando a matéria apenas enquanto vivencia as experiência na "fase de teste", mas que, ao fim do ciclo vital do corpo físico, se libertaria desta matéria. Este é um estágio do ser ainda bastante rudimentar, imbuído de preconceitos em relação à matéria. Mero preconceito.

Entretanto este ser etéreo está evoluindo e alcançará estágios em que conhecerá as leis naturais que regem sua existência, identificará a matéria em seus múltiplos estados e funções e perceberá como alcançou autoconsciência, como ocorreu a sua evolução. Perderá o preconceito e considerará a matéria apenas um estado natural, igualmente "divino", quando comparada ao ente etéreo, a psique imaterial.

A matéria é a concentração de elementos do Universo conhecido. O ente psíquico nunca se manifestará independente do ente material, mesmo porque não há como nem por que separar um do outro.  A diferença fundamental entre um e outro é que a matéria é eterna, indestrutível e se transforma; enquanto o ente psíquico é igualmente eterno, indestrutível e evolui.  

A transformação da matéria

Antoine-Laurent Lavoisier, reconhecido como o pai ou fundador da química moderna, através de seus trabalhos de pesquisa,pôde enunciar uma lei que ficou conhecida como Lei da Conservação das Massas ou Lei de Lavoisier.

"Numa reação química que ocorre num sistema fechado, a massa total antes da reação é igual à massa total após a reação". Ou "Numa reação química a massa se conserva porque não ocorre criação nem destruição de átomos. Os átomos são conservados, eles apenas se rearranjam. Os agregados atômicos dos reagentes são desfeitos e novos agregados atômicos são formados". Ou ainda, sob conceito filosófico: "Na natureza nada se cria, nada se perde, tudo se transforma."

Daí podemos concluir que nada pode surgir do nada; e nada pode transformar-se em nada.

A partir dessa constatação, entendemos que os elementos que constituem o nosso corpo material são eternos, indestrutíveis, eles apenas reagem entre si e se transformam (durante e após o ciclo vital).

A evolução do ente psíquico, a psique etérea 

O ente psíquico, etéreo, autoconsciente, individual, único, unido ao nosso corpo material, é igualmente eterno, indestrutível, entretanto este, à medida que aprofunda seu autoconhecimento, é capaz de criar mecanismos próprios para controlar seus desejos e impulsos afetivos e emotivos; adquire conhecimentos através de processo em que aplica a percepção, atenção, associação, memória, raciocínio, juízo, imaginação, pensamento e linguagem; desenvolve métodos próprios para o aprendizado de determinados sistemas e soluções de problemas; nele não ocorre a simples transformação de seus elementos, mas, sim, o progresso quantitativo e qualitativo de conhecimentos e o aperfeiçoamento do emprego de suas principais funções (cognição, volição, afeto e motivação), portanto o ente psíquico evolui.

Podemos também afirmar que, em vista do ente psíquico desejar conhecer a verdade e persegui-la, esta evolui consigo.

Tomás de Aquino afirmou que "nenhum ente esgota a verdade", e isso reforça o nosso conceito de evolução da verdade.

Hegel dizia que uma tese sempre terá para si uma antítese, e a união dessas teorias formaria uma nova ideia, abrangendo aspectos da tese e da antítese em síntese. E a síntese se tornaria uma nova tese, e, assim, o ciclo se reinicia com a formação de sua respectiva antítese. O que  vem a ser isso, senão o caráter evolutivo da verdade?

Se a matéria fosse a causa da inteligência, por que, ao final do ciclo vital, essa matéria, que vinha manifestando tal inteligência, volta ao estado primitivo, em que somente as leis que regem seus aspectos físicos e químicos funcionariam? A matéria continua se transformando eternamente, porém aquilo que os ateus consideram como sendo de suas exclusivas responsabilidades, a inteligência e seus produtos, cessariam.

O próprio ateu, consciente de que a ciência ainda não desvendou totalmente as verdadeiras essências das matérias e das energias existentes no Universo conhecido, pode acreditar na sobrevivência da alma, a psique etérea, dando continuidade ao processo evolutivo de um ser autoconsciente de sua existência, sem, com isso, acreditar na existência de um deus criador de todas as coisas, onisciente, onipotente, onipresente e justiceiro. Basta crer, fundamentado em métodos científicos e metafísicos, que essa psique realmente jamais se manifestaria desprovida de qualquer forma de matéria (que é basicamente em que o ateu acredita). Basta saber que certa matéria quintessenciada, conforme já propagava Aristóteles (384 a.C. a 322 a.C.), dizendo tratar-se de determinado elemento etéreo que compõe as esferas celestes, distinto em sua quase imaterialidade das quatro propriedades naturais - terra, água, fogo e ar - que constituem os corpos densos no mundo sublunar, o éter, pois bem, basta saber que esse tipo de matéria envolve o corpo material denso e, dessa maneira, expressa toda a inteligência explicitamente observável, identificável.

Essa psique etérea conhece todo o processo de nascimento, vida e morte (ciclo vital) do corpo material organizado e tem consciência de que, sob qualquer forma que esse corpo venha a perecer, ela sobrevive no corpo de matéria sutil, cuja composição ainda é praticamente desconhecida da ciência. Ateu que não se dá ao trabalho de analisar tal possibilidade, fica com o seu dogma sobre a inexistência de vida inteligente após a morte do corpo físico.

(*)Fernando Soares Campos é escritor, autor de "Fronteiras da Realidade - contos para meditar e rir... ou chorar" - Chiado Editora - Portugal - 2018.   


sexta-feira, 17 de agosto de 2018

Komila Nakova, ex-KGB, revela como a CIA recruta estudantes estrangeiros nas universidades dos EUA

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Komila Nakova, ex-KGB, revela como a CIA recruta estudantes estrangeiros nas universidades dos EUA




por Fernando Soares Campos(*)



Estávamos aqui nas dependências da PressAA, a nossa agência de notícia Assaz Atroz, discutindo a pauta. Já passava da meia-noite e não conseguíamos fechar, não havia consenso para deliberarmos sobre a principal manchete do dia. A maior parte das sugestões indicavam um título bombástico para um caso rasteiro: "Desembargador confessa que cometeu crime para manter Lula preso".

"Isso é bobagem", falei. A meu ver, todos que tiveram influência na condenação e prisão de Lula cometeram algum tipo de crime ou contravenção administrativa. Além do mais, disso aí todo mundo já está tratando. O que eu queria mesmo era falar sobre o motivo pelo qual essa gente age criminosamente. Isso, sim, é o que interessa. Mas acabei aceitando, provisoriamente, a abordagem sobre o vazamento da confissão do desembargador. Encerramos a reunião, e eu fiquei só.

Quando as coisas estão ruças, ligo para a russa Komila Nakova, que os nossos leitores mais antigos sabem que se trata exatamente de uma ex-agente do KGB, atualmente positiva e operante no ramo de investigação particular, expert em casos de infidelidade conjugal, mas que eventualmente, na condição de freelancer, trabalha para nós, ou para alguns freeloaders da mídia venal.

Com essa onda de grampo, eu não quis expor meu problema por telefone, pedi a ela que viesse até aqui, a fim de me dar umas dicas seguras sobre a matéria que pretendíamos publicar.

Devido a uns entreveros domésticos, estou dormindo na redação até a poeira baixar. Komila é quase nossa vizinha, mora logo ali no acesso à Ladeira dos Tabajaras. Estamos sempre nos cruzando na Estação Cardeal Arcoverde.

Era madrugada avançada, quando ela adentrou-se na minha sala, arrastando-se, sorrateira, pelo duto de ventilação, a fim de não ser filmada pelo circuito de segurança do prédio. Não me surpreendi, pois ela sempre foi assim, imprevisível.

Komila, aparentemente exausta, deixou-se cair numa poltrona localizada num canto da sala, respirou fundo e falou:

– Nakova, chefinho, ao seu dispor...

– Komila!

– E come sempre que quiser, querido... Na cova ou onde você desejar... Você sabe que eu te amo!

– Deixe a graceta pra outra hora. O caso é sério!

– Não é “gra”, chefinho, é “bo” – falou e cruzou as pernas mais sensuais que conheço.

– Não acha que essa sua graçola às vezes incomoda?

– Também não é “gra”, meu amor, é “cal”. E, a mim, não está me incomodando de forma alguma...

– Você não tem jeito, não. Vamos ao que interessa.

Convidei Komila para ler, na tela do monitor, a relação dos principais elementos envolvidos na prisão de Lula. Acompanhando cada nome de policial federal, membro do Ministério Público e do Judiciário, destacavam-se alguns dados biográficos do indivíduo.

Ela levantou-se, aproximou-se de mim por detrás, debruçou-se sobre as minhas costas, roçando aquele maravilhoso par de peito no meu lombo. Fiquei excitado, mas não deixei transparecer que ela havia me provocado estímulos libidinosos... quer dizer, um puta tesão.

Komila leu tudo num piscar de olhos, pois, quando era adolescente, fez curso de leitura dinâmica por correspondência em São Petersburgo. Certa ocasião ela me disse que sua tataravó conheceu Dostoiévski, chegando mesmo a inspirar o consagrado escritor russo na criação de uma de suas personagens.

Quando terminou de ler, perguntei:

– Você conhece algum desses elementos? Sabe alguma coisa sobre algum deles?

– Todos! Conheço todos... E sei o bastante sobre cada um deles.

– Todos?! Impossível! Não precisa exagerar. Você sabe que pagamos o preço justo pelas suas colaborações. Não há necessidade de tentar atribuir a si própria um valor acima da importância que tem para nós e que, há muito tempo, reconhecemos como fundamental para a manutenção desta nossa agência.

Komila tem sempre uma resposta para qualquer pergunta ou insinuação.

– Querido, sei que você se lembra que lhe falei do meu curso de leitura dinâmica, mas não lhe contei de outro curso que fiz por correspondência, o de memorização de textos. Se li os dados biográficos desses sujeitos, já sei muito sobre eles, já conheço o suficiente para dizer que se trata de subagentes da CIA, colaboradores da NSA, aprendizes de tiras do FBI, coisas assim...

– Você pode explicar como chegou a essas conclusões?

– Tá tudo aí... Tem informações suficientes... Dizem que alguns cursaram programas de instrução de advogados da Harvard Law School. Outros foram premiados pelo Global Investigations Review. Tem mestre em direito pela Universidade de Harvard e pela Yale Law School. Aparece até visiting teacher in Los Angeles School of Law... E tantas outras qualificações afins. Do que mais precisamos para saber quem são?

– O que você quer dizer com isso?

– O que eu quero dizer?! Não quero dizer nada, isso aí diz por si mesmo.

Eu tinha uma ideia sobre o que ela estava falando, mas queria que a russa fizesse jus ao que receberia pelas informações prestadas, portanto teria que explicar detalhadamente o que tudo aquilo significa no seu métier, no mundo da espionagem.

– Tudo bem que isso aí diga por si mesmo, mas eu quero que você diga por isso aí...

– Me sirva um drinque.

– Não temos vodca.

– Se não tiver champanhe francesa ou Romanée-Conti safra dos anos oitenta, qualquer coisa serve.

– Tem uma cachacinha mineira. É coisa fina.

– Melhor que uísque americano. Manda.

Servi uma dose caprichada da caninha de boutique. Tomou de um só gole, como um cossaco numa cossaca.

– Como eu já lhe disse, essas informações falam por si mesmas – Komila se movimentava pela sala enquanto explicava sua tese –. Grande parte dos estrangeiros que estudaram nessas universidades americanas, ou que foram agraciados com títulos honoríficos ou condecorações, ou convidados na condição de professores visitantes, acabaram sendo vítimas das armadilhas da CIA e se tornaram subagentes dos órgãos de segurança controlados pela NSA, a poderosa National Security Agency.

– Subagentes?!

– Sim, subagentes, colaboradores, agentes de araque... São tratados como agentes, mas, pelas identificações internas, são tidos como subagentes. Trabalham para o governo dos Estados Unidos, inclusive traindo os governos e o povo de seus próprios países. Entendeu?

– Até aí, sim, mas eu gostaria mesmo é de saber como chegam a essa condição, como ou por que se entregam para atuarem como entreguistas, muitas vezes cometendo crimes de lesa-pátria. Você falou de armadilha da CIA. Que tipo de armadilha?

– Pode me servir mais um drinque?

– Sim, é pra já!

Komila ainda estava com o copo vazio na mão. Servi mais uma dose da mineirinha proibida para menores de idade. Novamente ela tomou de um só gole, colocou o copo na minha mesa e continuou se movimentando pela sala.

Parou e estendeu os braços para a frente, indicando o sofá ao lado da porta. Cerrou os punhos e, em seguida, abriu os dedos indicador e polegar, formando ângulos retos, simulando um enquadramento fotográfico.

– Imagine você e eu ali naquele sofá. Ambos despidos. Você sentado, eu agachada, com a cabeça entre as suas pernas, fazendo um movimento cadenciado de sobe e desce. Você em estado de extrema excitação... Imaginou?

– Você fazendo um boquete em mim. Sim, mas, nesse caso, não é questão de imaginar, é apenas de recordar...

– Então, imagine se, antes da gente partir para o bem-bom, eu tivesse instalado uma minicâmera em algum local estratégico dessa sala e filmasse tudo, inclusive quando fiquei de quatro no sofá e você praticou um parece-mas-não-é...

– Komila! – praticamente gritei –, você não fez isso, fez?!

– Calma, querido! Não, não fiz. Mas você é homem e eu sou mulher, portanto, se tivesse feito não seria nada demais, exceto pelo fato de que você não ia querer que seus filhos e sua mulher, ou mãe, irmãos ou mesmo seus amigos assistissem a cenas com essas que descrevi.

– Descreveu o que já fizemos em diversas ocasiões! Jure que você não filmou, não fotografou nem falou disso pra ninguém!

– Take it easy, honey! Você me conhece, sabe que não sou chantagista.

– Sim, eu confio em você, mas o que tudo isso tem a ver com as armadilhas da CIA?

A loira voltou-se pra mim. Tinha um sorriso enigmático, com a bochecha direita repuxada para cima e os lábios pressionados, como se estivesse forçosamente evitando um sorriso aberto.

– Se na cultura machista de vocês uma cena dessas pode abalar a moral de um homem, nem sei o que dizer se fosse você no meu lugar, e, no seu, outro macho...

– Tá me estranhando?!

– Não, estou só supondo.

– Então, continue...

– Agora entenda que é nisso que dá a participação de militares, jornalistas, advogados e tantos outros profissionais estrangeiros nas instituições do império ianque, em suas escolas militares e universidades. Muitos generais e magistrados estrangeiros que, quando jovens, passaram por aquelas escolas, foram induzidos ao envolvimento em atos meramente comportamentais; em geral, homossexualismo, ativo e passivo. Mulheres casadas foram induzidas à infidelidade conjugal ou mesmo prostituição.

– Tudo acontece sempre em relação às atividades sexuais?

– Não. Também são levados a cometer alguns ilícitos, prática de pequenos roubos e furtos. Agora andam estimulando os crimes cibernéticos, invasões a sites do governo, roubo de senha, clonagem de cartões de crédito. Qualquer desvio de conduta daqueles que por lá aportam é registrado, gravado, fotografado, filmado, testemunhado e arquivado pela CIA. Nada escapa, pois eles acreditam que qualquer item daqueles pode, um dia, vir a ser útil. Tudo está arquivado, são muitos milhares de dossiês...

– Acho que chantageiam até aos mortos.

– Claro! Morto tem família. E algumas dessas famílias estão tentando reaver algumas fortunas depositadas em paraísos fiscais offshore, sob o controle de Wall Street.

– Como fazem para controlar todo esse contingente de colaboradores, ou subagentes, como você chama os vendilhões da pátria?

– Todo esse pessoal, ao retornar aos seus países, passam a ser monitorados permanentemente. Todos recebem algum tipo de apoio, benefícios incomuns. Alguns, com os gabaritos das provas antecipadamente fornecidos, são aprovados em concursos, nomeados para cargos de muita importância e facilmente promovidos. Outros trabalham para multinacionais de ramos diversos, principalmente para as petroleiras. No serviço público, os antigos dão cobertura aos mais jovens, os recém-chegados. Esses elementos servem aos interesses do governo dos EUA e, de forma indireta ou mesmo direta, dependendo do caso, são sempre lembrados de suas marcas nas mãos da CIA. São uns fracos. E os que mais arrotam valentia em solo pátrio são os mais comprometidos, vivem se borrando de medo de serem desmascarados.

– Isso quer dizer que os ianques nem mesmo bancam todos eles. Na verdade, somos nós mesmos que pagamos para eles irem estudar lá e depois sustentamos esses canalhas aqui, ganhando os mais altos salários e trabalhando contra o Brasil, em prejuízo de todos nós, brasileiros.


– Pegou o espírito da coisa, chefinho... Então, meu caro, não tenho mais o que lhe esclarecer. Vou tirar o time... pois tenho cliente do outro lado para atender.


– Espere! Só mais uma pergunta...


– Mande...

– Posso considerar que todos esses nomes que você leu, na relação que lhe apresentei, são subagentes da CIA?

– Bem, alguns colaboram contrariados, sob pressão, estão por demais envolvidos, não têm como recuar. São permanentemente chantageados, chegam a receber fotografias, cópias de documentos comprometedores, coisas assim. Isso funciona como os jovens que se envolvem com o tráfico de drogas e não podem fazer mais nada sem autorização do gerente da boca. Outros, os preconceituosos, vira-latas de formação, odientos, racistas... estes se entregam de corpo e alma. Geralmente são separatistas, querem o retalhamento do Brasil, a entrega da Amazônia a um consórcio internacional para a sua governança e a formação de estados independentes, conforme a própria divisão regional do país. Quer dizer, com a entrega da Amazônia, os estados do Norte seriam agrupados em uma espécie de protetorado do tal consórcio. A ideia é que o Nordeste também seja submetido à condição de protetorado e se torne mero fornecedor de mão de obra em condições análogas à escravidão.

– Sem a Amazônia, sem o Nordeste, sem o pré-sal, sem o Brasil!

– Sem dignidade...


– O que você acha que devemos fazer?


– Isso vocês decidem. Agora vou partir... Tchau, querido!

– Espere, ainda temos outra questão pra resolver!

– Hoje não dá, estou naqueles dias...

Como um raio, melhor, como um rato, Komila saiu pela janela aqui do oitavo andar, de onde ainda pude vê-la, lá embaixo, montando no seu unicórnio alado, último modelo, e partindo sob o céu estrelado...




(*)Fernando Soares Campos é escritor, autor de "Fronteiras da Realidade - contos para meditar e rir... ou chorar" - Chiado Editora - Portugal - 2018.


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sábado, 4 de agosto de 2018

Deus não joga dados pra perder

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Deus não joga dados pra perder 

por Fernando Soares Campos(*)


Qualquer ponto na infinitude do espaço cósmico é o Centro do Universo, por estar, em todas as direções, equidistante das “extremidades do infinito”. Também podemos afirmar que tal ponto representa, concomitantemente, o começo e o fim da imensidão do espaço cósmico.

Se dividíssemos a infinitude universal ao meio, tendo criado um plano imaginário, infinito, a ser utilizado como “fronteira” (cisão) do Universo, surgiriam dois universos infinitos, ambos com todos os elementos do Todo. Se, a partir dessa primeira divisão, continuássemos dividindo o Universo-infinito em progressão geométrica, obteríamos infinitas partículas, cada uma delas contendo a principal característica do Universo: a infinitude.

Daí podemos compreender o fenômeno ocorrido num holograma, em que cada parte reproduz o Todo. É como uma gota d´água do mar, que é composta por todos os elementos das águas de todo o oceano.

Se o Universo é concebivelmente infinito, qualquer porção deste Universo é infinita.

Imaginemos uma bola de gude, do tipo que tantos de nós usamos nos jogos lúdicos da infância, solta no espaço, inflando, crescendo, expandindo-se contínua e eternamente. Considerando a infinitude do Universo, ela jamais estancaria seu processo de dilatação. E tudo que existisse no seu interior acompanharia seu crescimento: os espaços entre as partículas elementares que formam a sua massa cresceriam na razão direta do crescimento do seu volume total; consequentemente, as próprias partículas se reproduziriam, ocupando tais espaços, combinando-se, formando átomos, moléculas, células e tecidos necessários à composição de matérias orgânicas e inorgânicas.

Se ocorresse o contrário, a bola de gude comprimindo-se contínua e eternamente, ela jamais se tornaria Nada, seria sempre, por toda a eternidade, um corpo compacto, o qual, visto do nosso ponto de observação imaginária, manteria toda a sua massa original; e os espaços entre suas partículas elementares diminuiriam na razão direta da diminuição do seu volume total.

Também podemos concluir que um corpo em expansão na infinitude universal não ocupa o espaço de outro corpo, assim como um corpo submetido à eterna compressão não cede espaço para que outro corpo o ocupe; pois, se o espaço é infinito, não há criação nem extinção de espaço. Na verdade, considerando que qualquer ponto, parte ou porção do Universo-infinito é, ao mesmo tempo, seu começo e fim, é o seu Centro, assim, não há propriamente partes a se considerar; só, o Todo.

O espaço-tempo é uma unidade quadrimensional ou hexadimensional?

O conceito einsteiniano sobre a bidimensão espaço-tempo trata de uma unidade quadrimensional, pois, ao espaço tridimensional (altura, profundidade e largura), foi acrescentado o tempo. Porém, se consideramos a tridimensionalidade do espaço, teremos que entender o transcorrer do tempo igualmente tridimensional, visto que o espaço e o tempo se expandem ou se contraem inseparavelmente.

Como não podemos conceber o infinito espacial e a eternidade em separados, também não devemos estabelecer a junção do espaço com o tempo considerando o primeiro tridimensional e o segundo unidimensional, visto que todo espaço pressupõe um tempo necessário para percorrê-lo em todos os seus sentidos. Daí, podemos formular conceitos de infinito e eternidade:

Infinito é o espaço que necessita da Eternidade para ser totalmente percorrido.

Eternidade é o tempo necessário para se percorrer o espaço Infinito.

São grandezas inseparáveis, portanto, as dimensões atribuídas a uma devem ser, obrigatoriamente, conferidas à outra.

Espaço: altura, profundidade e largura.

Tempo: passado (espaço percorrido), presente (espaço em que se está percorrendo) e futuro (espaço a ser percorrido).

Portanto...

Se o espaço e o tempo são indissociáveis, o evento espaço-temporal é hexadimensional, formado pela soma das tridimensionalidades de ambos.

Se o Universo é concebivelmente infinito, haveremos de compreender que qualquer porção deste Universo é infinita.

Se qualquer porção do Universo é concebivelmente infinita, conforme exemplo da bola de gude expandindo-se ou comprimindo-se eternamente, assim, haveremos de compreender que qualquer fração do tempo é eterna.

A eternidade pode ser compreendida pela incessante ação do presente absorvendo o futuro e, instantaneamente, transformando-o em passado.

Daí concluímos que Deus joga dados, sim, mas, na condição de ser onisciente, onipresente e onipotente, conhece de antemão o resultado, portanto Deus só não joga pra perder.

(*)Fernando Soares Campos é escritor, autor de "Fronteiras da Realidade - contos para meditar e rir... ou chorar" - Chiado Editora - Portugal - 2018.



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