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Boletim de Atualiazação - Nº 328 - 6/11/2013
...para a PressAA...
Realismo socialista na Coreia do Norte
– 5 DE NOVEMBRO DE 2013
Estúdio de Arte Mansudae, em Pyongyang, tem mil artistas e é provavelmente um dos estúdios com maior produção no mundo. Sua arte, de um realismo socialista contemporâneo, tem entre os clientes Alemanha e países africanos
A arte da República Democrática Popular da Coreia é a marca registrada do realismo socialista contemporâneo. Na verdade, é possível comprar a arte da Coreia do Norte pela internet — desde cartazes de propaganda, paisagens e buquês de flores até retratos de família. Claro, os cartazes de propaganda são os mais vendidos (também são os mais baratos), mas as pinturas com joias são outra coisa completamente diferente (obras raras e chamativas, totalmente confeccionadas com pedrarias).
Algumas semanas atrás, numa feira de arte em Dandong, China, a atração mais popular foi uma exposição de belas artes da RDPC, aberta na Galeria Dandong no dia 10 de outubro. A CCTV (um dos principais canais de TV chineses) anunciou que a exposição se tornou o destaque da feira, vendendo 30 obras nos primeiros três dias. Não havia arte de propaganda na exposição. A seleção era mais expressiva, arte estilo cartão-postal. Parece que enquanto muitas barreiras norte-coreanas ainda estão de pé, a arte é uma maneira de ultrapassá-las.
Pescadoras Trabalhando, por Gang Song Ryong
Pescadoras ensinando a pescar, por PressAArt-Maña
Tudo isso foi criado por um estúdio em particular. Fundado em 1959, o Estúdio de Arte Mansudae é um estúdio de Pyongyang que emprega quatro mil funcionários, mil deles artistas. Provavelmente um dos estúdios de maior produção no mundo, a instituição costumava funcionar sob a coordenação de King Jong Il, o que fazia dele o mais proeminente estúdio de arte da Coreia do Norte. Contando com departamentos de produção em pintura a óleo, cerâmica, xilografia e escultura — o Mansudae criou o Monumento à Fundação do Partido Coreano dos Trabalhadores, onde três mãos empunham uma foice, um martelo e um pincel de caligrafia. Os caras levam a sério sua arte.
A produção de obras com clientes internacionais é a receita perfeita para o sucesso de vendas. Desde os anos 1970, o Mansudae tem uma seção internacional, oferecendo mão de obra barata para grandes monumentos, como o Monumento da Renascença Africana no Senegal e o monumento de guerra Acre dos Heróis na Namíbia. Os monumentos do Mansudae são criticados por serem muito “coreanescos”; aparentemente a Alemanha é o único cliente ocidental do estúdio, que os contratou para recriar a Fonte do Conto de Fadas em Frankfurt. Na última década, estima-se que o Mansudae tenha feito US$160 milhões. Ainda assim, os artistas não veem esse retorno — todo lucro das vendas vai direto para o estado.
Numa rara entrevista, o gerente do site ocidental do Mansudae, Pier Luigi Cecioni, falou com a VICE, direto da Itália, sobre o site do Estúdio de Arte Mansudae, a arte do realismo socialista, e como é ser um dos cinco estrangeiros numa festa em Pyongyang.
Vamos Defender o Grande Líder Comandante Kim Jong Il, de Han Song Gyu.
Vamo$ Defender o Grande Líder Comandante Obama Wall $treet, por PressAArt-Maña
VICE: Como você acabou se envolvendo com a arte norte-coreana? Você parece ser um especialista.
Pier Luigi Cecioni: Em 2005, eu era presidente de uma orquestra de música clássica em Florença, Itália. Por coincidência, uma delegação da minha orquestra era convidada para participar do Festival da Amizade de Primavera em Pyongyang todo ano (agora menos frequentemente). O Festival acontece por volta do dia 15 de abril, que é o aniversário do pai da pátria, Kim Il Sung, e é o feriado mais importante da Coreia do Norte. Cerca de 700 pessoas participam do festival e somente 20 são estrangeiros (nosso grupo era formado por cinco pessoas). Em Pyongyang, perguntei se eles tinham algum centro de belas-artes ou galeria que eu pudesse visitar.
Acontece que o Estúdio de Arte Mansudae fica em Pyongyang, e esse é provavelmente o maior centro de produção de arte do mundo. E eu nunca tinha ouvido falar nisso (ninguém tinha, provavelmente). É possível encontrar algumas informações sobre o Mansudae em nosso site. Quando perguntei se eles estariam interessados em fazer algo no Ocidente, eles responderam: “É claro”. Em janeiro de 2006, depois de meses de correspondência, retornei a uma Pyongyang extremamente gelada com meu irmão Eugenio, um artista, professor da Academia de Belas Artes de Florença e, na época, diretor de um centro de exposições próximo de Florença. Escolhemos vários trabalhos para trazer para a Europa e assinamos um acordo, tornando-nos representantes do Estúdio de Arte Mansudae no Ocidente. Uma das cláusulas do acordo era organizar exposições das obras do Mansudae no Ocidente. Retornei a Pyongyang algumas vezes desde então e artistas coreanos já vieram visitar a Itália.
No Riacho, por Hong Jae Chol.
No Diacho, por PressAArt-Maña
Até que ponto a construção do site do Estúdio de Arte Mansudae evoluiu?
Começamos a construir o site em 2007, na época de nossa primeira exposição. O site tem como público-alvo os ocidentais e é gerenciado por mim.
O Estúdio de Arte Mansudae representa a elite dos artistas da Coreia do Norte. Quão difícil é se juntar ao estúdio e qual é o processo de entrada para os artistas?
A maioria dos melhores artistas do país está no Mansudae. Praticamente todos eles têm um curso universitário ou formação em belas-artes. Quando um estudante se destaca na universidade, ele ou ela é convidado a se juntar ao Mansudae. E se um artista se destaca em outro centro, ele ou ela pode ser convidado a entrar para o estúdio. É uma grande honra fazer parte do Mansudae.
Chamada de Emergência, por Kim Hak Rim.
Você sabe quantos artistas entram no estúdio por ano?
Desde que comecei meu contato com o Mansudae, pelo que sei, o número de artistas se manteve mais ou menos constante, então, não acho que haja um número fixo de artistas entrando todos os anos.
O treinamento é muito exigente, começando aos nove anos de idade, certo?
Pelo que eu sei, não há um treinamento que comece tão cedo. Do ensino elementar até o colegial, até onde eu sei, as crianças frequentam a escola somente no período da manhã e estudam várias matérias. Do final da escola elementar até o colegial, durante a tarde, os estudantes podem participar voluntariamente de programas e instituições nos quais podem praticar música, arte, esporte, teatro, etc. Minha impressão é que o treinamento começa a ser muito exigente na universidade: os norte-coreanos são estudantes universitários muito aplicados e sérios. No entanto, não tenho um conhecimento aprofundado sobre o sistema escolar da Coreia do Norte.
Confronto, por Kim Hyon Myong.
É verdade que mesmo quando a arte dos artistas vende, o lucro vai direto para o estado?
O Mansudae tem uma, talvez inesperada, autonomia econômica. O dinheiro das vendas vai para o Estúdio de Arte Mansudae. Isso deve ser diferente no caso de grandes projetos no exterior, com os quais não estou envolvido. Esses provavelmente são gerenciados num nível governamental.
Vocês têm muitos clientes no exterior? O que vende mais e aonde? São as pinturas com joias ou, digamos, os cartazes de propaganda?
Sim, temos muitos colecionadores por aí. Como estamos na Itália, muitos dos nossos colecionadores são italianos. Os cartazes de propaganda, por serem os menos caros, e também muito incríveis, são as vendas mais fáceis. No entanto, vendemos bem todos os tipos de obra. As pinturas com joias são relativamente mais raras.
Afortunado, por Kim Song Sik.
Recentemente, vi a pintura Festa Dançante a Céu Aberto, de Han Guang Hun. As pinturas são baseadas em eventos reais? Pela pintura parece ser uma festa muito divertida. Eu não sabia que os norte-coreanos faziam festas assim.
Engraçado você escolher essa pintura. Eu lhe enviei uma foto não muito boa que fiz em 15 de abril de 2005, na dança na Praça Pyongyang em celebração ao aniversário de Kim Il Sung. Eu também participei da dança. Quando fiz essa foto, eu ainda não tinha visto a pintura [Festa Dançante a Céu Aberto]. Fora essas grandes festividades, os coreanos gostam muito de cantar. Acho que deve ser algo genético, porque quase todos cantam muito bem. Em julho passado, quando estive lá, eu sempre via grupos de pessoas cantando ao entardecer e, aos domingos, muitas pessoas fazem piqueniques familiares nos parques, cantando e dançando. O karaokê, como em muitos países asiáticos, é algo muito popular.
Você disse que conheceu esses artistas quando eles vieram para a Itália e que eles não gostaram da arte contemporânea. Do que eles gostaram? As personalidades deles estão mais para egocêntricas, como o Damien Hirst, ou eles são mais como artesões humildes? Eles são engraçados? Sérios? Dramáticos? Teatrais? Eles são seus amigos?
Os artistas definitivamente não têm grandes egos, nem são humildes. De certa maneira, dentre as pessoas que frequento, eles se consideram todos iguais, mesmo tendo consciência que, na arte, alguns são melhores do que outros e que todos têm posições de trabalho diferentes. A arte contemporânea ocidental não interessou a eles. Na verdade, eles a acharam literalmente engraçada; eles riram vendo alguns dos trabalhos, não com desdém, mas com uma surpresa verdadeira. Eles ficaram muito mais interessados em arte clássica. Cerca de um ano atrás, acompanhei alguns deles a Galeria Uffizi e aos museus do Vaticano, e eles gostaram muito. Eles conheciam os principais artistas pelo que estudaram na universidade. Eles são absolutamente figurativos e nunca viram experimentos com arte abstrata, conceitual ou similares.
À esquerda: Uma estátua de gesso de Kim Jong Il do Estúdio de Arte Mansudae no Parque Aquático Munsu em Pyongyang. // À direita, PressAArt-Maña
O artista Lee Cheol, da Mansudae, participou recentemente de uma exposição e foi entrevistado pela CCTV na China. Os artistas falam publicamente com frequência? Eles gostam de ser o centro das atenções?
Não posso oferecer uma resposta geral. Quando fizemos nossa primeira exposição, convidamos dois artistas da Mansudae e eles falaram com a mídia sem problemas. Não sei se eles falam frequentemente em público na Coreia do Norte. Uma vez, assisti a um vídeo longo de um programa de TV (sem entender nada, claro) com entrevistas dos dois artistas que tinham vindo para a Itália. A verdade é que eles são muito formais para os nossos padrões. Mas eles raramente vão ao exterior e quase ninguém fala alguma língua europeia.
Eles falam inglês? Sei que alguns deles ficam anos fora, criando murais em lugares como a Namíbia.
Praticamente ninguém fala inglês. Há alguns interpretes. O Mansudae tem realizado projetos realmente grandes no exterior, principalmente trabalhos arquitetônicos e esculturais. O mais recente é um museu em Angkor Vat, Camboja, que foi inaugurado há pouco. Para esses trabalhos eles ficam anos fora, mais ou menos como diplomatas. Conheci muitos artistas que passaram alguns anos em vários países, principalmente na África.
Glória da Pátria, por Kim Myog Guk.
E como é visitar o estúdio Mansudae? Eles estão abertos a visitas do público? Você tem fotos? Isso é como uma escola de arte orientada para a comunidade?
Para mim, o Mansudae é um lugar familiar. Quando estou lá, passo muitas horas conversando sobre vários assuntos com diferentes pessoas. Tenho várias fotos, mas não sou um fotógrafo muito bom. Nunca encontrei nenhuma restrição para fotografar lá. No Mansudae, que tem cerca de 12 hectares, há uma galeria comercial, que pode ser visitada por alguns poucos turistas. As outras partes em geral não são abertas ao público, são espaços de trabalho. O lugar é mais ou menos similar a um campus universitário norte-americano (eles têm até um campo de futebol), mas definitivamente não é uma escola. São cerca de quatro mil funcionários, mil deles são artistas, e, como eu disse antes, praticamente todos já formados, então são mais velhos do que estudantes. Há todo tipo de estúdio lá, inclusive os dos escultores de estátuas monumentais. Há laboratórios, lojas, departamento de suprimentos, etc. Há uma grande galeria, um jardim de infância, uma espécie de cafeteria e muitos outros prédios. Eu não conheço tudo. As pessoas não moram no Mansudae: elas trabalham lá e moram em Pyongyang.
O propósito da arte na Coreia do Norte é a mensagem política. O que mais o realismo socialista incorpora? Que símbolos eles são ensinados a pintar, tanto nas pinturas do Kim Jong-un como nas outras?
Eu não diria que o propósito de toda a arte norte-coreana seja a mensagem política. O realismo socialista representa a Coreia do Norte sob uma luz positiva e, num sentido mais amplo, quer inspirar os espectadores a ter sentimentos positivos, patrióticos e a celebrar; especialmente as grandes esculturas e pinturas exibidas em espaços públicos: os líderes. Os temas estão frequentemente relacionados ao trabalho, um assunto que não é comum no ocidente. Uma forma particular do realismo socialista são os cartazes. Eles são pintados à mão, não impressos, e têm mensagens políticas e sociais. Muitos têm como alvo os Estados Unidos, visto como um agressor do passado e um agressor em potencial. Além do realismo socialista, pinturas de paisagens são muito populares. Assim como pinturas de flores e da natureza em geral. Há também muitos retratos, principalmente de trabalhadores. Mas há tantos tipos de arte – escultura, cerâmica, bordado, vários tipos de pintura, xilografia, caligrafia e algumas outras — que não é possível generalizar.
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Extra!
Furo!
PressAA invade site de Universe Online e vaza documento top secret que revela o potencial da Coreia do Norte para a produção de cogumelo atômico!
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04/11/2013
A urgência à procura de um debate
O campo progressista na AL está às voltas com o desafio de reordenar o câmbio, o que implica definir o poder de compra real dos salários no novo ciclo econômico
por: Saul Leblon
Um dos maiores gargalos do país é a ausência de espaço para a discussão madura das opções, dos custos e requisitos à ordenação de um novo ciclo de crescimento brasileiro.
Sem esse escrutínio, a coisa não anda. Patina-se no vale-tudo onde a serenidade e o disparate se ombreiam na mesma irrelevância.
A paralisia só é boa para quem aposta no desgaste como via de rendição da sociedade a purga saneadora prescrita pela ortodoxia.
Uma hora cansa e a gororoba é empurrada pela goela.
Ou não terá sido assim que aconteceu na Espanha? Com as ruas tomadas pelos ‘indignados’, o país elegeu o PP (o demos de lá)e deu plenos poderes ao premiê Mariano Rajoyna Câmara.
Para fazer o que?
O arrocho espanhol elevou a taxa de desemprego no país a fantásticos 26%. Em média. No caso da juventude vai a 50%.
‘A esperança da ortodoxia, para amenizar o cenário, é que a migração retire do mercado espanhol uns 300 mil a 500 mil jovens por ano’, informa o correspondente de Carta Maior em Londres, Marcelo Justo.
O país está à beira da deflação, a exemplo do espectro que ronda todo o ambiente europeu.
Cortes suicidas de preços se multiplicam diante de um consumidor empobrecido que adia sua compra no aguardo de novas baixas.
Foi assim na Depressão norte-americana, em 1929, que esfarelou a indústria e despejou metade da mão de obra na rua.
Mas os bancos saúdam a ‘recuperação conduzida por Rajoy’ e os replicantes tropicais da via espanhola não se intimidam.
Manipulação de prioridades e indução de expectativas, eis o combustível conservador desse jogo perigoso.
As sirenes do colapso iminente – ‘se não for hoje, de amanhã o Brasil não passa’--completam um repertório que alimenta o descrédito na ação pública e em todo o sistema político.
A cereja do bolo é a corrupção, que como sabemos é sistêmica nos governos do PT. Será sempre pontual no caso da coalizão conservadora.
Toneladas desse ácido corrosivo banham o espírito da sociedade diuturnamente.
A ardilosa montanha-russa eleva as expectativas para em seguida frustrá-las com a porretada do desencanto.
A reportagem da Folha deste domingo sobre a conversão do sistema elétrico aérea em subterrâneo condensa em ponto pequeno o mecanismo.
Primeiro, atiça-se o apetite da classe média com o miraculoso recurso do photoshop.
Vejam quão bela ficaria a emergente Vila Olímpia sem a maçaroca aérea de cabos que nos equiparam a um Haiti. Agora, comparem a magnífica Paris isenta dessa teia asfixiante; e como ficaria degradada se tivesse fiação equivalente a de São Paulo.
Ótimo. Aos custos: uns R$ 120 bilhões para o enterramento da fiação em toda a capital. Três vezes o orçamento da prefeitura.
Essa é um dos destaques do jornal que diariamente açula a revolta dos munícipes contra o reajuste indispensável do IPTU para mitigar urgências da metrópole colapsada.
Em frente.
No edição dominical do Estadão, o tucano FHC vai mais fundo.
Ele atribui o ‘caos urbano’ aos governos petistas ‘que puseram em marcha’, diz,‘uma estratégia de alto rendimento econômico e político imediato, mas com pernas curtas e efeitos colaterais negativos a prazo mais longo’.
Para não esquecer: quem pontifica é aquele em cuja gestão o Brasil quebrou três vezes e na qual um apagão engessou o curto prazo da economia, enquanto um juro real de 10%condenaria o longo prazo à gaveta.
“O futuro chegou’, esponja-se agora um FHC professoral:“ (chegou) na esteira da falta de investimento em infraestrutura (...) e do gasto das famílias via crédito fácil, empurrado pela Caixa Econômica Federal. Os reflexos aparecem nas grandes cidades pelo país afora: congestionamentos, transporte público deficiente, aumento do nível de poluição atmosférica etc.”
Afinal, o que o sociólogo de estilo sonolento está propondo?
Um capitalismo sem crédito? Uma bicicleta sem pedal?
Bem que ele tentou: no ciclo FHC a relação crédito/PIB ficou estagnada em 26%, contra 54% agora.
Administrar a demanda agregada, tudo bem, mas um capitalismo sem crédito destina-se exatamente a quem?
O capitalismo sem demanda é funcional à supremacia dos mercados financeiros.
A baixa atividade mantém a senzala recolhida aos bantustões.
O trânsito fica menos carregado, os aeroportos mais livres; o desemprego de 12,5%no ciclo do PSDB (hoje é inferior a 6%) evidenciava a anemia geral contabilizada na queda da receita fiscal.
Nenhum problema: o endividamento público, lubrificado por um juro real de 10% ao ano (hoje é de 3%), abastecia os cofres do Estado e alegrava o rentismo.
Essa é a coerência para a qual a o ziguezigue conservador quer nos empurrar novamente.
Parece redondo.
Exceto por um senão: o juro alto atrai capitais especulativos, que valorizariam ainda mais um Real já adverso à competitividade da indústria atrofiada pela importação barata.
O desafio do câmbio é uma agenda presente hoje em boa parte da América Latina.
Não é uma questão técnica.
Câmbio e inflação são almas gêmeas.
A taxa de câmbio define qual será o poder real de compra dos salários.
O câmbio qualifica o trânsito para um novo ciclo econômico; em certa medida antecipa seus vencedores e perdedores; ele determina a inserção da economia no quadro mundial, o papel da exportação e da indústria (onde ela existe) e o tipo de emprego e de mercado interno que se deseja incentivar.
É por conta dessas implicações delicadas que mesmo governos progressistas usufruíram passivamente do confortável ciclo de alta liquidez internacional que valorizou o câmbio e o poder de compra local.
O ensaio de recuperação norte-americana prenuncia a inversão dos fluxos de capitais, que viajam de volta aos papéis de longo prazo do Tesouro, em detrimento dos países em desenvolvimento.
A travessia cambial explica a tensão do debate econômico no interior do bolivarianismo venezuelano; constitui um divisor dentro do peronismo argentino e está subjacente à discussão do passo seguinte do desenvolvimento brasileiro.
O choque de juros preconizado por tucanos e assemelhados tem o predicado de precipitara direção do ajuste definindo o lombo onde recairá a chibatada cambial mais dolorida.
Talvez precise da polícia para colocar ordem na fila do pelourinho.
Mas para quem, como a Folha deste domingo, discute seriamente Ruanda (45% de pobreza)como o país ‘top reformer’, um paradigma das mudanças amigáveis ao ambiente dos negócios, tudo bem.
O ponto a reter é que há decisões estruturais batendo na porta da economia brasileira.
A urgência procura um espaço maduro para um debate complexo.
O oposto do oferecido pela sofreguidão indigente que exala da leitura dominical da mídia conservadora.
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Texto recebido por e-mail da rede de correspondentes de Hélder Câmara, sob o título "Um dia isto tinha que acontecer", autoria de Mia Couto. Porém pesquisa no Google indica publicação do mesmo no site MOVIMENTO ZEITGEIST - Portugal, com o título "Geração à Rasca - A Nossa Culpa", fazendo a seguinte observação:
O texto referido não é de MIA COUTO!
É de Maria dos Anjos Policia.
Agradeço que retifiquem o erro.
GERAÇÃO À RASCA - A NOSSA CULPA
"Um dia, isto tinha de acontecer. Existe uma geração à rasca? Existe mais do que uma! Certamente!
Está à rasca a geração dos pais que educaram os seus meninos numa abastança caprichosa, protegendo-os de dificuldades e escondendo-lhe as agruras da vida.
Está à rasca a geração dos filhos que nunca foram ensinados a lidar com frustrações.
A ironia de tudo isto é que os jovens que agora se dizem (e também estão) à rasca são os que mais tiveram tudo.
Nunca nenhuma geração foi, como esta, tão privilegiada na sua infância e na sua adolescência. E nunca a sociedade exigiu tão pouco aos seus jovens como lhes tem sido exigido nos últimos anos.
Deslumbradas com a melhoria significativa das condições de vida, a minha geração e as seguintes (actualmente entre os 30 e os 50 anos) vingaram-se das dificuldades em que foram criadas, no antes ou no pós 1974, e quiseram dar aos seus filhos o melhor.
Ansiosos por sublimar as suas próprias frustrações, os pais investiram nos seus descendentes: proporcionaram-lhes os estudos que fazem deles a geração mais qualificada de sempre (já lá vamos...), mas também lhes deram uma vida desafogada, mimos e mordomias, entradas nos locais de diversão, cartas de condução e 1º automóvel, depósitos de combustível cheios, dinheiro no bolso para que nada lhes faltasse. Mesmo quando as expectativas de primeiro emprego saíram goradas, a família continuou presente, a garantir aos filhos cama, mesa e roupa lavada.
Durante anos, acreditaram estes pais e estas mães estar a fazer o melhor; o dinheiro ia chegando para comprar (quase) tudo, quantas vezes em substituição de princípios e de uma educação para a qual não havia tempo, já que ele era todo para o trabalho, garante do ordenado com que se compra (quase) tudo. E éramos (quase) todos felizes.
Depois, veio a crise, o aumento do custo de vida, o desemprego, ... A vaquinha emagreceu, feneceu, secou.
Foi então que os pais ficaram à rasca.
Os pais à rasca não vão a um concerto, mas os seus rebentos enchem Pavilhões Atlânticos e festivais de música e bares e discotecas onde não se entra à borla nem se consome fiado.
Os pais à rasca deixaram de ir ao restaurante, para poderem continuar a pagar restaurante aos filhos, num país onde uma festa de aniversário de adolescente que se preza é no restaurante e vedada a pais.
São pais que contam os cêntimos para pagar à rasca as contas da água e da luz e do resto, e que abdicam dos seus pequenos prazeres para que os filhos não prescindam da internet de banda larga a alta velocidade, nem dos qualquercoisaphones ou pads, sempre de última geração.
São estes pais mesmo à rasca, que já não aguentam, que começam a ter> de dizer "não". É um "não" que nunca ensinaram os filhos a ouvir, e> que por isso eles não suportam, nem compreendem, porque eles têm direitos, porque eles têm necessidades, porque eles têm expectativas, porque lhes disseram que eles são muito bons e eles querem, e querem, querem o que já ninguém lhes pode dar!
A sociedade colhe assim hoje os frutos do que semeou durante pelo menos duas décadas.
Eis agora uma geração de pais impotentes e frustrados.
Eis agora uma geração jovem altamente qualificada, que andou muito por escolas e universidades mas que estudou pouco e que aprendeu e sabe na proporção do que estudou. Uma geração que colecciona diplomas com que o país lhes alimenta o ego insuflado, mas que são uma ilusão, pois correspondem a pouco conhecimento teórico e a duvidosa capacidade operacional.
Eis uma geração que vai a toda a parte, mas que não sabe estar em sítio nenhum. Uma geração que tem acesso a informação sem que isso signifique que é informada; uma geração dotada de trôpegas competências de leitura e interpretação da realidade em que se insere.
Eis uma geração habituada a comunicar por abreviaturas e frustrada por não poder abreviar do mesmo modo o caminho para o sucesso. Uma geração que deseja saltar as etapas da ascensão social à mesma velocidade que queimou etapas de crescimento. Uma geração que distingue mal a diferença entre emprego e trabalho, ambicionando mais aquele do que este, num tempo em que nem um nem outro abundam.
Eis uma geração que, de repente, se apercebeu que não manda no mundo como mandou nos pais e que agora quer ditar regras à sociedade como as foi ditando à escola, alarvemente e sem maneiras.
Eis uma geração tão habituada ao muito e ao supérfluo que o pouco não lhe chega e o acessório se lhe tornou indispensável.
Eis uma geração consumista, insaciável e completamente desorientada.
Eis uma geração preparadinha para ser arrastada, para servir de montada a quem é exímio na arte de cavalgar demagogicamente sobre o desespero alheio.
Há talento e cultura e capacidade e competência e solidariedade e inteligência nesta geração?
Claro que há. Conheço uns bons e valentes punhados de exemplos!
Os jovens que detêm estas capacidades-características não encaixam no retrato colectivo, pouco se identificam com os seus contemporâneos, e nem são esses que se queixam assim (embora estejam à rasca, como todos nós).
Chego a ter a impressão de que, se alguns jovens mais inflamados pudessem, atirariam ao tapete os seus contemporâneos que trabalham bem, os que são empreendedores, os que conseguem bons resultados académicos, porque, que inveja!, que chatice!, são betinhos, cromos que só estorvam os outros (como se viu no último Prós e Contras) e, oh, injustiça!, já estão a ser capazes de abarbatar bons ordenados e a subir na vida.
E nós, os mais velhos, estaremos em vias de ser caçados à entrada dos nossos locais de trabalho, para deixarmos livres os invejados lugares a que alguns acham ter direito e que pelos vistos - e a acreditar no que ultimamente ouvimos de algumas almas - ocupamos injusta, imerecida e indevidamente?!!!
Novos e velhos, todos estamos à rasca.
Apesar do tom desta minha prosa, o que eu tenho mesmo é pena destes jovens.
Tudo o que atrás escrevi serve apenas para demonstrar a minha firme convicção de que a culpa não é deles.
A culpa de tudo isto é nossa, que não soubemos formar nem educar, nem fazer melhor, mas é uma culpa que morre solteira, porque é de todos, e a sociedade não consegue, não quer, não pode assumi-la.
Curiosamente, não é desta culpa maior que os jovens agora nos acusam.
Haverá mais triste prova do nosso falhanço?
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Ilustração:
AIPC – Atrocious Internacional Piracy of Cartoons
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PressAA
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