Recebemos por e-mail o artigo intitulado “O Iran e os EUA”, que hoje atualiza este blog. Depois de atenta leitura, não resistimos ao impulso que nos levou a escrever esta introdução. Porém alertamos a quem não têm paciência nem tempo a perder: você pode saltar este intróito e partir para a leitura do artigo; o que você não deve é deixar de ler tão importante testemunho.
Recentemente parte da imprensa brasileira instigou a população a se manifestar contra a vinda do presidente do Iran, Mahmoud Ahmadinejad, ao Brasil. O presidente iraniano desistiu da viagem, alegou ter sido obrigado a atender a outros compromissos.
A propósito dos acontecimentos enfocados pela mídia nos últimos tempos, gostaríamos de fazer ligeiro retrospecto da Guerra do Golfo.
Em 1991, a Rede Globo de Televisão exibiu "Tempestade no Deserto", uma produção hollywoodiana rodada nos estúdios da CNN. A Globo anunciou a histórica batalha fazendo bombásticas chamadas. Teve gente que saiu mais cedo do trabalho, comprou Coca-Cola, encomendou pizza e sentou o traseiro no sofá para assistir ao vivo e em cores os war games com tecnologia de ponta, como, por exemplo, a mira cirúrgica, que fazia as ogivas nucleares táticas atingirem o alvo escolhido pelo mais avançado sistema de plotagem da época. Em geral, os pilotos dos caças-bombardeiros F-16 Fighting Falcon miravam nos quartéis e acertavam fábricas de sabão, hospitais, escolas e até creches iraquianas. Dias depois, justificavam o erro informando que os alvos atingidos seriam supostos esconderijos do inimigo.
Hoje, depois do Afeganistão e do Iraque, os EUA apontam seu poder bélico contra o Iran.
A poderosa mídia ocidental se encarrega da propaganda, fazendo crer que os ianques seriam a redenção do Planeta. Difama o inimigo, a quem chama de “terrorista”. Insinua que os iranianos possuem uma fabrica de fundo de quintal capaz de produzir armas de destruição em massa. Tudo com o propósito de justificar mais uma intervenção militar como tantas outras que os EUA levaram a cabo e que vitimaram milhões de pessoas inocentes; mais um possível genocídio em nome da “liberdade”.
Meias verdades e inteiras mentiras ganham espaço nos telejornais e na mídia impressa. A imprensa brasileira retrata Ahmadinejad com uma imagem mais apavorante que a de Jim Jones, o pastor norte-americano que, na Guiana, em 1978, obrigou centenas de seguidores de sua seita a cometer “suicídio”.
Recomendamos que, depois de ler "O Iran e os EUA", assista ao vídeo Guerra no Golfo... ao vivo.
Fernando Soares Campos
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O Iran e os EUA
Vijay Prashad, Counterpunch
(Traduzido pelo coletivo POLÍTICA PARA TODOS)
In memoriam. Leften Stavrianos, 1913-2004.
Vijay Prashad é professor da cátedra George e Martha Kellner de História do Sul da Ásia e
diretor de Estudos Internacionais no Trinity College, Hartford. Seu livro mais recente é
The Darker Nations: A People's History of the Third World, New York: The New Press, 2007.
Recebe e-mails em vijay.prashad@trincoll.edu
Ninguém mais pode dizer, hoje, que a sociedade iraniana é autoritária. A robusta manifestação de rua e no Parlamento e, de fato, também no círculo das eminências pardas, sobretudo dos mulás de turbante, tanto do Conselho de Guardiões quanto do Conselho de Discernimento do Sistema (belo nome!), põem por terra a ideia de que as forças sociais no Iran vivam sob pressão ou censura.
O Estado iraniano não é totalmente capaz, ainda, de absorver todas as forças e potências da sociedade iraniana, mas, sim, está sendo forçado a absorvê-las (nessa semana, Máhmude Ahmadinejad foi forçado a instaurar inquérito judicial para investigar o assassinato de Neha Agha-Soltan).
É preciso enterrar completamente todas as comparações entre o Iran contemporâneo e a Alemanha nazista (há menos de dois meses, um deputado israelense, Silvan Shalom, fez exatamente essa comparação, sempre repetida pelos neoconservadores com cara-de-mau). Também já não assustam ninguém os discursos dogmáticos dos progressistas nos EUA, metade dos quais alinhados com a "Revolução Verde", metade alinhados com Ahmadinejad.
Ontem, ninguém sabia coisa alguma sobre a política iraniana; hoje, são especialistas com opinião formada e inabalável. Apoiar ideias que não se entendem nada tem a ver com solidariedade internacionalista.
O Iran é uma sociedade dividida, com forças sociais que se enfrentam num debate que tem raízes antigas. Gritinhos e 'grafismos' distribuídos nos Facebooks e Twitters pouco contribuem para melhorar a qualidade da discussão. E dado que os dois lados (assumindo que sejam apenas dois) estão praticamente empatados em número de adeptos, absolutamente não se trata de uma minoria indefesa que esteja sendo cruelmente perseguida (única situação ante a qual alguém poderia sentir-se tão rapidamente ultrajado).
Acho que está certo exigir que o Estado não use a força contra quem proteste nas ruas, e que haja diálogo político para construir meios e modos para enfrentar o que parece ser fraude eleitoral, embora não haja evidência de qualquer fraude. Mas nada disso implica que se ponham tantos a fazer as mais inacreditáveis exigências maximalistas (como a extinção da República Islâmica) que não são exigências das ruas de Teeran e exigências que, no curto prazo, nenhuma rua de Teeran pensará em fazer.
Como as coisas chegaram até aqui
As tradições democráticas do Iran têm raízes que vêm do século 19, embora a dinâmica mais recente tenha tido início em 1905. Frustrada pela obscena ostentação da dinastia Qajar e inspirada na Revolução Russa de 1905, uma aliança entre a emergente classe média urbana, o clero e os trabalhadores do petróleo do norte do pais surgiu, em dezembro de 1905, o que se pode descrever como uma unidade fraturada. Teeran levantou-se contra o cruel vizir Ayn al-Dowleh (que "ferrou um criminoso, como cavalo, mandou por-lhe ferraduras, os pregos enfiados na carne nua dos calcanhares do homem") e mandou para a estratosfera os preços do açúcar. Uma segunda greve, em julho de 1906, forçou o xá a demitir o Vizir e a escrever uma constituição. O Xá Mozaffar ad-Din seguiu o exemplo dos aristocratas russos e prometeu uma constituição. Essa concessão só foi feita porque os protestos já haviam chegado ao exército e ao clero. Enquanto as elites formavam seus majlis, seus deputados à assembleia legislativa, o povo formava anjomans, os sovietes da Pérsia.
Essas "assembleias independentes", escreveu o embaixador britânico Sir Cecil Spring-Rice aos seus melhores em Londres, cultivaram "um espírito de resistência à opressão e, mesmo, a qualquer tipo de autoridade. O sentimento de independência em sentido o mais amplo, de nacionalidade, a consciência do direito de resistir à opressão e de dirigir os próprios negócios disseminam-se rapidamente entre o povo". Esse levante foi imediatamente traído pelos ingleses e russos, cuja entente de 1907 permitiu que os russos invadissem o país (como dizia-se em Moscou: "a Pérsia não é país estrangeiro, assim como a galinha não é, de fato, um pássaro"). O povo não cedeu sem luta: a classe trabalhadora e os camponeses mais pobres formaram um feda’iyan [associação de 'devotos'], e tomaram o úmido Gilan (na mesma região e inspirada pela mesma dinâmica, irrompeu aí o movimento "Jangal [floresta], sob a liderança do extraordinário Mirza Kuchak Khan, que criou a República Socialista de Gilan, de vida curta, de 1920-21). As mesmas forças sociais liberadas pelo movimento dos majlis serviram como fundamento para que as mulheres passassem a exigir plenos direitos como força de trabalho e na sociedade (desde 1910, as mulheres iranianas frequentam livremente a universidade; à altura de 1930, já era fato social normal que as mulheres recebessem educação universitária e gozassem de todos os direitos de completa mobilidade social).
Das franjas da invasão russa e da carcaça dos anjomans, emergiu o líder cossaco persa Reza Khan, que abriu caminho até o Trono do Pavão, onde ele e seu filho permaneceram sentados até 1979. Reza Khan viveu como que escravizado às tecnologias dos poderes imperiais, que importava em grandes quantidades e com alto custo para o Tesouro (seguindo o exemplo do Ataturk turco). Seu filho seguiria esses gastos e essa fé, dependendo cada vez mais de armamento importado como meio para modernizar o Iran, mas mantendo a população em geral em condições da mais abjeta miséria (em 1978, 60% dos iranianos eram analfabetos). Biografia em geral muito simpática ao biografado, o primeiro Xá da dinastia Pahlavi, nem assim conseguiu omitir certa dose de realidade: "a riqueza do país concentra-se em Tehran, quase completamente nas mãos de comerciantes, fornecedores do Estado, mercadores e indivíduos associados aos monopólios. A industrialização em nada beneficiou os trabalhadores da indústria. Salários baixos e uma rudimentar legislação trabalhista de 1932, praticamente nada fizeram para proteger os trabalhadores contra a exploração."
Em 1941, Reza Khan cedeu o trono ao seu filho. O novo Xá herdou país, trono e tumulto social. Durante a II Guerra Mundial, o Iran tornou-se fornecedor imprescindível de petróleo para os exércitos Aliados; depois da guerra, para os Estados atlânticos. Uma empresa Anglo-Iraniana de Petróleo (Anglo-Iranian Oil Company, AIOC, muito mais inglesa que iraniana, apesar do nome) ficava com a (muito)maior parte dos lucros, fez aumentar a perfuração e a extração do petróleo e pressionou, talvez bem mais do que deveria, uma força de trabalho que tinha longa tradição de organização e militância. Nessa AIOC, o partido Tudeh (partido comunista) construiria sua base; foi também contra esses trabalhadores que as forças Aliadas testaram suas armas (o comandante norte-americano que foi enviado então para modernizar o exército iraniano é o pai do Norman Schwarzkopf que, em 1991, comandou as forças da coalizão internacional na chamada "Tempestade do Deserto", na Guerra do Golfo, para depor Saddam Hussein. Os soldados, reunidos pelo embaixador George Allen dos EUA, foram usados pelos Aliados contra a República Popular do Azerbaijão e do Kurdistão).
Por baixo do Trono do Pavão, reuniam-se várias forças sociais para exigir a renegociação dos contratos de petróleo. Mobilizado pelo descontentamento popular contra o regime, a Frente Nacional de Mohammad Mosaddeq lutou pela nacionalização da indústria do petróleo e por uma política agrária que obrigasse os latifundiários a distribuir 1/5 de seus lucros (metade dos quais para os camponeses e metade a ser depositada em bancos rurais que foram então criados). Mosaddeq derrotou "o velho bloco de granito", a elite que crescera habituada ao usufruto exclusivo de todos seus tesouros. Mossaddeq tentou controlar o exército, pilar do poder dos Pahlavi. Por causa desse ultraje, os Estados atlânticos armaram e executaram um golpe que, afinal, saiu barato (custou um milhão de dólares).
A derrubada de Mossaddeq deprimiu o ânimo democrático da população. O Xá implantou uma estrutura autoritária que faria seu pai corar de inveja. Em 1957, criou a SAVAK, sigla que até hoje é sinônimo de terror. Os serviços secretos dos EUA e Israel, depois, apenas a mantiveram sempre atualizada, e a SAVAK nada ficou a dever ao cruel Ayn al-Dowleh. Os lucros do petróleo e a graciosa "ajuda" dos países atlânticos induziram o Xá e deram-lhe meios para que subornasse outros setores da população, ou para que, pelo menos, tentasse. Os petrodólares apenas adiaram o inevitável que viria, como veio.
Os partidos criados pelo Xá, como fachada de atividade política (partidos Melliyun e Mardom) não podiam conter, como não contiveram, os desejos da população. Um movimento frouxo, praticamente sem pegada, chamado "Revolução Branca", em 1963, conseguiu mobilizar o clero, tradicionalmente omisso e conformista, para o campo da revolução.
O Aiatolá Khomeini assumiu a liderança do campo contrário às reformas, nem tanto porque jamais concordaria com aquelas reformas (direito de voto para as mulheres, por exemplo), mas porque dizia que um regime ilegal não se poderia reformar ele mesmo. O Xá fez aprovar a Lei de Proteção à Família, em 1967, em parte pressionado pelos liberais, mas também para pintar os mulás como reacionários favoráveis à poligamia e contrários ao divórcio (o argumento do Xá era falso; as mulheres tiveram direito de votar desde a primeira eleição da República Islâmica em abril de 1979). O historiador Nikki Keddie tem razão ao afirmar que "para as mulheres das classes mais baixas pouca coisa mudou. Sempre tiveram os piores salários e raramente souberam que tinham os direitos que tinham.” Mesmo assim, o solo produzido pelas reformas do Xá (e por mais ilegal que fosse o regime) fez germinar um resultado contraditório: as mulheres descobriram que tinham direitos, gostaram da ideia e a ideia dos direitos das mulheres firmou-se.
As dificuldades econômicas dos anos 1970s foram aumentadas pelas táticas deflacionárias do primeiro-ministro Jamshid Amuzegar; e dia 25/11/1977 abriu-se novo período na vida do Iran: naquele dia, 5.000 estudantes entraram em luta contra a polícia; e os protestos cresceram todos os dias, até setembro de 1978, quando o Xá convidou os militares a participar do governo. Aos protestos esporádicos, juntaram-se as greves dos trabalhadores nos campos de petróleo – movimento significativo, que dividiu a repressão, até então ocupada exclusivamente com a agitação de rua.
Não se pode esquecer que os manifestantes civis, que se levantaram contra o Xá, conheceram toda a violência de que era capaz a maquinaria de morte da SAVAK: na revolução iraniana de 1979 morreram 20 mil pessoas.
A Revolução Iraniana, outra vez, mobilizou todas as classes, inclusive o setor crucial dos trabalhadores do petróleo e das fábricas. Há poucos traços islâmicos naquelas lutas, porque foram lutas nascidas de aspirações nacionalistas e alimentadas pelo ódio que o Xá inspirava à população. Quando a vitória chegou ao alcance da mão, Khomeini e seus quadros assumiram o controle da dinâmica política. Assim se fez a República Islâmica. Como a esquerda reclamou, "a ditadura da coroa foi substituída pela ditadura do turbante".
A esquerda foi suprimida (Ahmadinejad participava do grupo "Ação para Fortalecer a Unidade", depois do partido Mojahedin-e Khalq, partido islâmico socialista e popular; mais tarde, depois de um breve intervalo, do partido Tudeh, o principal partido comunista). “Nosso inimigo não é só o Xá Mohammed Reza Pahlavi,” Khomeini dizia. “Nosso inimigo são todos os que preguem diretivas que nos separem do Islam. São nossos inimigos todos os que usem as palavras 'democracia' e 'república'".
Pois foram precisamente essas tradições de democracia e republicanismo que re-emergiram no Iran depois de 1979, evidentemente nos grupos dissidentes, sim, mas também no seio da elite dos clérigos. Surgiram divisões entre "reformadores" e "conservadores" que sempre acompanharam a história das eleições no Iran; nos anos mais recentes, esses termos ganharam também algumas conotações de classe. Os "mulás milionários", como classificou-os há alguns anos Paul Klebnikov, governaram o Iran mais ou menos como os oligarcas russos governaram a Rússia depois de 1991.
Ali Rafsanjani, ex-presidente e hoje chefe do Conselho de Discernimento do Sistema, tem sido apresentado como reformador. Sua família é das mais ricas do Iran: um de seus irmãos é proprietário da maior mina de cobre do país; outro, dirige a rede estatal de televisão; um primo domina o comércio nacional de pistache; e seus filhos controlam partes cruciais da indústria do petróleo e da construção civil. Rafsanjani fala pelos que habitam o distrito de Elahiyeh, ao norte de Teeran (Shemiran) e dirigem seus carrões pela Avenida Fereshteh. Para esses, liberdade significa o fim dos rituais sociais dos conservadores, mas também a privatização da economia.
Mas também há entre os reformadores um grupo de ativistas que combatem a República Islâmica e exigem igualdade para as mulheres, direitos humanos, direitos trabalhistas, direito à livre manifestação de opiniões – em outras palavras, que fazem os discursos da esquerda europeia. É uma estranha aliança, entre os que querem liberdade para seus anseios hedonistas e os que querem liberdade para livrarem-se da autocracia dos mulás. Entre esses últimos, há líderes importantes, feministas como Mehrangiz Kar e Shirin Ebadi, jornalistas como Akbar Ganji, e militantes da organização dos trabalhadores, como Mansour Osanlou, líder do Sindicato dos Trabalhadores de Teeran e Subúrbios, e Mahoud Salehi, líder da Associação dos Trabalhadores da Indústria do Pão. São aliados dos "reformadores" nas lutas pelos direitos sociais, mas nem tanto, na agenda econômica.
A campanha eleitoral de Ahmadinejad em 2005, deu voz a grupos sociais que jamais antes haviam sido ouvidos, aos habitantes das favelas e aos trabalhadores rurais. Falou por eles, defendeu-os e sabe bem o que fez e faz.
Num evento público em outubro de 2006, Ahmadinejad introduziu a ideia da "Quota Social": o Estado distribuiria quotas de algumas empresas entre os 4,6 milhões de iranianos mais pobres, que automaticamente seriam convertidos em sócios-acionistas da riqueza da nação. A crescente desigualdade social, a consciência de que os trabalhadores haviam sido os mais sacrificados durante a guerra Iran-Iraque nos anos 80 e a falta de alternativas seculares devem ter tido papel importante nesse processo, e na adesão dos mais pobres a candidatos como Ahmadinejad, que mostra simpatia pessoal pelos mais pobres, tanto quanto mostra, sem meias palavras seu desprezo pelos nouveau riches. Esse tipo de populismo parece atrair a juventude das áreas rurais mais pobres e os habitantes das favelas nas grandes cidades (44% da população iraniana urbana vive em favelas).
As políticas de Ahmadinejad são idiossincráticas, são facilitadas pela abundância de dinheiro gerado pelo petróleo (ano passado, os preços foram altos), mas, ao mesmo tempo, são minadas pelo recurso fácil ao anti-americanismo. A Washington de Bush facilitou o trabalho de divulgar os dogmas que a República Islâmica sempre têm estocados, aos quais Ahmadinejad recorre quando lhe faltam argumentos econômicos.
As políticas de Ahmadinejad são idiossincráticas, são facilitadas pela abundância de dinheiro gerado pelo petróleo (ano passado, os preços foram altos), mas, ao mesmo tempo, são minadas pelo recurso fácil ao anti-americanismo. A Washington de Bush facilitou o trabalho de divulgar os dogmas que a República Islâmica sempre têm estocados, aos quais Ahmadinejad recorre quando lhe faltam argumentos econômicos.
Com o preço do petróleo em baixa, e depois de Bush ter sido derrotado por Obama, com inflação em alta, a fé que as massas tinham em Ahmadinejad fraquejou (embora, sim, as massas ainda o apóiem). Mas as circunstâncias de momento deram impulso ao discurso dos "reformadores", que continuam inteiramente dedicados a impedir que Ahmadinejad volte à presidência. Nada garante nem sugere que tenha havido alguma fraude eleitoral, mas a fraude pouco alterará no movimento que houve dentro da própria sociedade iraniana.
A esquerda iraniana atravessa esse fosso que separa "reformadores" e "conservadores"; de fato, há nichos de esquerda dos dois lados do fosso. Por isso, também, é difícil adotar o discurso das elites de Elahiyeh, tanto quanto também é difícil aliar-se ao campo de Ahmadinejad.
Assim sendo... O que fazer?
Quando a revolução iraniana de 1978-79 começou a esquentar, o General Robert Huyser foi em missão a Teeran, como representante do governo dos EUA. Em telegrama de janeiro de 1979, uma semana depois de o Xá ter fugido para o Cairo, Huyser escreveu: "temos de cuidar de imediata e direta ocupação militar". Preveniu que, se Khomeini voltasse ao Iran, "vamos todos para o inferno, num cestinho." O governo Carter preparou-se para o golpe (mandou um navio-tanque de combustível, para abastecer os militares). Mas as coisas não saíram como planejadas. Os EUA não são ator confiável na política doméstica iraniana, nem no passado nem no futuro (embora, como Esam al-Amin destacou, Washington ainda não tenha desistido de tentar).
As contradições sociais do Iran estão outra vez em erupção e conflito. Não nos ajuda agora, agarrarmo-nos à bandeira da intervenção, ou jogarmos nossa solidariedade e nosso apoio sobre um ou outro campo, na atual situação.
A ação de massa no Iran já é instituição muito bem desenvolvida. Em 1953, os EUA ainda conseguiram promover um golpe no Iran. Em 1979, a ação de massa impediu o segundo golpe.
A ação de massa é como um instinto da população iraniana. A melhor solidariedade que a esquerda possa dar, doravante, terá de ser analítica, não emocional. Quanto mais sóbrias forem as análises, mais conseguiremos ver os movimentos fluidos da política, e mais entenderemos os motivos pelos quais é tão difícil encontrar a posição da esquerda.
As coisas são mais fáceis no caso de Honduras, não apenas porque todos os generais hondurenhos são treinados pelos EUA, no Forte Benning, mas, também, porque é bem evidente que o Departamento de Estado talvez decida bancar o golpe, para enviar um recado ao 'bolivarianismo' da América do Sul e Central. Aqui, o papel da esquerda é mais claro: exigir que se ponha fim a qualquer interferência na América Central e o fechamento da School of the Americas. Aqui, a tarefa da esquerda é mais simples, porque, afinal, se trata de defender o governo mais progressista que Honduras conheceu em décadas. No caso de Honduras, trata-se de genuína solidariedade, tanto quanto nossos músculos possam ajudar o lado certo da história. Camaradas, mãos à obra por Honduras.
O artigo original, em inglês, pode ser lido em:
http://www.counterpunch.org/prashad07012009.html
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PressAA
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