Significado da prisão de Dirceu e Genoino
25.11.2013
Por Luis Nassif, no Jornal GGN:
A democracia se consolida nos grandes processos bem conduzidos de inclusão social e política.
Em determinados momentos da história, emergem novas forças políticas, inicialmente em estado bruto, ganhando espaço com a radicalização do discurso contra o status quo.
Em todos os tempos, as democracias passam por processos de estratificação nos quais os grupos que chegaram antes ao poder levantam um conjunto amplo de obstáculos - políticos, econômicos e legais - para impedir a ascensão dos que chegam depois.
Trava-se, então, uma luta feroz, na qual os grupos emergentes radicalizam o discurso, enfrentam as leis, as restrições e vão abrindo espaço na porrada.
É a entrada definitiva no jogo político que disciplina esas forças, enriquece a política e reduz os espaços de turbulência. Todos ganham. Rompe-se a inércia dos partidos tradicionais, amaina-se o radicalismo dos emergentes; abre-se mais espaço para a inclusão; permite-se uma rotatividade de poder que derruba a estratificação anterior.
Sem essas lideranças, as disputas políticas iniciais enveredam para o conflito permanente, deixando o legado de nações conflagradas, como na Colômbia e no México.
Daí a importância essencial dos líderes que unificam a ação, impedem a explosão das manadas e montam estratégias factíveis de tomada do poder dentro das regras do jogo.
Acabam enfrentando duas espécies de incompreensão. Dos adversários políticos, a desconfiança sobre suas reais intenções, manobrando o receio que toda sociedade tem em relação ao novo. Dos aliados, a crítica contra o que chamam de "acomodamento", a troca do sonho por ações pragmáticas.
Em seu estudo sobre Mirabeau, Ortega y Gasset define bem o perfil do estadista e de outros personagens clássicos da política: o pusilânime e o intelectual. O estadista só tem compromisso com a mudança do Estado. É capaz de alianças com o diabo, desde que permita a suprema ambição de mudar um país, um povo. Já o intelectual se vale todos os argumentos do escrúpulo como álibi para a não ação.
Aliás, nada mais cômodo que o niilismo de um Chico de Oliveira, do bom mocismo de Eduardo Suplicy, dos homens que pairam acima dos conflitos, como Cristovam Buarque, dos apenas moralistas, como Pedro Simon. Para não se exporem, não propõem nada, não se comprometem com nada, a não ser com propostas genéricas de aprovação unânime que demonstrem seus bons sentimentos, sua boa índole, sua integridade intelectual - e que quase nunca resultam em mudanças essenciais.
As mudanças no PT
É por esse prisma que deve ser analisada a atuação não apenas de Lula, mas de José Dirceu e José Genoíno.
Ambos passaram pela luta armada. Com a redemocratização, ingressaram na luta política e das ideias. E ambos foram essenciais para a formação do novo partido e para a consolidação do mito Lula.
Na formação do PT, cada qual desempenhou função distinta.
José Genoíno sempre foi o intelectual refinado. Durante um bom período dos anos 90 tornou-se um dos mais influentes formadores de opinião do Congresso e do país, com suas análises sobre regimento da Câmara, sobre reforma política, sobre defesa.
Já José Dirceu era o "operador", trabalhando pragmaticamente para unificar o PT em torno de um projeto de tomada do poder e, a partir daí, de reformas.
A estratégia política do PT passava por sua institucionalização, por um movimento em direção à centro-esquerda, ocupando o espaço da socialdemocracia aberto pelo PSDB - devido à guinada neoliberal conduzida por Fernando Henrique Cardoso e à ausência de lideranças sindicais.
Não foi um desafio fácil. O PT logrou juntar em torno de si uma multiplicidade de movimentos sociais, a parte mais legítima do partido mas, ao mesmo tempo, a parte menos talhada para a tomada de poder. Foram movimentos que surgiram à margem do jogo político, desenvolvendo-se nos desvãos da sociedade civil e sem nenhuma vontade de se sujar com a política tradicional.
Por outro lado, o papel unificador de Lula o impedia de entrar em divididas. Tinha que ser permanentemente o mediador.
O papel do operador Dirceu
Sobrava para Dirceu o papel pesado de mergulhar no barro. De um lado, com o enquadramento das diversas tendências - o que fez com mão de ferro -, dando ao PT uma homogeneidade que tirava o brilho inicial do partido, mas conferia eficiência no jogo político tradicional trazendo-o para o centro.
E o jogo político exigia muito mais do que enquadrar os grupos sociais do PT.
As barreiras eram enormes. Passava por montar formas de financiamento eleitoral, pela aproximação com o status quo econômico, pelos pactos com os grupos que atuam na superestrutura do poder, com os operadores dos grandes interesses de Estado, pelo mercado, pelo estamento militar, pela mídia.
Dirceu foi essencial para essa transição, tanto para dentro como para fora.
Um retrato honesto dele, mostrará a liderança inconteste sobre largas faixas do PT, o único a se ombrear com Lula em influência interna e com uma visão do todo que o coloca a léguas de distância de outros pensadores do partido.
Mas também era dono de um voluntarismo até imprudente.
Lembro-me de uma conversa com ele em 1994 em Brasília, com Lula liderando as pesquisas. Falava do projeto popular do PT e do projeto de Nação das Forças Armadas, sugerindo um pacto não muito democrático.
Não por outro motivo, em diversas oportunidades Lula confessou que, se tivesse sido eleito em 1994, teria quebrado a cara.
Com o tempo, o voluntarismo foi sendo institucionalizado. Internamente, no governo, Dirceu exercia uma pressão similar à de Sérgio Motta sobre FHC. Queria avançar mais, queria menos cautela na política econômica, queria um projeto de industrialização.
Sua grande obra de arte política, nos subterrâneos do poder, no entanto, foi ter mapeado os elos da superestrutura que garantia FHC e inserido o PT no jogo.
Esse mapeamento resultou na viagem aos Estados Unidos, desarmando as desconfianças do Departamento de Estado, dos empresários e da mídia; a ocupação de cargos-chave no Estado, que facilitaram negociações políticas com grupos de influência. Nada que não fosse empregado pelos partidos que já haviam chegado ao poder e que precisaram garantir a governabilidade em um presidencialismo torto como o nosso.
O veneno do excesso de poder
Assim como Sérgio Motta, no entanto, as demonstrações de excesso de poder tornaram-no alvo preferencial da mídia.
Trata-se de uma regra midiática clássica, que não foi seguida por ambos. Quando a mídia sente alguém com superpoderes, torna-se um desafio derrubá-lo. Com exceção de ACM e José Serra - a quem os grupos de mídia deviam favores essenciais e, em alguns casos, a própria sobrevivência -, todos os políticos que exibiram musculatura excessiva - de Fernando Collor ao próprio FHC (no período de deslumbramento), de Sérgio Motta a José Dirceu - terminaram fuzilados.
No auge do poder de Dirceu, creio que foi o Elio Gaspari quem o alertou para o excesso de exibição de influência. Foi em vão.
O reinado terminou em um episódio banal, a história dos R$ 3 mil de propina a um funcionário dos Correios. Tratava-se de uma armação de Carlinhos Cachoeira com a revista Veja, visando desalojar o grupo de Roberto Jefferson para reabilitar os aliados de Cachoeira (http://bit.ly/19sMvtX).
[PressAA: Nunca se chegou a uma conclusão objetiva sobre a verdadeira intenção do grupo criminoso que armou o Escândalo dos Correios. Toda as análises apontam para isso, a de que "visavam desalojar o grupo de Roberto Jefferson para reabilitar os aliados de Cachoeira", porém os analistas se baseiam nos depoimentos da própria bandidagem. Entretanto, a lógica dos fatos não corrobora essa opinião. Leia texto no final desta postagem.]
O que era claramente uma operação criminosa midiática, de repente transformou-se em um caso político, por mero problema de comunicação. Roberto Jefferson julgou que a denúncia tinha partido do "superpoderoso" Dirceu, para amainar sua fome por cargos. E deu início ao episódio conhecido por "mensalão".
E aí Dirceu - e o próprio Genoíno - sentiram o que significa ter chegado tardiamente ao jogo político, não dispor de "berço" e de blindagem contra as armadilhas institucionais do Judiciário e da mídia.
A cara feia da elite
É uma armadilha fatal. Para chegar ao poder, tem que se chegar de acordo com as regras definidas por quem já é poder. Mas, sem ter sido poder, não se tem a mesma blindagem dos poderosos "de berço".
O episódio do "mensalão" acabou explodindo, revelando - em toda sua extensão - a hipocrisia política e jurídica brasileira, o uso seletivo das denúncias, o falso moralismo do STF (Supremo Tribunal Federal).
Nos anos 40, Nelson Rockefeller tinha um diagnóstico preciso sobre o subdesenvolvimento brasileiro: havia a necessidade de um choque de modernidade, de criação de uma classe média urbana que superasse o atraso ancestral das elites brasileiras, dominada pelo pensamento de velhos coronéis.
Uma coisa é a leitura fria dos livros de história, as análises de terceiros sobre a República Velha, sobre o jogo político dos anos 30, 40, 50. Outra, é a exposição dos vícios brasileiros em plena era da informação.
Para a historiografia brasileira, o "mensalão" é um episódio definitivo, para entender a natureza de certa elite brasileira, a maneira como o conservadorismo vai se impondo, amalgamando candidatos a reformadores de poucas décadas atrás, transformando-os em cópias do senador McCarthy. E não apenas no discurso antissocial e na exploração primária ao anticomunismo mais tosco, mas na insensibilidade geral, de chutar adversários caídos, de executar adversários moribundos no campo de batalha, de abrir mão de qualquer gesto de grandeza.
Expõe, também, de maneira definitiva as misérias do STF.
Aliás, Lula e o PT foram punidos pela absoluta desconsideração pelo maior órgão jurídico brasileiro. Só o desprezo pelo STF pode explicar a nomeação de magistrados do nível de Ayres Britto, Luiz Fux, Joaquim Barbosa e Dias Tofolli, somando-se aos inacreditáveis Gilmar Mendes e Marco Aurélio de Mello, à fragilidade de Rosa Weber e Carmen Lucia e ao oportunismo de Celso de Mello.
O resultado final do julgamento foi o acirramento da radicalização, o primado da vingança sobre a justiça, a exposição do deslumbramento oportunista de Ministros sem respeito pelo cargo.
No plano político, sedimentam no PT a mística de Genoino e Dirceu.
Se deixam ou não o jogo político, não se sabe. Mas, com sua prisão, fecha-se um ciclo que levou um partido de base ao poder, institucionalizou um novo jogo político e, sem o radicalismo dos sonhadores sem compromissos, permitiu mudar a face social do país.
Não logrou criar um projeto de Nação, como pensava Dirceu. Mas deixou sua contribuição para a luta civilizatória nacional.
A democracia brasileira deve muito a ambos.
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PressAA: Nassif repete nesse seu texto o que toda a mídia empresarial divulga desde o primeiro momento em que foi deflagrado o Escândalo dos Correios, há 8 anos: “Tratava-se de uma armação de Carlinhos Cachoeira com a revista Veja, visando desalojar o grupo de Roberto Jefferson para reabilitar os aliados de Cachoeira”
Porém essa conclusão não se sustenta se atentarmos para os seguintes fatos:
1) Muito antes da deflagração do Escândalo dos Correios, Roberto Jefferson já espalhava o boato de que o Governo Lula estaria comprando o apoio de parlamentares para que estes votassem a favor de matérias de seu interesse na Câmara. (Conferir depoimento de Jefferson no dia 14/6/2005, no Conselho de Ética da Câmara dos Deputados ). Jefferson falou que havia “informado” tal conduta corruptora aos ministros Miro Teixeira, Walfrido Mares Guia, Aldo Rabelo, Antônio Palocci, José Dirceu e Ciro Gomes. Muitos deles não negam que ouviam Jefferson fazer essas acusações, mas o aconselhavam a denunciar o tal esquema na Tribuna da Câmara, o que ele se negava a fazer, pois, na verdade, estava apenas plantando boatos para, quando realizassem o teatro dos Correios, mostrar-se indignado com o Dirceu e, aí sim, deflagrar a mentira maior, a que realmente interessava aos seus superiores.
2) Desde quando um sujeito como Jefferson estaria preocupado com alguém que estivesse corrompendo a ele próprio? Pois foi isso que ele “assumiu” quando denunciou publicamente o que chamou de “mensalão”, falou até mesmo quanto havia recebido, mas nunca provou o recebimento de sua cota. Os analistas em geral aceitaram, imediatamente, a declaração de Jefferson de que o Escândalo dos Correios teria sido montado por Dirceu, usando elementos da Abin. Desfeita essa hipótese, com os depoimentos e confissões que revelam a verdadeira autoria do escândalo, comprovando-se que foi montado pelo grupo mafiosos Cachoeira/Policarpo da Veja, e que Dirceu não tinha nada a ver com a armação, continuam, porém, até o momento, afirmando que Jefferson não sabia do esquema, que fora traído: por “mero problema de comunicação. Roberto Jefferson julgou que a denúncia tinha partido do "superpoderoso" Dirceu, para amainar sua fome por cargos. E deu início ao episódio conhecido por "mensalão".”
3) Por que Jefferson espalhava o boato de que o Governo Lula estaria comprando a consciência de parlamentares de sua própria base aliada? Por que ele foi dizer isso para o próprio Dirceu? Baseado nos detalhes de sua denúncia pública posterior ao Escândalo dos Correios, quando ele descreve os valores distribuídos, inclusive as somas das cotas de seu partido, dá a impressão que ele falou para o Dirceu: “Vocês estão nos comprando. Eu estou recebendo e pagando a cota de cada parlamentar do meu partido. Mas isso não está certo! Eu amo meu país! Eu não aceito esquemas de corrupção! Sou um homem honesto!”. Não?! Então ele teria dito: “Vocês estão comprando os votos da oposição, pois esta oposição está votando a favor de algumas matérias de interesse do governo!”. Sim, aí a acusação de Jefferson teria alguma lógica, podia não ser verdade, mas teria lógica, visto que a oposição votava em muitas matérias que favoreciam os interesses do governo. Faziam isso quando não queriam ficar feio na fita diante da população, mas até protestavam, diziam estar dando um voto de confiança ao governo.
4) Por que precisariam de um escândalo para afastar Jefferson e montar um esquema maior, mais sofisticado, mais eficiente, de corrupção nos Correios? Ora, considerando-se o que insinuam sobre Jefferson, este seria um pé-de-chinelo no ramo, nesse caso, nada impediria a montagem de um esquema mais amplo. Na verdade, esse esquema maior já existia desde áureos tempos para corruptos, e o esqueminha atribuído a Jefferson não representava qualquer obstáculo. A verdadeira pedra no caminho era o Governo Lula, com ministros como Dirceu e a Polícia Federal reestruturada. O governo NÃO TINHA nem tem TOTAL controle sobre as negociações entre seus funcionários e fornecedores. Transgressões às leis podem ser identificadas pela vigilância de órgãos competentes, os quais, por sua vez, são operados por seres humanos, muitos deles potencialmente inclinados a corromperem-se. No Brasil ou na China, no Paraguai ou na Suécia, nenhum governo está perfeitamente protegido contra atos de corrupção.
5) O argumento de que pretendiam afastar Jefferson para implantar um esquema maior só encontra traço de lógica se admitirmos que, com a queda de Jefferson e o escândalo a partir das denúncias dele (o caso “mensalão”), ambos os escândalos culminassem com a derrocada do governo petista; fosse por imediato impeachment de Lula, ou pelo desgaste de seu governo até as eleições do ano seguinte. Sim, existe a possibilidade de que a máfia previra essas possibilidades. Mas Jefferson tinha consciência de tudo isso, e aquilo que os fatos revelam é que ele participou ativamente dos planos.
6) Jefferson chegou a negar que conhecia Mauricio Marinho, mas uma proprietária de restaurante em Goiás afirmou que eles almoçaram juntos em seu restaurante dias antes de deflagrado o Escândalo dos Correios.
7) Para entender um pouco melhor, leia o trecho final do artigo “O Dimasduto e os telejornais”, publicado no diário espanhol La Insignia, em 3/2/2006:
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3 de fevereiro de 2006 |
Brasil
Fernando Soares Campos
La Insignia. Brasil, fevereiro de 2006.
La Insignia. Brasil, fevereiro de 2006.
(...)
Quanto ao Roberto Jefferson (PTB-RJ - presidente do partido), o governo Lula permitiu que este indicasse alguns afilhados para diretorias dos Correios, onde Jefferson plantou Maurício Marinho, um dos seus capachos.
Bom, lá estava Lula tocando seu governo, arrumando as finanças do País, criando seus programas de assistência social, viajando mundo afora, em busca de novas parcerias comerciais para o Brasil, tudo na quase santa paz. Mas não sabia ele que a turma de FHC estava aprontando.
Jefferson, sujeito ganancioso, não andava nada satisfeito, pois o pessoal do PT não estava mais permitindo recebimento de propina, marcava no pé, mesmo não podendo escapar de certas falcatruas, pois são 500 anos de corrupção, e os camaradas têm norrau (pronuncia-se know-how). Tanto é que a Skymaster, empresa aérea que freta suas aeronaves para os Correios, e financiou uma parcela da campanha do senador Arthur Virgílio (PSDB-AM - líder do partido), ganhou nova concorrência neste governo. Mas que estava difícil tirar dinheiro à base de propina, isso é verdade. E aí não tem Jefferson que agüente ter seus afilhados em cargos de "confiança" e não poder mamar nas tetas que o cargo representa. O homem ficou puto da vida. Mas teve uma brilhante idéia: saiu dizendo pra todo mundo que o PT estava comprando votos de seus aliados, a fim de que estes permanecessem fiéis ao governo e votassem em seus projetos. Até para o presidente Lula ele contou essa. Quando o chamavam para denunciar isso no plenário da Câmara, Jefferson saltava fora, desconversava. Afinal, aquilo fazia parte de seu macabro plano para desmoralizar e, se possível, acabar com o governo.
Segunda etapa do plano Jefferson (só do Jeff?).
Ele chamou seu cupincha Maurício Marinho e disse:
- Mauricinho, sabe que tu tens uma pinta de galã?
- Eu, chefinho?!
- Sim, tu mesmo. E pra provar que estou falando a verdade, até já arranjei um papel pra tu num filme que estou produzindo.
- Nem acredito!
- Pois pode botar fé. Tu vais ser o meu Dimas Toledo lá nos Correios.
- E cumé que eu faço? Cadê o script?
- Taqui, ó - Jefferson entregou o roteiro da peça a Mauricinho.
Depois de dar uma corujada nos originais, Marinho aceita seu papel em "Três merrecas prum corrupto de terceira".
Marinho ainda contestou:
- Ô, chefinho, num é pouco demais não?! Só três merrecas!! Meus filhos vão reclamar! Lá na escola deles, os coleguinhas vão dizer: "Meu pai é mais corrupto que o teu!" Num dá pra ser três milhões não?!
- Não! Aí, como é que a gente vai dar close na grana? Se for muita bufunfa, além de não caber no teu bolso, a gente daria muita bandeira, abrindo a pasta pra dar close na propina. Vai ser só três merrecas mesmo. Você pega, dá uma paradinha, a câmera discreta dá um close, em seguida, você coloca no bolso.
- Mas essa produção já tem distribuidores?
- Se ainda não tem mas vai ter. Vai ser a película do ano. Se duvidar, a gente ganha um Oscar de melhor canalhice do ano.
A película foi rodada. Os produtores entregaram o filme à imprensa. Estourou o escândalo das três merrecas nos Correios. Jefferson disse que aquilo foi coisa do Zé Dirceu para incriminá-lo. Marinho disse que estava só brincado. A nação se indignou. Jefferson aproveitou a "covardia" do Dirceu, fez que ficou indignado com o chefe da Casa Civil e resolveu contar "tudo" sobre o esquema de caixa 2 do PT. Falou até que aquilo era ainda pior do que simples esquema de financiamento de campanha:
- Esse dinheiro, na verdade, era pra compra de votos dos parlamentares da base do governo. O pagamento era feito regularmente. Portanto eu o batizo de "mensalão".
A oposição vibrou:
"Joga pedra no PT! Joga bosta no Delúbio, Dirceu, Marcos Valério e outros infames! Eles foram feitos pra apanhar!, foram feitos pra cuspir! Eles dão pra qualquer um, malditos petistas!!!"
Durante os seis últimos meses de 2005, a população brasileira teve que agüentar a mídia cobrindo CPIs, esculachando o governo Lula, e os parlamentares da oposição fazendo devassa nas contas do Marcos Valério.
Jefferson e Mauricinho saíram de cena.
Agora, faz mais de um mês, surgiu outro esquema de caixa 2. Desta vez o da oposição. O DIMASDUTO. A imprensa relutou para não apresentar o caixa 2 do PSDB. Ninguém queria falar nisso. Aqui e ali, alguém tocava no assunto, assim, pelas beiras. Os petistas pressionaram. Fizeram guerrilha na internet. Bombardearam as redações. Ninguém tava nem aí.
Ontem, 1° de fevereiro, finalmente, os telejornais apresentaram o caixa 2 do PSDB, o DIMASDUTO. Mas, pasme, o fizeram como se fosse VALERIODUTO, o caixa 2 do PT. Pasmou?! Bom, nesse caso, creio que você não conhece essa gente, esses que acham que o telespectador é a cara do Homer Simpson.
A coisa foi feita assim: nenhuma palavra sobre Serra (R$7.000.000,00), Alckmim (R$9.300.000,00), Aécio Neves (R$5.500.000,00) ou outro qualquer das planilhas de Furnas. Falava-se de Furnas, caixa 2, campanha de 2002, corrupção e o bufão Jefferson, o único que "assumiu" ter recebido dinheiro (R$75.000,00), conforme consta na planilha do caixa 2 de Furnas, no governo do intelectual Fernando Henrique Cardoso.
Sei que milhões de telespectadores neste Brasilzão não entenderam patavina. Não atinaram para o fato de que aquilo eram denúncias contra o governo FHC. Pelo contrário, tudo foi montado para induzir o grande público ao erro, aquelas pessoas que não lêem as colunas dos articulistas de plantão, milhões delas. Assisti a dois telejornais: BAND e JORNAL NACIONAL (este nem fez chamada na abertura do programa). Ambos trataram a matéria de forma idêntica: nada de Serra, nada de Alckmim, nada de Aécio nem de outro político qualquer que conste no rol dos que supostamente receberam dinheiro; exceto Goldman, que foi citado por ter espinafrado o governo Lula.
Nos jornais impressos, comenta-se e até se dá os nomes (nas planilhas constam uns dois caminhões deles), mas nos telejornais, que seria o fato tratado no atacado, para o grande público, nada! Se fosse valerioduto de verdade, teria: Lula (na cabeça), Dirceu (mesmo chutando cachorro morto), todos os governadores, senadores e deputados que, supostamente, receberam por fora na campanha de 2002.
As planilhas existem, tornaram-se públicas via internet, não dá pra esconder do público leitor, precisava-se dar uma satisfação a esse público que exige, para o governo FHC e seus aliados, o mesmo tratamento bombástico ("O maior esquema de corrupção do mundo!!!") que deram ao caixa 2 petista.
Jefferson foi lá fazer seu papel, o mesmo desde o início. Disse que recebeu 75 merrecas. Até parecia que ele estava sendo imparcial. Mentira, tudo mentira, teatro.
Na TV, fizeram-lhe a pergunta:
- Você acha que "alguém" mais na lista recebeu dinheiro? (grande pergunta!)
- Não sei, pergunte a "eles", eu respondo por mim (foi nesses termos).
Mas esse "alguém" e "eles" não tinham nomes nos telejornais.
Ninguém pode duvidar que Jefferson foi lá, mais uma vez, fazer o seu papel, dar continuidade à explosiva denúncia que armou contra o PT no ano passado. Jefferson conhece bem o papel que desempenhou. As redações sabem o que fazem.
Talvez agora ele saia de cena de uma vez por todas. Apesar de já ter apresentado sua filha como candidata para as próximas eleições.
No jornalismo brasileiro sempre teve essa coisa: um papo para os letrados e semiletrados, nos jornais impressos; outro para o grande público, na televisão: "De Boner para Homer".
P.S.: Se alguém achar que alguma coisa neste artigo não bate com a verdade, vá reclamar nas redações dos telejornais, pois, baseado em suas veiculações, foi o que entendi.
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PressAA
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