TÁ, E DAÍ?
Raul Longo*
O jogo de dominó
seguia furibundo desde que entrei no boteco. Tanto que nem me atrevi a
perguntar pela razão da tanta circunspecção, levando por conta da vontade de
vitória das parceiradas: Mobília e Agito contra o Tá e o Daí.
Apenas intercalado
pelo “plequet!” seco da jogada da peça num extremo da carreirinha preta de
bolinhas brancas, o zumbir solitário de uma varejeira foi interrompido pelo
vozeirão de contrito deboche do Mobília:
- Cês viro! Até o
Genoíno, herói nacional da guerrilha contra a ditadura!
Outro “plequet”
seguido de um olhar de desafio para o Agito. Desafio como num oferecimento:
- Tá!
Agito rodeou,
rodeou, mas aceitou a oferta e soltou a pedra em meio ao desabafo:
- Deviam ter matado
como comunista! Mas não faz mal... Não foi como terrorista, vai como petralha!
Ao invés de olhar
pra carreirinha disposta ali na mesa, o jogador seguinte ficou encarando o
adversário na espera da solução de outro, até perguntar:
- E daí?
De trás do balcão,
Seu Manuel farfalhou virando a página do jornal:
- É uma besta! Não
viram a foto da fachada da casa desse Jesuíno? Não entendo pra que serve ser
presidente do partido da presidência e do maior esquema de corrupção da
história do Brasilê, e viveire numa casa d’onde dentro não cabe nem o
Mobília?
Mobília virou-se
para olhar onde não caberia, mas não se comoveu nem disse nada. E o arremate do
Seu Manuel ficou no ar:
- E ainda
dizem que o burro sou eu...
Mobília olhou a
ponta de cá da carreira, olhou a ponta de lá... Calculou e por fim decidiu,
ainda que meio na dúvida, num “plequet!” meio xoxo. Jogou pedra e conversa
fora:
- Gostei foi
daquela muié: “Prova num tem, mas condeno assim mesmo”. Isso é que é sê macha!
Mal foi terminar de
falar e, ligeiro, o “plequet” seguinte estalou:
- Tá!
Agito desconversou
pra ganhar tempo no cálculo das pedras na mesa e as da mão:
- Pra que prova?
Qué mais prova do que a corrupção do Waldomiro Diniz?
Dessa vez não deu
pra ouvir o ruidinho no tampo da mesa, encoberto pelo sotaque do português:
- Ô pá! Aí está a
prova de como é burro! Pra que raios foi se meter logo com o Carlinhos
Cachoeira! Se não foi com o Cachoeira, foi com algum compadre do bicheiro. Com
bicheiro não se pode mexer, pois que dá é nisso! O homem foi buscar a corrupção
do Diniz lá no governo do Garotinho! Como diz o oitro: quem se mete com
garotinho, amanhece...
Absorveu-se na
leitura na página seguinte do jornal sem completar o dito do “oitro”, enquanto
num gesto, passando a vez, o adversário perguntou mesmo sem descer pedra
alguma:
- E daí?
Mobília mensurou a
mão, a mesa. Fez que descia uma, segurou e deixou-se na prosa, disfarçando o
vacilo:
- Dirceu e Genoíno
podem até não ter culpa de coisa nenhuma, mas que o Delúbio entrou no Caixa 2,
entrou! Esse meteu a mão no baleiro!
Por fim deitou a
pedra que o da sequência demonstrou ser exatamente a que esperava num “plequet”
que soou sonoro, espantando pra rua o zumbido da mosca sem que ninguém a
notasse, atentos à exclamação do Seu Manuel pela foto do jornal:
- Aí Jesus! Olha
que linda a casa do sítio do Roberto Jefferson! Este cá, sim, é que é um gajo
experto. Eu também guardo aqui minha caixinha separada pra ajudar o genro na
política. Se Deus quiseire, na próxima ele se elege e ainda vou a ter um sítio
como esse. Vejam que brinco!
- Tá!
Surpreso, Mobília
confessou-se sem jogo pra sua pedra única, passando a vez pro Daí que sorriu ao
parceiro e depois pro Agito:
- E daí?
Agito desconfiou,
mas não quis acreditar. Passou o mesmo olhar pro próximo, na esperança de que
soltasse uma abertura pro parceiro bater daquela vez. Primeiro de um depois de
outro, as respostas vieram em sequência como se das duas pontas na carreira de peças
de dominó:
- Tá!
- E daí?...
Agito entendeu:
- Porra! Ocê fechou
o jogo!
Irritado pelo final
abrupto, começou a exigir:
- Isso é fugir da
jogada. Tem de contar os pontos da mão... - mas já era tarde e se deu conta do
ridículo. Tinham perdido a melhor de três e a “nêga”. Ali era só um tapetão
arranjado pra cozinhar nova torcida que, em mim, se percebeu desinteressada.
Mesmo que tivessem
menos pontos na mão - e por mais que blefasse sabia estarem carregados -,
aquela rodada não queria dizer nada. O jeito foi ficar só na ameaça vazia:
- Vai ter volta!
O Tá e o Daí saíram
deixando a conta do Seu Manuel pros perdedores que reclamaram:
- Pô Seu Manuel, o
Senhor entregou o jogo!
Aproveitei pra
pagar minha cachaça enquanto o dono do bar se defendia:
- Coisa alguma!
Acham que sou burro! Tá escrito aqui, mas fiz como o Jornal Nacional, nem
lembrei que o único que ainda não teve a prisão expedida pelo Joaquim Barbosa
foi o Jefferson. Esse Joaquim, apesar de tiziu...
Enquanto o
português tecia orgulho pátrio evocado pelo nome do Presidente do Supremo, fui
ao banheiro fugindo de seus preconceitos racistas. Na volta, já de saída,
ouvi-o considerar aos fregueses prediletos:
- Na próxima meu
genro há de ganhar. A caixinha está gorda e é só esperar pelo partido ao qual o
Barbosa se define. Torço para que substitua esse paneleiro do Aécio, assim o
genrinho nem precisa sair do PSDB. Mas mesmo que o negão vá pro PSOL, meu
cunhado que trabalha com filho do Barbosa lá na Globo já está a mexer os
pauzinhos.
De saída, dei meu
palpite:
- Ô seu Manuel!...
Mas e o Mensalão Tucano, o do Eduardo Azeredo?
- Ah!... Mas esse
já está a caducar, vai prescrever! O Barbosa é preto, mas não é burro! Nem eu
que não sou Joaquim, mas sou Manuel!
Caí fora enquanto
era tempo, mas ouvi o zumbido da mosca azul voltando pra dentro do boteco.
Humor negro no Jornal da Record
Depois da reportagem sobre a prisão de Dirceu, o Jornal da Record de ontem, 15/11, exibiu matéria sobre a realização do sonho de um menino que se recupera de leucemia. O espetáculo foi montado em São Francisco, Califórnia, que, por algumas horas, se transformou em Gotham City. O final feliz ocorre com a prisão do Coringa e o povo aplaudindo o justiceiro Batman
É assim que as aventuras midiáticas culminam em golpe de estado
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Roberto Jefferson poderá morrer se for preso, diz defesa
14 de outubro de 2013
Réu que denúnciou o esquema foi o primeiro a apresentar recurso nesta leva de embargos; defesa pede que ele seja perdoado devido ao seu estado de saúde
FELIPE RECONDO - Agência Estado
Na primeira leva de mensaleiros que devem ir para a cadeia, o ex-deputado Roberto Jefferson pediu ao Supremo Tribunal Federal (STF) o perdão judicial ou ao menos para não ser preso e cumprir uma pena alternativa. Se for preso, argumentam os advogados, Jefferson poderá morrer.
Veja também:
Ed Ferreira/AE
Defesa de ex-deputado pediu perdão judicial em recurso
O novo recurso de Jefferson é o primeiro da leva de embargos que o presidente do STF, Joaquim Barbosa, adiantou que seriam meramente protelatórios. Os recursos devem ser rejeitados, o que abrirá caminho para a prisão imediata de Jefferson e outros 12 condenados que não têm direito a novo julgamento.
Condenado a 7 anos e 14 dias pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro, Jefferson alega que suas declarações à época foram fundamentais para a descoberta do esquema do mensalão e consequente punição dos envolvidos. Apesar disso, sua pena foi reduzida em um terço. A defesa sustenta que, em razão de sua ajuda, a punição poderia ser perdoada ou reduzida em pelo menos dois terços.
"Não há qualquer razão para que não se tenha ofertado ao embargante o perdão judicial nos moldes previstos pela própria Lei de Regência. O que mais se poderia exigir das declarações do embargante?", questiona a defesa.
Caso não seja perdoado, Jefferson pede para não ir para a cadeia, cumprir pena alternativa ou, em última hipótese, para cumprir a pena em casa. "Tendo em vista o gravíssimo estado de saúde em que ele se encontra", alegam os advogados, a pena imposta a Jefferson deveria ser substituída por pena alternativa "por uma questão legal e, acima de tudo, humanitária". Caso contrário, afirma a defesa, a prisão seria para Jefferson "verdadeira pena de morte!".
Conforme laudo médico apresentado pelos advogados, Jefferson é "portador de Síndrome Metabólica" caracterizada por diabetes, dislipidemia, hipertensão arterial sistêmica e histórico de obesidade. Além disso, em 2012, Jefferson passou por tratamento para combate a câncer no pâncreas. Desde então, Jefferson toma remédios para diabetes, remédios para pressão e suplementos vitamínicos.
"Ressaltamos que o uso diário das medicações prescritas assim como o acompanhamento médico regular pela equipe assistente são fundamentais para a manutenção da estabilidade clínica do paciente, sob risco de agravamento potencialmente de seu quadro", afirmam os médicos que o atendem.
De Daniel Sampaio
CONVITE
Caros amigos e amigas, gostaria muito que estivessem presentes num debate sobre os meus dois últimos livros – Labirinto de Mágoas e Diário dos Tempos da Crise – que se realiza no dia 4 de Dezembro (quarta-feira) às 18,30h no piso 7 (restaurante) do El Corte Inglés, em Lisboa.
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De nossa colaboradora-correspondente Urda Alice Klueger:
Olá Amigos!
Convido-os para prestigiar a exposição Luz de Aruanda - de Sally Satler e minha - com fotografias do Candomblé e Umbanda em Blumenau.
Abertura 18 de novembro às 20h - Museu da Família Colonial - Blumenau.
E dia 19 de novembro tem a exibição e debate do Documentário: Cultura Negra: Identidade e Diferença em Blumenau.
Semana de debates e valorização da cultura afro-brasileira em nosso país e nossa cidade!!!
Abraços,
Carla Fernanda
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De...
Boletim de Atualiazação - Nº 331 - 15/11/2013
...para a PressAA...
Megafuracão Haiyan, que devastou Filipinas, deveria tornar autoridades e poder econômico mais propensos a ações contra aquecimento global. Mas eles permanecem imóveis.... Por Walden Bello
Grupo de jovens brasileiros relata: negociações climáticas seguem em impasse; lançado novo mapa de riscos do aquecimento global; povos indígenas debatem alternativas. Pela Agência Jovem de Notícias
“Vivo entre o macho-jurubeba da minha origem do Sertão e o macho em busca da delicadeza perdida aqui nesta urbanidade babilônica”. Por Xico Sá, a convite de Outras Palavras
14/11/2013
“Vivo entre o macho-jurubeba da minha origem do Sertão e o macho em busca da delicadeza perdida aqui nesta urbanidade babilônica”
Por Xico Sá | Imagem: Pablo Picasso, A Flauta de Pan (1923)
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Em diálogo com:
Na luta feminista, há muito espaço para os homens. Mas alguns deles, tão convictos e extremados, querem… indicar-nos o caminho!
Por Marília Moschkovich
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Há quem veja sim machismo nas minhas crônicas, há quem diga que sou um macho feminista, há quem suspire (rs) “ah se todos os machistas fossem iguais a você”. Nesse carnaval, eu mesmo escancaro as minhas contradições: vivo entre o macho-jurubeba da minha origem do Sertão e o macho em busca da delicadeza perdida aqui nesta urbanidade babilônica.
Discordo do artigo da Marília, mas é um texto elegante e creio que respeita as minhas contradições. É o ponto de vista dela, minha gente, com a razão dela – a leitura que ela aprendeu a fazer do mundo. Não existe isso do que seja o certo ou verdadeiro. A única certeza é a contradição.
Fiquei muito orgulhoso, aliás, quando ela me põe junto com o Vinícius de Moraes. Aí ela mata, decifra a origem literária das minhas crônicas: sou uma cria da costela daquele lirismo da turma do poeta e mais do Antônio Maria (“ninguém me ama, ninguém me quer, ninguém me chama de meu amor…”), Paulo Mendes Campos, Rubem Braga etc.
Creio que não existe polêmica possível entre o que Marília defende e o meu amor derramado pelas mulheres. Ela tem o amor sincero dela, eu tenho a minha sinceridade em uma certa prosa poética – não escrevo discurso ou tese, escrevo literatura ou algo próximo disso.
Comentário destacado por PressAA:
Quem se aprofunda nas questões feministas não lida com dados subjetivos, ou com relativização da verdade, com “pontos de vista”. Lida com dados reais e brutais sobre a violência contra a mulher, por exemplo. Daí ser muito bobo, quase ingênuo, considerar “feministas” as crônicas do Xico Sá. Lê-las é um passatempo, como ler horóscopo, quando bem escrito. E, sob um ponto de vista pessoal, penso que os dramas do macho certamente seriam minorados se eles pudessem sair de seus egocentrismos, e pudessem deslocar seus pontos de observação. Mas é difícil fazê-lo enquanto o medo de perder o pódio secular está nas entranhas. Entre lá e cá, parece que o mais sensato é colocar a mulher também em algum lugar de destaque: uma passarela! E derramar sobre ela todo esse amor incontido de macho, como pétalas de rosas provindas de um céu de bem-aventurança, que se espraiam pelo teclado, blog, mundo virtual. Esse culto é bom demais na intimidade, mas quando lido tem gosto de final de domingo.
E que o patriarcalismo, suas mazelas, vítimas e toda a ignorância circundante passem bem longe, que é para não chamuscar de mal estar esse amor de macho tão pouco convencional. Mas se está rendendo polêmica, “curtir” e “compartilhar”, alguém mais vai reclamar? Para variar, somos nós, mulheres, nossas estrias ou a falta delas, nossas gordurinhas ou a falta delas, nosso cabelo branco ou tingido, a inspiração que falta quando a tela está em branco e não escrever é o mesmo que ficar sem salário.
PressAA: Uma forma delicadamente feminina de chamar o cara de pena de aluguel, michê dos barões da mídia. "Ficar sem salário" e, consequentemente, sem mulher.
Erro grosseiro do STF condena bodes expiatórios para evitar debate sobre financiamento empresarial dos partidos – o principal mecanismo de corrupção no Brasil. Por Antonio Martins (publicado em 17/9/2013)
Há pouco, Dilma disse que brasileiros deveriam sentir orgulho do empresário. Hoje, ele vende seu império ao capital estrangeiro. Por Armando Sartori
Reportagem sobre servente de pedreiro que desapareceu em 14/7, na favela da Rocinha. Como vive sua família; como foi sua prisão. Por Tânia Caliari, no Retrato do Brasil
Após três meses de silêncio, empresa do governo paulista admite ocorrência, que considera “normal”. Matérias revelam sucessão de falhas, cada vez mais graves. Por Tadeu Breda e Vinicius Gomes
Documento inédito mapeia situação dos vendedores informais no país e mostra que eles já são afetados pelos preparativos para Copa-2014.. Por Andrea Dip, em APublica
Filme de autor por excelência, obra de Frederico Machado enfatiza cores, respirações e instrumentos que e atravessam fronteira real-onírico e sugerem sexo e morte iminentes. Por José Geraldo Couto, no blog do IMS
Num mundo racional, em que tudo é previsível, melancolia é tratada como doença. Deve a humanidade reagir a esse desígnio? Por Arlindenor Pedro
Ameaçar chamar o zelador, outro macho, para invadir território do Valter e executar o que era dele esperado, era demais... Por Ney Pereira, editor do blog Casos Crônicos