quarta-feira, 13 de junho de 2007

Por que Narciso esnobou a ninfa Eco? (Primeira parte)

Não sou propriamente um mitólogo, mas, depois desta contribuição mitográfica, espero ser reconhecido, pelo menos, como mitógrafo. Os fatos relatados podem não ter acontecido, mas isso pouco importa, pois tentam esclarecer detalhes sobre outros fatos que certamente não ocorreram.

Quando Narciso nasceu, Tirésias, o adivinho de plantão, vaticinou:

— Esse mitológico moleque vai viver pra lá de muitos anos.

Cefiso e Liríope, pais de Narciso, ficaram contentes, visto que aquela criança não seria mais uma a engrossar o índice de mortalidade infantil da antiga Grécia. O mago, porém, advertiu:

— Só tem um problema.

— Problema?! — perguntou espantado Cefiso; afinal, pretendia que seu filho fosse saudável e viesse a se tornar um atleta e participar das olimpíadas de Atenas, como ele, o pai, nunca havia participado.

— Que problema?! — espantada, quis saber Liríope; afinal, as mães cuidam das gripes, do sarampo, da catapora, da caxumba e das lombrigas dos filhos.

Mas Tirésias os tranqüilizou:

— Não se preocupem, Narciso será um jovem quase normal.

— Quase?! — animou-se o pai, pois naquela época era normal que os rapazes se interessassem mais por jovens loiros que pelos louros das olimpíadas.

— O que você quer dizer com “quase”? — quis saber a mãe, pois naquela época era normal que os filhos tivessem fortes inclinações edipianas.

Tirésias rodopiou pela sala, com gestos afetados, com uma das munhecas apoiada na cintura e falando como se estivesse incorporado por uma entidade do Candomblé.

— Narciso será tão belo, mas tão gato, tão lindo, tão fofo...

— Pára com isso, viadopolus! — impacientou-se o pai. — Só quero que meu filho não seja tão maricopolus quanto você!

— Nem tão taradopolus, como o filho da Jocasta — completou a mãe.

O adivinho esclareceu:

— A questão é que, para viver pra lá de muitos anos, Narcisinho não poderá ver sua própria imagem — advertiu Tirésias. — Porque, de tão maravilhoso, tão belo, tão pão (naquela época ainda se usava essa gíria), diante de tanta autobeleza, poderá se auto-apaixonar e, tão bem autodotado como é, vai poder até se autofornicar — enfatizou com o reflexivo “se”.

A Mitologia não registra, mas não tenho dúvida de que Cefiso e Liríope tomaram cuidados incomuns enquanto criavam e educavam Narciso. Provavelmente, jamais lhe serviram líquidos em copo, prato, tigela ou qualquer vasilha que pudesse produzir uma superfície espelhante. Também não podiam ter em casa nenhum objeto polido, fosse metálico, cerâmico ou mesmo de madeira envernizada. Cristais, nem pensar! Só não se preocuparam com objetos de plástico porque naquela época essa matéria ainda não havia sido criada. O urinol de Narcisinho foi substituído por uma caixinha de madeira com areia; afinal, o menino era um gato. Todas as providências foram tomadas para evitar que o jovem Narciso viesse a contemplar sua própria imagem, senão a Mitologia e a Psicanálise viriam a confundir o narcisista Narciso com o onanista Onan.

Certo dia, Cefiso e Liríope se descuidaram, e o jovem Narcisito saiu sozinho de casa, foi dar (?) num bosque cheio de ninfas. Exatamente nesse dia ele se encontrou com Eco, a ninfa que tinha a mania de repetir os últimos sons que ouvia. Eco ficou encantada com a beleza de Narciso, de tal forma que foi tomada de um furor uterino, o tipo de tesão que viria a ser chamado de ninfomania.

Eco aproximou-se do rapaz e, extasiada, arregalou o olhos, a fim de contemplar toda aquela beleza. Os dois estavam assim, cara a cara, olhos nos olhos. Narciso parecia igualmente deslumbrado.

Considerando que Eco apenas repetia os últimos sons de tudo que ouvia, naquele momento ela pensou: “Sou realmente irresistível”.

Porém o que estava acontecendo de verdade era que Narciso havia visto, pela primeira vez, sua própria imagem refletida nos olhos arregalados da ninfa. Foi então que o auto-encantado Narciso falou:

— O ser mais belo de todo o universo sou eu!

— ...sou eu! sou eu! — repetiu Eco.

— Não, sua convencida! SOU EU! — explodiu Narciso, batendo no peito.

— ...SOU EU! SOU EU! – ecoava Eco.

— Você?! Ah, não FODE! — berrou.

— ...FODE! FODE! FODE! — repetia Eco, enquanto levantava a saia.

Horrorizado com aquela oferecida, Narciso saiu disparado e gritando:

— Não vem, que não tem!

— ...tem! tem! tem!

— Você tá louca!

— ...cê tá louca! ...cê tá louca! ...cê tá louca...!

(Deve ter sido desse encontro que surgiu o provérbio: “Quando um não quer, dois não trepam”.)

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