Fernando
Soares Campos
À
medida que se aproxima o ano do pleito eleitoral para a sucessão presidencial,
aumenta a circulação de correspondências em forma de “corrente”, cujas
mensagens se encerram com advertências do tipo: “Se você ama o Brasil e está indignado com este absurdo, passe isto em
frente ou o bicho-papão vai te pegar”. Não me faltam mensagens religiosas, esotéricas
e comerciais; boletins (newsletters),
listagens e redes. Certamente não posso ler tudo, mas aproveito boa parte do
que me chega. Muitas delas veiculam textos curtos, são sucintas e subliminares
propagandas de cunhos políticos e ideológicos, que geralmente pairam sobre o
verniz de presunçosas inconsciências, coisa de gente metida a cavalo-do-cão,
mas que não passa de mucufa acuada pelos próprios fantasmas da imaginação.
A
mídia empresarial perdeu muito fôlego depois da relativa popularização da
internet, mas ainda detém certo poder de fogo. Vejamos os casos das últimas eleições
na Venezuela e no Brasil. Antes, porém, lembremo-nos de que Fernando Henrique Cardoso,
o entreguista, foi eleito para a Presidência da República nos primeiros turnos
das eleições (1994 e 1998), contra Luiz Inacio Lula da Silva. Temos, antes
disso, o caso do falso caçador de marajás, eleito com o apoio de golpe
midiático. Agora, na Venezuela, apesar da estrondosa militância em favor do
candidato chavista, a diferença de votos foi muito pequena, uma vitória
apertadíssima. No Brasil, Lula e Dilma só conseguiram eleger-se no segundo
turno das eleições. Temos, portanto, indicadores de que o “defunto”
oposicionista de extrema direita ainda respira na UTI da imprensa golpista, que
assumiu o papel de partido político, o PIG.
Os políticos de esquerda e os
mucufas medioclassistas
Com
a queda do Muro de Berlim (1989), a direita neoliberalista cantou loas anunciando
o fim do comunismo, do socialismo. Foi além, falou de um tal Fim da História,
bradaram que já não existiam mais os conjuntos político-ideológicos de esquerda
e direita, tudo teria passado a ser “extremo centro” (usei esta esdrúxula expressão
na época dos acontecimentos e vi recentemente um sociólogo empregá-la). Na
verdade, o que eles queriam dizer era que, a partir dali, passaria a ser tudo
farinha do mesmo saco: “Somos todos iguais: corruptos, estúpidos e alienados”.
Para as elites endinheiradas, os paraísos fiscais protetores de suas fortunas;
para o lumpemproletariado, as pequenas propinas para o feijão com arroz e o
televisor com suas novelas, noticiários e programação geral fazendo as cabeças
dos pobres infelizes, que ficam cada vez mais matrixiados e mal pagos.
Um
dos grandes problemas dos políticos progressistas e esquerdistas no Brasil é
exatamente o mesmo de setores da classe média acovardada. Os mucufas medioclassistas
ainda estão deslumbrados com a imprensa empresarial e o brilho fantástico dos
televisores gigantes com recursos tecnológicos de última geração. Utilizam-se
de toda a parafernália eletrônica disponível no mercado, mas não abandonam a
telenovela, o futebol e as corridas automobilísticas na tela, apropriados para
liberar reprimidas manifestações emotivas. Eu também gosto, mas não me enrosco.
Existem
políticos que se borram diante do poder dos conglomerados midiáticos, são incapazes
de propor ou mesmo votar projetos de lei tidos como impopulares, mesmo que
justos e necessários. Outros elaboram projetos de lei com a clara intenção de
agradar as minorias que estejam no foco dos holofotes das mídias. São
legislações que, em muitos casos, já nascem inoperantes, inviáveis, letras
mortas. Contudo, ótimo que se preocupem com os menos favorecidos, esses que são
tratados “seriamente” nos telejornais e achincalhados nos programas
humorísticos e de auditório. Mas são incapazes de elaborar, enviar para
apreciação, defender e votar projetos que visem verdadeiras reformas do sistema
eleitoral, reformas tributária e judicial. Acontece que isto não gera votos.
O ódio mais profundo que os empresários dos meios
de comunicação oligopolizados têm de Lula e Dilma é o fato de eles governarem
sem pedir as suas bênçãos, sem consultar esses barões da mídia antes de tomar
decisões administrativas, diplomáticas ou legislativas. Sabemos que, em
governos que os antecederam, o presidente da República costumava se ajoelhar diante
dos seus criadores e pedir licença até para ir ao banheiro. “Posso defecar?” ― “Claro
que pode, idiota! É só o que você sabe fazer”.
Cuba, uma ilha cercada de armas midiáticas por todos os lados
Desde 1983, o governo dos Estados Unidos
financia, a peso de ouro, um complexo midiático de rádio e televisão com
programações em espanhol direcionadas ao público cubano; tanto aos dissidentes
e imigrantes concentrados em Miami, ou dispersados por todo o território
estadunidense, quanto, principalmente, aos insulanos. As torres de transmissão
das emissoras estão localizadas a pouco mais de 200 milhas náuticas de Cuba e
alcançam todo o território cubano, com 24 horas diárias de propaganda
antirrevolucionária e enaltecimento das sociedades de consumo. Por que, com todo
esse aparato e o embargo econômico, não conseguem insuflar a população cubana
contra o sistema comunista e o regime ditatorial? Provavelmente porque 90% do
povo cubano estão satisfeitos com a dignidade de um país soberano e conscientes
de seu papel socialista e humanitário. E a ditadura vigente na ilha deve ser um
dos modelos da chamada Ditadura do Proletariado. Em tais condições, não há
capitalismo neoliberalista-selvagem que influencie uma mudança dos rumos
revolucionários.
“Falam
que os cubanos se aventuram mar adentro, enfrentado tubarões e a revolta das
águas, morrendo a metade para que a outra metade se engaje na luta contra a
“tirania” de Fidel e, de lambujem, desfrutem as delícias do capitalismo
“libertador”, coisa que muita gente chega a confundir com Democracia. Porém,
baseado na realidade que conheço do lado de cá, vivendo num país igualmente
capitalista, posso garantir que, se a distância entre o Brasil e os EUA fosse a
mesma entre Cuba e os EUA, cerca de 200 milhas, teríamos que instalar balcões
da Alfândega em todas as praias brasileiras.
Também
se propala aos quatro cantos do mundo o fato de que atletas cubanos teriam se
refugiado em países capitalistas com o propósito de realmente desfrutar as
benesses que lhes seriam de direito; pois, permanecendo em solo cubano, teriam
se esforçado à toa, visto que se tornaram celebridades mundiais dos esportes e
vivem “miseravelmente”, ganhando salários de US$40,00 mensais. Eu respondo: se
os atletas cubanos não tivessem compromisso e consciência revolucionária, não
seria apenas 0,2%, entre as centenas que vieram ao Pan do Brasil, que se
renderia a uma proposta milionária de um agente alemão; eles desertariam em
massa, como a Rede Globo inventou que estava para acontecer; ou seja, fariam
como os atletas brasileiros, que hoje formam a Seleção Canarinho com quase 100%
de jogadores que atuam no exterior. ” [“Pé em cima, pé embaixo e uma pensão fuleira com uma nega chamada Teresa”]
Grande parte da população brasileira já sabe
que os 6.000 médicos cubanos a serem contratados pelo governo Dilma para atuar
nos rincões brasileiros, onde os médicos autóctones não se interessam em
exercer a profissão, não vão “desertar” do regime cubano, pois estão espalhados
por todos os continentes e, ao encerramento dos seus contratos em países ricos,
ou ao término de suas missões humanitárias em países pobres, voltam para Cuba “lançando”
em ritmo da rumba caribenha.
Muito já se falou sobre a vinda dos médicos
cubanos. Alguns empertigados janotas da imprensa nativa dão fricotes,
esperneiam, xingam, argumentam até que os médicos cubanos são na verdade
agentes do comunismo ateu, os quais viriam com a missão de apoiar o MST na
implantação de uma república marxista-leninista-stalinista-maoísta-lulista-bolivariana-dilmista
no antigo Bananão, como era conhecido o Brasil, lá fora, no tempo em que Dondon
jogava no Andaraí.
Mas, dentre todas as mensagens que ultimamente recebi
através daquelas correntes, às quais me referi no começo destas mal traçadas,
uma delas chegou a me impressionar. Refiro-me a um vídeo que veicula trechos de
entrevistas feitas com brasileiros em Cuba, visitando a ilha a convite do governo
cubano, ou cursando medicina. Impressionou, mas não propriamente pelo conteúdo,
e sim por me deixar imaginando a quantas andam as cabeças dos “deficientes
cognitivos”, conforme certo boateiro qualificou as pessoas que acreditaram no
boato que ele próprio disseminou, falando de suposto projeto de lei
estabelecendo uma tal “bolsa-prostituição”, que teria sido aprovado no Congresso,
enviado à presidente Dilma e que seria sancionado sem vetos, pois teria sido de
autoria de uma deputada do PT. [“Boato nefasto da ‘bolsa-prostituição’”].
O vídeo que recebi tem o título de “Estudantes de Medicina” em Cuba - ACORDA BRASIL! Assunto: Médicos Cubanos - Ouça da
boca deles...ESTARRECEDOR !!!!!!!!!”.
Editaram pequenos
trechos de seis entrevistas feitas com brasileiros em Cuba, alguns deles são membros
do MST, outros não. Mas tentam fazer crer que todos são estudantes de medicina
em Cuba. Podem até ser, mas apenas dois deles declaram ser estudantes de medicina na ilha. Uma
jovem faz ligeiro relato sobre o processo de escolha dos candidatos ao curso,
diz que estes são enviados a São Paulo, onde se submetem a curso preparatório, são
avaliados pelo MST e pela Embaixada cubana, e “passando por esse processo, foi
assim que eu vim”, conclui ela. Em cima da fala dessa moça, colocaram uma
legenda em letras garrafais: “O MST AVALIA ESTUDANTES DE MEDICINA?”. Ora! Claro
que não! A avaliação do Movimento e da Embaixada é em cima do curso
preparatório para distinguir aptidões, teste vocacional, que pode ser aplicado
por centenas de empresas, além de identificar as condições gerais do candidato.
Será que pensam (?) que os outros milhares de estudantes que o governo federal está
bancando para estudar nas melhores universidades do chamado Primeiro Mundo não
passam por avaliações?
No final do vídeo, outra jovem brasileira fala,
muito empolgada e feliz da vida, sobre a sua experiência em Cuba. O editor encerra
a exibição destacando de sua fala o seguinte trecho: “Espero voltar para meu país e implantar esta semente revolucionária que
estou aprendendo aqui e que está me nutrindo”. Pra que ela foi dizer isso?! Afasta-te, satanás comunista ateu! A palavra “revolucionária” deve ter causado
urticária no editor do vídeo e em muita gente que o assistiu. Tascaram esta
legenda: “COM QUAL OBJETIVO?”.
Semente revolucionária “que se caracteriza pela
inovação, pela originalidade, pela possibilidade de renovar os padrões
estabelecidos”, “que é adepta de inovações culturais, artísticas...”, basta
consultar o Houaiss. Mas os “deficientes cognitivos” preferem atribuir à
palavra “revolucionário” a conotação de “guerrilheiro”, ou, pior, “terrorista”.
Assista
ao vídeo, "ouça da boca deles", é estimulante ouvir esses jovens.
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Ilustração: AIPC - Atrocious International Piracy of Cartoons
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PressAA
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